Formado pela Faculdade Cásper Líbero, André Jorge, começou sua carreira de jornalismo na Editora Globo em 2012. Oportunidade esta que o levou para veículos comunicacionais conhecidos, entre eles: redações da Época de São Paulo, Globo Rural e Galileu, onde foi efetivado como repórter no ano de 2014. De início, foi empregado na produção de conteúdo online juntamente da coordenação do site e das redes sociais. A partir de 2016, alçou voo definitivo para o jornalismo científico, onde ganhou notoriedade popularizando a ciência, com foco na astronomia. Atualmente, continua fazendo reportagens de grande relevância para Galileu, como também está à frente do “Luneta”, um projeto de divulgação científica que conta com uma seção na revista, um programa semanal ao vivo no Facebook e um blog no site da marca.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Comente um pouco de como é ser jornalista científico, e de onde adveio o seu amor pela ciência.
Quando criança, em idade escolar, não tinha muito apreço por ciência. Me dava por satisfeito quando obtinha a média que me passaria de ano em disciplinas como matemática ou física. Nenhum de meus professores de STEM¹ conseguiu aguçar minha curiosidade e interesse pelo estudo da natureza. Jamais imaginei que teria algum envolvimento profissional na área, sempre me considerei alguém “de humanas”. Foi só bem mais tarde, já estagiário da revista Galileu, que fui despertado para o significado mais profundo do conhecimento científico, de sua importância fundamental para dar sustentação à civilização humana e dos ataques constantes que sofre. Isso aconteceu quando assisti Cosmos, de Carl Sagan. Desde então, ficou claro que minha missão de vida seria propagar a ciência ao maior número possível de pessoas, tentar mostrar sua imperfeita beleza e seu poder inigualável de nos revelar a verdade. Na Galileu encontro toda a liberdade para desenvolver minha vocação com autonomia, em um espaço privilegiado, com visibilidade e credibilidade. Tive a oportunidade de publicar inúmeras reportagens de fôlego popularizando ciência ao público leitor brasileiro, e também pude criar um projeto multiplataforma voltado somente para a divulgação de astronomia: o Luneta. É um programa semanal ao vivo pelo Facebook que, todas as sextas, faz um balanço analítico das notícias de astronomia e exploração espacial mais importantes dos últimos dias. Com linguagem acessível, uso recursos audiovisuais para transmitir os temas de forma ao mesmo tempo dinâmica e aprofundada, interagindo ao vivo com os espectadores. Sempre que possível, convido especialistas ao estúdio ou por Skype para que eles pratiquem o contato com o público leigo e para que nossa comunidade astronômica ganhe maior visibilidade. O Luneta também conta com uma seção de página dupla nas edições impressas da revista e um blog no site. Atuar em todas essas frentes faz com que me sinta útil à sociedade e à ciência brasileira, e o reconhecimento que meu trabalho obteve até então, mesmo que pequeno, me incentiva para popularizar ciência cada vez mais e melhor.
Qual o futuro da ciência em um país cada vez mais defasado em investimentos nela?
É algo extremamente temerário. Os políticos estão sabotando o futuro do país por falta de uma visão estratégica que enxergue os investimentos em ciência, tecnologia e inovação não como gasto, mas como investimento cujo retorno é o desenvolvimento econômico e social. Diante do quadro complicado que estamos enfrentando, cabe a toda e qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento acerca da importância da ciência para a sociedade lutar por ela e fazer pressão para que não seja deixada de lado. Há muita coisa em jogo. Já se fala em uma “geração perdida” de cientistas, que serão impedidos de trabalhar e pesquisar por falta de apoio do governo, caso os cortes no setor não sejam revertidos. As perspectivas que se delineiam agora são desoladoras. Se a redução no orçamento do MCTIC² para o ano que vem não for revertida, teremos um congelamento sem precedentes na história da ciência brasileira, resultando no sucateamento de projetos importantes concretizados nos últimos anos e também numa grave fuga de cérebros. Não podemos deixar que isso aconteça.
A filosofia crítica é um bom exemplo de ferramenta que os jornalistas científicos poderiam adotar?
A filosofia é a alma da ciência e fornece uma roupagem ideal para transmitir conceitos complexos ao público leigo. Torna o conhecimento científico mais palatável, saboroso, dá ao leitor um panorama mais abrangente e humanizado sobre a questão. Fornece a ele um subsídio refinado com o qual pode se identificar com mais facilidade, aplicar em sua vida cotidiana as informações sobre a natureza e a realidade que vier a adquirir. Então sim, é uma ferramenta bastante poderosa, que infelizmente não é utilizada em seu pleno potencial por nós, profissionais da área. Isso se deve substancialmente a dois motivos: falta de formação acadêmica e, principalmente, às condições de trabalho precarizadas nas redações devido ao agravamento da crise no modelo de negócios tradicional das grandes empresas de comunicação.
Você acha que a divulgação científica é uma forma de ‘salvar’ a ciência no Brasil? Se não, quais seriam outros meios?
Certamente. Quanto mais cientificamente letrada for uma população, quanto mais consciente for da importância estratégica da ciência para uma sociedade e civilização, mais ela cobrará seus governantes para que os investimentos em CT&I sejam prioridade em um projeto de longo prazo que visa o desenvolvimento sustentável do país. Mais irão pressionar para que essa agenda não seja deixada de lado. Isso no âmbito de política pública, que representa quase que a totalidade da base de sustentação da ciência no Brasil. A nossa iniciativa privada atua muito pouco com financiamento de pesquisa, e as iniciativas voltadas à ciência básica são ainda mais escassas: os investimentos são canalizados em áreas aplicadas, com retorno financeiro de curto prazo. Enquanto os empresários brasileiros não forem convencidos de que investir em ciência vale a pena, é o governo que devemos pressionar. Neste sentido, a divulgação científica desempenha um papel fundamental não apenas em manter a população bem informada sobre os mais recentes e principais desdobramentos científicos, mas também em criar pessoas despertas e conscientes, prontas para lutar pela ciência.
Como você vê a má divulgação científica pelos setores midiáticos, logo eles, que deveriam fazer a ponte entre a literatura e a população iletrada cientificamente?
É lamentável, principalmente no período em que vivemos, onde o obscurantismo e a ignorância crescem em ritmo galopante. Trata-se de um desserviço sem tamanho, um anti-jornalismo. Mas vale ressaltar que nem tudo é mau-caratismo: muitas vezes o jornalista se vê obrigado a perverter a divulgação de um fato científico porque precisa de mais cliques no final do dia. Muitas vezes, o sensacionalismo é reflexo do modelo cruel aguçado na era da internet no qual o dinheiro de publicidade advém da audiência medida principalmente por visualizações de página. Isso compromete seriamente a qualidade e o rigor do conteúdo jornalístico, resultando em práticas controversas como o click bait. Essa lógica apelativa não é exclusividade do jornalismo científico: atinge todas as editorias. Outras vezes, a má divulgação científica pode ser resultado de falta de conhecimento do repórter em como abordar os temas complexos da ciência de forma construtiva e responsável. Daí a importância de termos jornalistas bem preparados para tratar de tais assuntos, treinados para popularizar a ciência e, de preferência, que façam isso por vocação — não por obrigação.
Notas:
[1] STEM: Acrônimo em inglês usado para designar as quatro áreas do conhecimento: Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática (em inglês Science, Technology, Engineering, and Mathematics).
[2] MCTIC: Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Por Carlos Germano Rodriguês