Marte pode ter tido água líquida por mais tempo do que pensávamos

Jônatas Ribeiro
Imagem: Ittiz/Wikipedia Commons

Marte, nosso planeta vizinho, não tem só a distância como fator comum com nosso planeta terrestre. Ambos os planetas são planetas rochosos do Sistema Solar. Isto é, têm uma origem comum na região mais próxima ao Sol. Além dos dois terem sido formados de poeira e fragmentos de rocha. E há também alguma semelhança geológica entre Marte e Terra, como seus núcleos sólidos e a camada exterior rígida presente em ambos os planetas.

Mas há também muitas diferenças. O planeta vermelho tem quase metade do tamanho do nosso planeta, por exemplo. Além de uma massa praticamente dez vezes menor. A pressão atmosférica marciana, por sua vez, é 7 vezes maior do que a terrestre. Isso para não falar da temperatura de Marte, que pode chegar a mínimas de 60 graus Celsius negativos e máximas de apenas 0 ºC. A geologia dos dois planetas também, apesar das semelhanças, tem suas distinções. Enquanto as camadas exteriores da Terra se dividem em placas em movimento, isto é, as famosas placas tectônicas, Marte tem mais estabilidade na crosta. E isso possibilita observar características que datam de alguns bilhões de anos.

Entre semelhanças e diferenças, porém, há uma questão fundamental para compreender a história de um planeta, em diversos sentidos. A presença da água na Terra desenvolveu o planeta de uma forma totalmente distinta em função do desenvolvimento da vida. Claro, há outras condições por aqui que tornam o nosso planeta ideal para nossa existência. Mas, ainda assim, a água é um dos principais marcadores para o surgimentos de organismos vivos. E, mesmo não estando presente mais em Marte (ou, pelo menos, não em forma líquida), ela foi bastante importante para a história de nosso vizinho vermelho. Inclusive, talvez por mais tempo do que pensávamos.

Um passado glorioso

marte noachiano
Imagem:  F. Schmidt/NASA/USGS/ESA/ DLR/FU Berlin (G. Neukum)

Quando a vida começava a surgir na Terra, Marte tinha aspecto bem diferente de hoje. Por exemplo, sua atmosfera era mais densa, em vez da atmosfera rarefeita de hoje, e a temperatura de sua superfície era mais quente. Além de sabermos pelas marcas geológicas do planeta que o mesmo deve ter tido correntes de água espalhadas por seu solo. Esse período, chamado de período noachiano, também marcado por intensos impactos de meteoros, deve ter sido o único em que o planeta foi habitável.

A era de ouro para as possibilidades de vida em Marte não durou muito, contudo. O planeta em determinado momento perdeu seu campo magnético. Sem o redirecionamento das partículas provenientes do Sol pelo campo, os ventos solares começaram a interagir com a atmosfera e deixá-la cada vez menos densa. E foi assim que Marte se tornou o ambiente pouco amigável que conhecemos hoje. Ainda assim, saber qual foi a duração desse período é fundamental para procurarmos evidências de vida no passado marciano. Afinal, quanto mais longo foi, maior a chance de encontrarmos fósseis.

Simulando água em Marte

marte hoje
Imagem:  F. Schmidt/NASA/USGS/ESA/ DLR/FU Berlin (G. Neukum)

Uma equipe internacional de cientistas, de vários institutos da França e EUA, usou modelos climáticos desenvolvidos na NASA para simular como era o ambiente em Marte durante o período hesperiano, que sucede o noachiano. As simulações ainda foram refinadas utilizando características conhecidos do relevo e da distribuição de gelo no planeta. Também foi considerado um pequeno oceano na região norte de Marte, a partir de evidências geológicas recentes.

Os cálculos revelaram um oceano formado há 3 bilhões de anos no norte marciano, onde a atmosfera era mais densa e quente, que evaporava e precipitava como chuva (próximo ao oceano) e neve (na região sul). A neve formaria também grandes geleiras, que eventualmente derretiam durante os ciclos climáticos e retornavam ao oceano.

A inovação do novo modelo utilizado está em considerar simultaneamente características oceânicas e atmosféricas tridimensionalmente. Isto é, o calor na simulação se transporta em todas as direções, em vez de apenas ser estudado em uma camada do oceano. Isto é fundamental para entender o transporte de água quente entre as latitudes de Marte. Mas a melhor notícia é que a simulação também prevê muitas características geológicas do solo marciano atual. Os cientistas planejam ainda incorporar ao modelo novos dados provenientes de rovers e sondas, bem como de iniciativas voltadas ao mapeamento do território do planeta vermelho.

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