Colisões de estrelas de nêutrons podem ser a fonte dos elementos pesados

Jônatas Ribeiro
Imagem: A. SIMONNET/SONOMA STATE UNIV., LIGO, NSF 

Os astrônomos costumam dividir as estrelas, sejam comuns, sejam estrelas de nêutrons, ou até mesmo buracos negros, em classificações. Estas se dão por diversos fatores de sua estrutura ou de como as vemos. Pode ser sua massa, sua luminosidade, sua cor ou temperatura, por exemplo. Geralmente, aliás, todas essas questões são relacionadas uma à outra. Por exemplo, para a maior parte da vida de uma estrela, sua luminosidade depende de uma potência de sua massa. Ainda, em relação à cor, essa também está muito relacionada à temperatura.

Outra questão muito importante para o estudo de estrelas, contudo, é sua composição química. Isso não apenas porque estrelas são como grandes bolas de gás (ou plasmas), formadas a partir de nuvens cósmicas. Ou seja, já se formam com uma certa herança química proveniente dessas nuvens. Mas também, e isto é o principal, são os grandes motores da formação de elementos químicos no universo. E inclui-se aí também as várias etapas da vida de estrelas, como supernovas. Ou mesmo fenômenos em estágios extremos da evolução estelar. Por exemplo, como estrelas de nêutrons. Tudo isso se dá por processos de formação de átomos através de átomos de outros elementos químicos. Chamamos esse processo de nucleossíntese.

Caldeirões celestes

A história da nucleossíntese é ligada à história da física moderna. E ainda, para ser mais específico, da física nuclear. Becquerel, Marie Curie e seu companheiro Pierre, ainda na primeira década do século XX, descobriram o fenômeno da radioatividade. Pouco depois disso, Rutherford, Geiger e Marsden relatavam resultados que demonstravam a existência do núcleo atômico. Paralelamente, Albert Einstein formulava a ideia de equivalência entre massa e energia. O conceito, além de crucial para a física nuclear, se tornou um dos mais populares da ciência. Seu símbolo maior é, talvez, a mais conhecida das equações, E=mc2.

Nas décadas seguintes aos trabalhos fundadores da física nuclear, nomes como Eddington, Bethe e Fred Hoyle pensavam em como se daria a formação de elementos químicos no universo. Mais especificamente, sobre os processos de fusão nuclear que seriam a chave para entender esses processos. Inclusive, Hoyle esteve presente na autoria do famoso artigo conhecido como B2FH, do casal Burbidge de astrofísicos, Fowler e Hoyle. O trabalho resumia os esforços da época no que veio a ser a astrofísica nuclear. Isto é, o estudo dos processos de formação de elementos químicos no universo por meio da física nuclear.

fusão nuclear no sol
Imagem: Brasil Escola

Assim, hoje sabemos que o brilho das estrelas é explicado pela queima de núcleos de hidrogênio em hélio. E assim continua com a queima de elementos mais leves em elementos sucessivamente mais pesados. Para núcleos mais pesados que o ferro, contudo, a fusão deixa de ser vantajosa em termos da energia. É aí que entra uma questão ainda não totalmente fechada na astrofísica nuclear. De onde vem os elementos pesados? A resposta está em eventos já muito discutidos como supernovas. Também está, contudo, em surpreendentes colisões de estrelas de nêutrons.

Estrelas de nêutrons em choque

Estrelas de nêutrons são o resultado do colapso de uma estrela muito massiva no final de sua evolução. Esses estranhos objetos são bem pequenos se comparados a outros corpos estelares. Seu tamanho está mais próximo de uma cidade do que de uma estrela comum. Contudo, se seu tamanho está em escala terráquea, sua massa continua a estar em escala estelar. Ou seja, são muito densos. E, como diz seu nome, muito ricos em nêutrons.

Essa característica, isto é, a riqueza em nêutrons, é fundamental para o chamado processo-r. Metade dos elementos pesados são criados por esse processo, que indica captura rápida de nêutrons por núcleos. E ele ocorre conhecidamente em explosões de supernovas e em colisões entre objetos colapsados como estrelas de nêutrons. Aliás, segundo estudo recente, publicado na Astrophysical Journal Letters, essas últimas têm um papel mais fundamental do que se pensava. Isso porque, como já se registrou também uma colisão entre estrela de nêutrons e buraco negro, pairou essa dúvida entre cientistas. Isto é, sobre qual colisão seria mais importante para a formação de elementos.

Os astrofísicos, então, realizaram simulações de diferentes cenários. Foram alterados parâmetros como massa e velocidade de rotação dos objetos. Com os resultados, calcularam, então, a massa ejetada em todas essas colisões. Na maioria dos casos, colisões entre buracos negros e estrelas de nêutrons produziram menos elementos pesados do que entre apenas estrelas de nêutrons. Apesar das interessantes conclusões, contudo, ainda há trabalho a ser feito. Afinal, as conclusões precisam ser comparadas também com a produção por supernovas. Contudo, é fascinante perceber como uma colisão entre objetos tão excêntricos pode ser tão fundamental para a existência do universo como conhecemos.

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