Os cientistas enfim encontraram a matéria oculta do universo?

Felipe Miranda
(NASA, ESA, H. Teplitz and M. Rafelski (IPAC/Caltech), A. Koekemoer (STScI), R. Windhorst (Arizona State University), and Z. Levay (STScI)).

Não confunda esse termo com a matéria escura, pois é algo completamente diferente. A matéria oculta ainda é a matéria bariônica (a matéria “comum”). No entanto, 40% da matéria bariônica, que constitui estrelas, planetas e tudo o que vemos pelo universo, se esconde na forma de um quente gás oculto pela teia cósmica.

Em um estudo, publicado no periódico Astronomy & Astrophysics, um grupo de cientistas do Institut d’Astrophysique Spatiale da Université Paris-Saclay, descrevem uma possível detecção, pela primeira vez, dessa numerosa quantidade de matéria oculta. Vale lembrar que isso não é uma prova, mas uma evidência (mais detalhes nos últimos parágrados do texto).

“A estrutura cósmica organiza-se em um padrão complexo semelhante a uma teia chamado teia cósmica feita de nós, filamentos, folhas e vazios. Simulações numéricas prevêem que a maioria dos bárions encontram-se em filamentos na forma de plasma quente”, descrevem os pesquisadores na introdução do artigo.

As galáxias distribuem-se por meio dessa “teia cósmica”. Não é nenhuma ideia maluca, ou algo semelhante. Trata-se apenas de uma forma de abstrairmos a organização em um dos âmbitos mais macros existentes no universo. No entanto, desses bárions, 40 a 50% permanecem escondidos mesmo quando os procuramos, de tão difuso e fracos que são os sinais emitidos. E há uma constante busca por eles

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Esta é a teia cósmica, capturada há alguns anos em um estudo de outra equipe. Essas escalas do universo são gigantescas. (Klypin / Primack / Cantalupo).

Dados e mais dados

Os pesquisadores buscam, portanto, por esses bárions sumidos. A equipe, liderada por Nabila Aghanim e Hideki Tanimura, desenvolveu uma nova abordagem – uma análise estatística que eles descrevem como inovadora. Dessa forma, eles detectaram, possivelmente, raios-x proveniente do gás quente nos filamentos ocultos.

Para isso, os cientista utilizaram informações do ROSAT2, um levantamento de dados feito pelo telescópio espacial alemão ROSAT. Lançado em 1990, o telescópio operou até 1999. Durante esses nove anos de missão, ROSAT, varreu os céus principalmente nas faixas de raios-x. 

Para filtrar os pontos em que ele analisaram nos dados, os pesquisadores utilizaram dados do Sloan Digital Sky Survey 3 (SDSS-III). No levantamento, que ocorreu entre 2008 e 2014, um telescópio da Sloan Foundation, localizado no Apache Point Observatory, no Novo México, Estados Unidos, identificou um total de 15 mil filamentos na grande escala cósmica.

Buscando pela matéria oculta do universo

Guiados pelo SDSS-III, portanto, eles analisaram os raios-X coletados anteriormente pelo ROSAT. “Medimos pela primeira vez, com mapas ROSAT, a emissão de raios-X dos núcleos de filamentos cósmicos grandes”, escrevem os pesquisadores no estudo.

Eles explicam que autores anteriores já tentaram a mesma detecção, na década de 1990. No entanto, os dados não consistiam com o número de filamentos na região. Mas isso ocorreu pelos erros de dados. “Uma razão para a diferença entre nossos achados e os de Briel & Henry (1995) é devido ao pequeno número de filamentos empilhados naquele estudo (∼40), em comparação com a pilha de ∼15.000 filamentos no presente estudo”, explicam. “Outra razão pode ser devido ao pressuposto de filamento reto, enquanto esses filamentos podem ser principalmente curvos”.

Então, sabendo do número atualizado de filamentos existentes pela região, os cientistas cosneguiram calcular a densidade da matéria oculta do universo, consistindo com diversas simulações de outros estudos, não só da distribuição desses bárions, mas estatísticas de fenômenos não diretamente relacionados, como as lentes fracas.

No entanto, como já destacado, não trata-se de uma prova absoluta e inquestionável. Nada na ciência é assim. Na verdade, os cientistas fizeram o que pode ser a primeira detecção dos bárions ocultos.  Então, trata-se de uma evidência, que ainda precisa de provas, questionamentos ou refutações. E isso não ofende nem nada – trata-se de algo de praxe na ciência, e os próprios cientistas sabem disso.

“Uma declaração definitiva sobre a temperatura do gás nos filamentos dos raios-X requer dados de maior qualidade, como os do levantamento SRG / eROSITA all-sky”, destacam os cientistas no estudo.

O estudo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics. Com informações de Phys.org e TANIMURA H. et al

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