No Chile, estas raríssimas baratas são polinizadoras

Daniela Marinho
Imagem: Constanza Schapheer Carrasco

Embora frequentemente as baratas sejam estigmatizadas como uma praga urbana, é importante destacar que a grande maioria das espécies de baratas no mundo não possui afinidade com ambientes urbanos. Na verdade, cerca de 99% das 4.500 espécies conhecidas de baratas prosperam em habitats selvagens, desempenhando papéis essenciais em diversos ecossistemas, desde as exuberantes florestas tropicais do Brasil até os áridos desertos da Arábia Saudita.

Recentemente, um estudo inovador trouxe à tona uma descoberta surpreendente: a barata Moluchia brevipennis, nativa do cerrado central do Chile, possui uma dieta peculiar baseada em pólen de flores. Essa espécie singular de barata, ao se alimentar de pólen, adquire a capacidade única de também atuar como polinizadora de plantas, desempenhando um papel adicional fundamental para o equilíbrio dos ecossistemas em seu ambiente nativo. Saiba mais sobre as baratas polinizadoras!

Baratas polinizadoras são extremamente raras

A ocorrência de baratas polinizadoras é extremamente rara, sendo conhecidas apenas duas espécies até o momento: uma na Guiana Francesa e outra no Bornéu da Malásia. No entanto, é importante ressaltar que a pesquisa sobre baratas silvestres também é limitada, como destacam os pesquisadores em seu artigo publicado na Revista Brasileira de Entomologia.

Surpreendentemente, durante o período de 2000 a 2016, apenas 178 artigos científicos foram dedicados ao estudo desse grupo pouco explorado, em contraste com dezenas de milhares de artigos que se concentram em insetos mais conhecidos, como formigas e abelhas, de acordo com os autores do estudo. Essa discrepância evidencia a necessidade de maior atenção e investigação em relação às baratas e sua relevância nos ecossistemas.

Os resultados desse estudo destacam a importância de ampliar o conhecimento sobre as baratas, especialmente aquelas que desempenham papéis singulares, como a polinização de plantas. Essas descobertas ressaltam a necessidade de aprofundar a compreensão sobre a ecologia e a importância desses insetos muitas vezes subestimados, contribuindo para uma visão mais abrangente e precisa dos ecossistemas em que eles estão inseridos.

De acordo com o entomologista da Universidad Metropolitana de Ciencias de la Educación em Santiago, no Chile e coautor do estudo, Cristian Villagra, “As pessoas pensam que elas estão nas ruas ou no lixo, mas há essas baratas selvagens penduradas no topo de flores altas.”

Realização do estudo

Para realizar sua pesquisa sobre as baratas polinizadoras, Villagra e sua equipe empreenderam o primeiro estudo abrangente sobre a presença da espécie M. brevipennis em diversos locais da região semiárida do Matorral. Durante essa investigação, os pesquisadores fizeram uma descoberta notável: essas baratas emergem ao entardecer para se alimentar do pólen de várias espécies de plantas nativas, incluindo a prímula, e depositam seus ovos, conhecidos como ootecas, exclusivamente em um gênero específico de plantas bromélias chamado Puya.

Os especialistas em entomologia suspeitam que as baratas tenham evoluído para depender de plantas nativas como fonte de abrigo e alimento devido à sua maior adaptabilidade ao clima seco e severo da região. Em comparação com plantas não nativas, a flora endêmica demonstra uma maior capacidade de resistir e se adaptar às condições climáticas desfavoráveis, o que torna a escolha dessas plantas uma aposta mais segura para as baratas.

Essas descobertas destacam a estreita interdependência entre as baratas e as plantas nativas em seu ambiente natural, revelando uma complexa relação evolutiva entre esses organismos. O estudo ressalta a importância de entendermos a ecologia desses insetos e como eles se adaptaram ao longo do tempo, buscando recursos em plantas nativas específicas que ofereçam as condições ideais para sua sobrevivência e reprodução.

Papel das baratas selvagens na polinização

Katy Prudic, entomologista da Universidade do Arizona, afirma que “Insetos comem pólen – essencialmente, esperma de plantas – porque é uma comida deliciosa e realmente cheia de energia.”

Desse modo, enquanto as baratas se alimentam avidamente do pólen, elas inadvertidamente espalham essa preciosa substância em pó por todo o seu corpo e rosto. Essa polinização acidental ocorre quando as baratas pousam em outra flor, permitindo que uma porção do pólen que aderiu a elas seja transferida para as partes reprodutivas femininas na base da flor. Esse processo, por sua vez, desencadeia a fertilização e contribui para o ciclo reprodutivo das plantas.

Observar e compreender adequadamente essa interação complexa e fascinante entre os insetos e as plantas requer a realização de experimentos minuciosos. Consciente disso, Villagra e sua equipe têm planos de conduzir estudos adicionais para confirmar se as baratas desempenham de fato um papel significativo na polinização das plantas. Essas investigações futuras proporcionarão uma visão mais clara e detalhada dessa relação simbiótica entre baratas e plantas, fornecendo insights valiosos sobre a dinâmica ecológica desse ecossistema específico.

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