A escala Saffir-Simpson, utilizada há mais de meio século para classificar furacões, está sendo questionada por cientistas que a consideram insuficiente para avaliar os reais riscos dessas tempestades. O problema central reside no fato de a escala se basear apenas na velocidade dos ventos, ignorando outros fatores cruciais como a maré de tempestade e as inundações, que são responsáveis pela maioria das mortes relacionadas a esses eventos climáticos.
Especialistas alertam que tempestades classificadas na parte inferior da escala, com ventos relativamente fracos, podem causar tantos estragos quanto furacões de categoria 5, a mais alta. O furacão Ernesto, que devastou Porto Rico em agosto, exemplifica bem essa situação. Apesar de ter sido classificado na categoria mais baixa da escala Saffir-Simpson, com ventos de 120 km/h, os danos foram consideráveis.
A necessidade de incluir outros fatores de risco
Criada na década de 1970, a escala Saffir-Simpson utiliza a velocidade máxima sustentada dos ventos para classificar os furacões em 5 categorias. A medição é feita por aviões da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), que lançam instrumentos no olho do furacão.
No entanto, a escala não leva em conta outros impactos potencialmente devastadores dos furacões, como a maré de tempestade, as chuvas torrenciais e as inundações. Dados do Centro Climático da Universidade Estadual da Flórida indicam que 90% das mortes relacionadas a furacões no mundo são causadas por afogamento, seja pela elevação do nível do mar ou por enchentes.
O cientista Michael Wehner, do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, critica a escala Saffir-Simpson, afirmando que ela “é simplesmente uma medida da maior velocidade dos ventos” e que a maior parte dos danos é causada pela água.
Propostas para aperfeiçoar a classificação dos furacões
Diante das limitações da escala atual, cientistas propõem alternativas para aperfeiçoar a avaliação dos riscos dos furacões, visando sistemas de alerta mais eficientes e a preservação de vidas.
O professor Vasu Misra, do Centro de Estudos de Previsões Oceânicas e Atmosféricas da Universidade Estadual da Flórida, destaca que a escala Saffir-Simpson ignora o tamanho total do furacão e a distribuição horizontal dos ventos, fatores cruciais para determinar a força da maré de tempestade.
Para complementar a escala atual, Misra propõe a “Energia Cinética Integrada Rastreada” (Tike, no inglês), uma medida que considera a intensidade, a duração e a área de abrangência dos ventos.
Em vez de aviões, a metodologia Tike se basearia em dados coletados por satélites, o que traz seus próprios desafios. A presença de nuvens densas ao redor do furacão pode comprometer a precisão dos dados. Além disso, a localização dos satélites limita a obtenção de dados para algumas regiões, como o Oceano Índico e o Oeste do Pacífico.
A importância de um sistema de alerta centrado nas pessoas
Para o professor Kerry Emanuel, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), a solução ideal seria abandonar a escala Saffir-Simpson e criar um sistema completamente novo. Ele defende uma abordagem centrada nas pessoas, e não nas tempestades, similar ao modelo utilizado pelo Escritório de Meteorologia do Reino Unido.
O sistema britânico utiliza um código de cores para indicar a gravidade do risco, com alertas amarelo, laranja ou vermelho. Emanuel acredita que fornecer informações personalizadas sobre a probabilidade de ocorrência de eventos climáticos extremos, como ventos fortes e inundações, ajudaria a população a se preparar melhor.
O debate sobre a criação da categoria 6
O aumento da temperatura dos oceanos tem tornado os furacões mais intensos e destrutivos, o que levanta a questão: a escala Saffir-Simpson deveria incluir uma categoria 6?
Embora alguns cientistas defendam a necessidade de eliminar o limite da categoria 5, a proposta enfrenta resistência. Eles argumentam que a criação de uma categoria adicional poderia levar as pessoas a subestimarem os riscos da categoria 5.
O vice-diretor do Centro Nacional de Furacões da Noaa, Jamie Rhome, argumenta que a categoria 5 já descreve danos catastróficos causados pelo vento. Ele ressalta que o foco não deve ser apenas a força dos ventos, mas sim os diversos riscos associados aos furacões.
Independentemente da decisão sobre a categoria 6, especialistas concordam que a escala Saffir-Simpson precisa ser revista e complementada para refletir os efeitos das mudanças climáticas e a complexidade dos riscos representados pelos furacões. É fundamental fornecer à população informações claras, completas e acessíveis para garantir que estejam preparadas para enfrentar os desafios impostos por esses eventos climáticos extremos.