Comunidade indígena no Peru se declarou autônoma para combater desmatamento

Daniela Marinho
Teófilo Kukush Pati (à direita) e Nayap Atilio Santiago Velazquez (à esquerda) na COP15. Imagem: Divulgação ZME Science

Pela busca desenfreada de combustíveis fósseis que parte de diversas empresas, assim como os recorrentes ataques de garimpeiros e madeireiros em áreas florestais, os indígenas têm se autodeclarado como governo autônomo afim de proteger seu povo e os seus meios de subsistência. O caso mais recente aconteceu na comunidade indígena no Peru, na Nação Wampis – uma comunidade com cerca de 16 mil pessoas, localizada no norte do país, ao longo da fronteira com o Equador.

A comunidade administra um território de mais de 1,3 milhão de hectares de floresta tropical, sendo que os rios Santiago e Morona são as únicas vias de contato e comércio com o mundo exterior.

Alguns representantes da Nação Wampis participaram da conferência de biodiversidade das Nações Unidas, ou COP15, em Montreal, Canadá. Os governos estão negociando um acordo global para proteger a natureza. A comunidade indígena argumenta que o acordo deve considerá-la como guardiã da biodiversidade.

Comunidade indígena Wampis

Além de uma fauna e flora muito diversas, o território onde vivem os Wampis é totalmente coberto por floresta tropical, exceto por algumas pequenas propriedades agrícolas e áreas de assentamento. Eles possuem conectividade plena e não distribuída entre as planícies amazônicas e as florestas úmidas de maior altitude.

De acordo com o representante da Nação Wampis, Teófilo Kukush Pati, “Somos nós que devemos decidir o que se passa nos nossos territórios. Em vez disso, os governos querem decidir por nós […] Vivemos no mesmo lugar por 7.000 anos. Nossos ancestrais tinham seu próprio sistema de governo, sem o papel do Estado.”

Por possuir uma vasta riqueza ambiental, as terras da comunidade indígena tem sido, nas últimas décadas, alvo de empresas privadas que desejam extrair recursos naturais sem o consentimento dos Wampis. “O Estado não quer reconhecer nossa autonomia e continua negociando com mineradoras e petrolíferas em nossas terras. Isso levou a derramamentos de óleo que poluíram nossos rios […] Sempre protegemos a biodiversidade da nossa terra e queremos continuar a fazer o mesmo, 97% da nossa terra está completamente intacta.”

Autonomia

Em 2005, a comunidade indígena se autodeclarou autônoma. A partir disso, os Wampis criaram um estatuto no qual é definido sua visão de futuro em todas as áreas da vida, da religião à educação. O estatuto se baseia nas obrigações do Estado peruano em respeitar os direitos e a autonomia desse povo, que sempre devem ser questionados sobre as atividades em suas próprias terras.

comunidade indígena
Imagem: Canva

Embora tenham se declarado independentes, a luta dos Wampis para ter direito a conservar seu próprio lar é latente. Em 2009, 4 anos após a autodeclaração, os Wampis saíram às ruas para protestar contra forasteiros que violavam suas terras, em meio a leis nacionais que incentivavam as indústrias extrativas.

Com a autonomia da comunidade indígena, o governo do Peru não pode dar mais concessões que permitam que empresas petrolíferas ou mineradoras entrem nos territórios Wampis sem um processo de consulta. Contudo, a realidade é outra, conforme afirma Teófilo Kukush Pati, uma vez que o governo, ainda em 2022, não está reconhecendo sua declaração autônoma e continua decidindo sobre suas terras sem a participação deles.

Taxas de desmatamento

Um estudo realizado pela ONU este ano, indica que as taxas de desmatamento eram muito mais baixas em áreas onde os direitos territoriais das comunidades indígenas foram formalmente reconhecidos. Ademais, pesquisas recentes mostram que a administração indígena está ligada à biodiversidade. Isso significa que incluir a comunidade indígena nas decisões sobre seu próprio território impulsiona a conservação.

O acordo de biodiversidade deverá ser discutido durante essa semana, devendo ser concluído na próxima sexta-feira. Entretanto, as diferenças ainda são gritantes entre países sub e desenvolvidos. Não bastará selar o acordo, mas é preciso dar voz, cada vez mais, às comunidades indígenas.

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