Criança da Idade da Pedra foi enterrada com lobos na Finlândia

Daniela Marinho

A forma como uma sociedade trata seus falecidos diz muito sobre sua cultura. Nesse contexto, o túmulo de uma criança da Idade da Pedra chamou a atenção dos pesquisadores por conter, além dos restos mortais da falecida, uma série de itens funerários nada comuns, concedendo o vislumbre de como as práticas funerárias eram feitas naquela época.

Já em 1991, a sepultura de Majoonsuo, no município de Outokumpu ao leste da Finlândia, despertou curiosidade e expectativa dos arqueólogos devido à presença de ocre vermelho brilhante – um tipo de argila rica em ferro. O material é associado à arte rupestre, assim como à ornamentação e sepultamentos.

Restos mortais de criança da Idade da Pedra são achados com outros bens

Ainda em 2018, a Agência Finlandesa do Patrimônio começou a escavar o sítio arqueológico em que restos mortais de uma criança da Idade da Pedra foram descobertos porque ele estava “em risco de destruição”.

O túmulo continha os dentes de uma criança que, com base em uma análise dentária, morreu entre 3 e 10 anos de idade. O solo da região é bastante ácido, por esse motivo, é raro esse tipo de descoberta. A recente pesquisa realizada por análise microscópica foi publicada em setembro na revista científica PLOS One.

Tendo como base a forma trapezoidal de duas pontas de flecha feitas de quartzo, os arqueólogos determinaram que a sepultura data do período Mesolítico, ou Idade Média da Pedra, cerca de 8 mil anos atrás.

Fragmentos revelam como eram realizados os rituais funerários

crianca da idade da pedra
Local do túmulo onde a criança da Idade da Pedra foi enterrada marcado pelo ocre vermelho brilhante numa estrada na Finlândia. Imagem: Kristiina Mannermaa

Além dos vestígios do cadáver, outros itens foram encontrados no mesmo local: alguns fragmentos de penas de pássaros, fios de pelo canino – que podem ter sido de um cachorro ou lobo posicionado aos pés da criança durante o enterro – e fibras de plantas. Além desses itens, foram encontradas duas pontas de flecha de quartzo e dois outros objetos de quartzo, tidos como bens funerários.

Kristiina Mannermaa, pesquisadora e professora associada do Departamento de Culturas da Universidade de Helsinque, disse em comunicado que “Cães enterrados com o falecido foram encontrados, por exemplo, em Skateholm, um famoso cemitério no sul da Suécia que remonta a cerca de 7.000 anos […] A descoberta em Majoonsuo é sensacional, embora não haja nada além de pelos do animal ou animais – nem mesmo dentes. Não sabemos nem se é um cachorro ou um lobo.”

Vestígios de penas mais antigos descobertos na Finlândia

Outra descoberta fascinante foi com relação aos 24 pequenos fragmentos de penas – mais antigos já achados na Finlândia – sendo sete deles associados a aves aquáticas. É possível que a criança tenha sido colocada para descansar em uma cama de penas, ou foi envolta em roupas feitas de aves aquáticas, como uma antiga parka ou anoraque, como assinala Ashley Strickland, da CNN.

A principal autora do estudo, Tuija Kirkinen, pesquisadora de pós-doutorado no Departamento de Culturas da Universidade de Helsinque, responsável por realizar a análise dos materiais à base de plantas e animais dentro do solo, disse que “O trabalho é muito lento e realmente fez meu coração pular quando encontrei fragmentos minúsculos de roupas antigas e móveis de sepultura, especialmente na Finlândia, onde todos os ossos não queimados tendem a se decompor”.

Embora o solo seja bastante ácido, as descobertas revelaram um pouco sobre como as sociedades finlandesas enterravam seus mortos: em covas no solo. “Isso tudo nos dá uma visão muito valiosa sobre os hábitos funerários na Idade da Pedra, indicando como as pessoas preparavam a criança para a jornada após a morte”, afirmou Kirkinen.

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