A ideia de que o que chamamos de matéria escura são, na verdade, buracos negros primordiais não é tão maluca assim.
Não fazemos absolutamente nenhuma ideia do que é a matéria escura – só sabemos que ela existe. Chamamos de matéria escura justamente por não enxergá-la. Os cientistas detectam a matéria escura apenas pela gravidade, já que ela não interage com a matéria de nenhuma outra forma, nem mesmo reflete luz (por isso que a chamamos de escura).
Buracos negros também são completamente escuros. Só localizamos um buraco negro por meio de ondas gravitacionais e pela emissão de algum tipo de radiação, como o disco de acreção. Exemplo é aquela famosa foto do buraco negro. O disco de acreção de forma quando um buraco negro engole matéria. No entanto, nem sempre eles estão se alimentando. Nesses casos, não há como enxergá-los – exceto pela gravidade, assim como a matéria escura.
Por isso, conhecemos apenas alguns buracos negros. Conhecemos os buracos negros de forma tão precária que algumas evidências sugerem que o misterioso planeta nove seria, na verdade um pequeno buraco negro. Ou seja, talvez exista um buraco negro no sistema solar sem nunca notarmos. Ah, mas ele não nos gera risco. Se existe, é extremamente pequeno.
É difícil estimar a quantidade de buracos negros por aí. Mas desde quando os cientistas detectaram as ondas gravitacionais pela primeira vez, perceberam que há muito mais buracos negros do que sabia-se. Então, a possibilidade de que buracos negros primordiais causam o efeito da matéria escura não é muito maluca. E sabemos que há muito faltando em nossa concepção de matéria escura.
No caso dessa ideia, esses buracos negros hipotéticos surgiram junto com o big bang.
Os cálculos dos buracos negros primordiais
A ideia segue, hoje, renegada, na periferia da ciência.
Feito em 2017, mas publicado no início de 2018, o astrofísico Yacine Ali-Haïmoud calculou, em um estudo disponível como preprint no arXiv, que para buracos negros primordiais, que surgiram no bigbang, preencherem o universo e explicar a matéria escura, ocorreriam tantas fusões de pares binários, que havia a milhares de vezes mais ondas gravitacionais do que o LIGO detecta. Seria impossível não notar. O próprio astrofísico de desanimou quanto à ideia.
Na verdade, seria impossível não notar se nos basearmos nos cálculos de Ali-Haïmoud. Mas e se ele errou?
Na metade de setembro, a cosmóloga Karsten Jedamzik, da Universidade de Montpellier, na France, publicou no periódico Journal of Cosmology and Astroparticle Physics. No artigo, ela mostra, em seus cálculos, que há como a frequência de colisões detectadas pelo LIGO e pelo VIRGO corresponderem às fusões de buracos negros primordiais.
“Se seus resultados estiverem corretos – e parece um cálculo cuidadoso que ele fez – isso colocaria o último prego no caixão de nosso próprio cálculo”, diz o próprio Ali-Haïmoud à Quanta Magazine. “Isso significaria que, na verdade, eles poderiam ser toda a matéria escura”.
Convergência de estudos
Ok, essa é uma ideia de certa forma marginal. Mas muitas pessoas trabalham nela. Imagine a minha surpresa ao me deparar com um outro trabalho recente que converge com a ideia de buracos negros primordiais como matéria escura. Em 20 de novembro, um trio de pesquisadores chineses carregou, no arXiv, um trabalho onde falam sobre os buracos negros primordiais.
No estudo, eles sugerem que durante os primeiros momentos após o bigbang, o espaço-tempo se curvou de forma bastante intensa, e depois se achatou, ganhando a configuração atual. Durante esse tempo em que o universo “se contorceu” (entre muitas aspas), as flutuações aglomerariam a matéria que ali havia, a mesma que formam as primeira estrelas e galáxias. Mas muitas desses aglomerados podem ter colapsado, formando pequenos buracos negros com a massa da Terra.
Eles explicam, no estudo, que as ondas gravitacionais secundárias nos trariam respostas, explicando se esses buracos negros hipotéticos existem ou não. Agora só o tempo dirá se eles existem e, caso existam, se eles são, de fato, a matéria escura. Mas é engraçado como dois artigos independentes, publicados quase ao mesmo tempo se completam.
Com informações de Live Science e Quanta Magazine.