Os tardígrados, pequenas criaturas aquáticas encontradas desde lagoas de quintal até geleiras na Antártica, são resistentes o suficiente para sobreviver aos perigos radicais do espaço. Pesquisadores podem ter descoberto o truque por trás de um de seus feitos mais impressionantes: a sua capacidade de sobreviver a longas secas.
Os tardígrados — um filo que inclui milhares de espécies de cerca de 1,5 milímetro a cerca de 0,05 milímetro de comprimento — apenas parecem cavar e fazer as suas tarefas domésticas onde quer que aterrissem. Os biólogos encontraram-nos felizes residindo sob rochas acima de 6.000 metros de altura no Himalaia e fazendo o mesmo nas trincheiras do oceano a mais de 4.000 metros de profundidade. Eles até mesmo encontraram tardígrados desfrutando fontes termais com temperaturas bem acima do ponto de ebulição da água.
Animais invertebrados quase microscópicos, também conhecidos como urso da água e leitões do musgo, os tardígrados vivem em habitats aquáticos em todo o mundo, por isso a sua habilidade da reidratação vem bem a calhar quando sua ‘casa’ líquida evapora.
Em um estudo, os cientistas relataram o truque dessas criaturas por trás da sua incomparável resistência à completa falta de água por anos a fio. Durante o processo de seca, eles essencialmente perdem toda a água em seu corpo. Logo em seguida os ursos da água começam a bombear proteínas únicas e amorfas que formam um material semelhante a vidro dentro de suas células, relataram esta semana os pesquisadores no periódico Molecular Cell. O material pode encerrar e abrigar moléculas vitais, tais como outras proteínas, até que o período de seca termine. Os cientistas dizem que poderemos tomar emprestado as proteínas protetoras deles para melhorar a tolerância à seca das lavouras e preservar as vacinas para que elas não precisem permanecer congeladas ou refrigeradas.
Resistentes à radiação
Em um estudo publicado em 2016, um “escudo de radiação” foi encontrado escondido no genoma do urso da água. Mas por muito tempo, os cientistas não conseguiam chegar a um consenso sobre porque esses animais são tão resistentes. Os investigadores identificaram um gene que protege o DNA dos tardígrados da radiação, segundo informa reportagem da BBC. O gene, chamado Dsup, mostrou sua importância quando os pesquisadores o inseriram em filamentos de DNA humano e os bombardearam com raios-x. O material genético modificado sofreu significativamente menos danos, relatam os pesquisadores no periódico Nature Communications. Com essa descoberta, os cientistas esperam que os achados os ajudem a proteger um dia outro animal — nós — contra a radiação.
Sobrevivem no espaço
Testes de laboratório revelaram ainda mais surpresas: tardígrados podem viver no vácuo e suportar alguns das mais difíceis exposições solares. Em um experimento que envolveu o envio de duas espécies de ursos da água para órbita da Terra constatou que eles podem sobreviver sobreviver relativamente bem, inclusive conseguindo se reproduzirem após serem acordos. Nesse ambiente, sem ar, sem água e com boas doses de radiação, os heróis da resistência parecem ser capazes de sobreviver a essas condições sem muita dificuldade, foi o que reportaram pesquisadores em um estudo de 2007 publicado em 2008. Os tardígrados apenas encolheram os ombros quando foram colocados por dez dias em órbita terrestre baixa como se fosse apenas um fim de semana desconfortável em um hotel horrível. Exatamente como essas criaturas podem sobreviver permanecia um mistério na época, mas, com a descoberta do “escudo de radiação” do estudo de 2016, os cientistas suspeitam que o mecanismo possa ajudá-los a criar uma melhor proteção para os astronautas em longas missões espaciais.
Mas eles podem realmente morar com facilidade no espaço? Foi o que decidiu descobrir uma equipe liderada pelo ecologista K. Ingemar Jönsson da Universidade Kristianstad, na Suécia. Em setembro de 2007, os investigadores enviaram duas espécies do filo, as espécies Richtersius coronifer e Milnesium tardigradum, numa missão científica da Agência Espacial Europeia (ESA) a bordo de uma espaçonave russa não tripulada. Eles dividiram 120 tardígrados de cada espécie em quatro grupos. Quando a espaçonave alcançou a órbita, abriu-se a porta do experimento e expôs um grupo de ursos de água ao vácuo do espaço, protegendo-os de toda radiação. Dois grupos foram expostos ao vácuo e à radiação ultravioleta-A ou à ultravioleta-B. O grupo final foi exposto a ambos os tipos de radiação e ainda ao vácuo.
Após 10 dias de exposição ao espaço, quase todos os tardígrados tinham secado. Mas, após o desconfortável passeio espacial, um mergulho rápido na água foi suficiente para os fazer boa parte deles voltar ao seu vigor anterior em experimento conduzindo na Estação Espacial internacional. O dano dos raios UV não foi tão reversível. Embora a maioria dos tardígrados expostos à radiação UV-A terem sobrevivido e passaram se a reproduzirem, bem como os tardígrados não expostos à nenhum tipo de radiação, os expostos aos raios UV-B e às duas radiações combinadas pagaram um preço. As taxas de sobrevivência após alguns dias diminuíram para 10% a 15% entre o grupo UV-B e caiu para zero no grupo de radiação combinada. No entanto, os sobreviventes deram à luz filhos normais, informou a equipe de pesquisadores em um 2008 no periódico Current Biology.
“Se os mecanismos extraordinários de sobrevivência dos tardígrados puderem ser descobertos”, disse na época Jönsson, “será importante para compreender como os organismos vivos, incluindo os seres humanos, podem ser protegidos contra as condições do espaço”. Um passo-chave, disse ele na ocasião, seria descobrir por que o DNA dos tardígrados aparentemente não foram danificados pela dessecação e pela radiação. O biólogo James Clegg da Universidade da Califórnia, em Davis, especulava que os tardígrados desenvolveram algum tipo de mecanismo de reparo rápido do DNA.
Compreender os riscos da radiação e de outros ambientes extremos como é o ambiente espacial “é fundamental para fornecer passagem segura para a exploração humana para a Lua e para Marte”, diz a microbiologista Cheryl Nickerson, da Arizona State University em Tempe. Ela diz que as pesquisas têm o potencial de expandir a compreensão das respostas celulares ao ambiente espacial para melhorar a saúde, a segurança e o desempenho dos astronautas.