Fiesta de las Ñatitas: a celebração que venera os crânios humanos

Letícia Silva Jordão
Imagem: Carlillasa / CC BY-SA 4.0

Os bolivianos possuem uma celebração própria muito especial, mas que pode parecer um pouco macabra para quem vê de fora, que é conhecida como Fiesta de las Ñatitas, onde as pessoas inundam as ruas de La Paz segurando urnas de vidro contendo crânios humanos.

A celebração ocorre no dia 8 de novembro, sendo celebrada pelos índios Aimará, que tiveram suas práticas religiosas mescladas com as da cultura Inca, gerando este ritual que tem como fim principal celebrar a vida, mesmo ele sendo confundido com o Dia dos Mortos celebrado no México.

Em seu nome, a palavra Ñanitas é utilizada para designar os crânios que os bolivianos carregam durante as comemorações. A palavra pode ser traduzida como “pequeninos com nariz achatado”. O povo Aimará difundiu essa celebração e muitos outros costumes de geração em geração de forma oral, fazendo com que a cultura se mantivesse forte e que os crânios sejam muito celebrados e honrados pelos seus devotos.

Fiesta de las Ñatitas

A Fiesta de las Ñatitas, também conhecida como festa da caveira, é realizada no Cemitério Geral de La Paz, onde milhares de pessoas se reúnem para celebrar. Segundo as tradições criadas pelo povo Aimará, as pessoas devem se reunir para assistir à missa e honrar suas ñanitas.

Durante a celebração, é possível ver claramente a influência da cultura católica e dos espanhóis, que tentaram converter o povo para o cristianismo, mas no final a cultura se manteve forte e só adquiriu alguns traços da religião cristã.

skulls top

Quando as pessoas chegam no local, os crânios trazidos são colocados em um altar e decorados com velas, flores e até cigarros. É comum ver folhas de coca, uma planta considerada sagrada, sendo oferecida aos ñanitas. Os aimarás mastigam essa folha e as utilizam para preparar uma bebida quente que é usada em rituais medicinais.

As caveiras ou ñanitas, costumam passar o ano inteiro dentro das casas de suas famílias, onde só saem uma vez ao ano que é durante o festival. É bem comum encontrar famílias que possuem mais de um crânio guardado, onde geralmente os deixam em um quarto da casa em seu próprio altar onde os familiares podem visitá-los e apresentar oferendas.

Uma cultura com muito respeito pelos mortos

O povo Aimará herdou dos Incas uma crença onde as pessoas possuíam muito respeito pelos mortos, tanto que os cadáveres eram considerados criaturas vivas mesmo após a sua morte. Na sua crença, eles acreditavam que o mundo humano estava fortemente ligado ao mundo espiritual, e que por conta disso os mortos tinham uma grande influência sobre os eventos do nosso mundo.

Devido a essa importância dada aos cadáveres, os Incas realizavam rituais onde as múmias eram retiradas do seu local, decoradas e exibidas para o povo. Em seguida, elas recebiam oferendas de comida e chicha, um tipo de cerveja do milho. Nesses rituais, as pessoas aproveitavam para se reunir e compartilhar a história do clã, que foram pensados para agradar os deuses e garantir prosperidade e mérito espiritual.

Porém, ser mumificado era algo que poucas pessoas poderiam ter. Esse privilégio era concedido somente para membros da família real e influentes. Os seus cadáveres eram tratados como seres vivos, e em troca do respeito aos vivos, os mortos ofereciam proteção à família, mantinham a terra fértil e garantiam que a água continuasse fluindo.

Hoje a crença na Fiesta de las Ñatitas continua firme e forte, e estima-se que ela possa continuar por muitas gerações. Ela sobreviveu a tentativa dos espanhóis de suprimir seus costumes com o cristianismo, e foi se fortalecendo de geração em geração para sobreviver até hoje.

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