Ave com bico móvel reformula história da evolução das aves

Daniela Marinho
Reconstrução artística de Janavis finalidens, uma grande ave marinha do final do Cretáceo. Imagem: Philip Krzeminski

De forma geral, entender sobre a evolução das espécies é fundamental para compreender como foi a vida em tempos remotos em diversas esferas, sobretudo a biológica. Nesse contexto, uma descoberta recente revelou que a evolução das aves não ocorreu como os pesquisadores acreditavam.

Isso porque um osso de crânio de 67 milhões de anos permitiu que os biólogos reformulassem uma teoria há tempos considerada verídica: a de que os ancestrais das aves modernas tinham bicos imóveis.

História da evolução das aves é reescrita a partir de nova descoberta

Há muito se acredita que as aves modernas que não voam, como avestruzes e emas, evoluíram sem conseguir mover o bico superior. Considerada uma característica primitiva por 155 anos, ela foi derrubada por uma recente descoberta.

Na verdade, as aves modernas evoluíram com uma característica oposta: por meio do estudo de um crânio de milhões de anos de uma ave, os estudiosos conseguiram descobrir que esses animais — da era dos dinossauros — possuíam um bico superior articulado.

No entanto, segundo Daniel Field, da Universidade de Cambridge e um dos autores do estudo, publicado na Revista Nature, a descoberta sugere que o ancestral de todas as aves modernas pode ter tido uma mandíbula que parecia mais com a de um peru do que com a de um avestruz: “A suposição de que avestruzes, emas e quiuís de alguma forma mantêm características que são indicativas de como o ancestral das aves modernas poderia ter sido — acho que isso não está certo.”

Cronologia

Ainda em 1867, o biólogo Thomas Henry Huxley sugeriu que as aves que tinham bicos superiores fundidos mantiveram essa característica de ancestrais antigos, e que os bicos superiores articulados – que permitem que o bico superior se mova para cima e para baixo, independentemente da cabeça – evoluíram posteriormente. Cerca de 99% das aves modernas têm bicos superiores articulados, o que pode garantir algumas vantagens para a construção de ninhos, defesa, higiene e coleta de alimentos.

Mais tarde, há 20 anos, cientistas do Museu de História Natural de Maastricht, na Holanda, estudaram um fóssil envolto em pedra no qual foi identificado um dos ossos salientes como um osso do ombro; a equipe também encontrou um dente.

Já em 2018, Juan Benito, da Universidade de Cambridge, pegou o espécime de Maastricht para uma análise mais aprofundada. Havia muita ansiedade para estudar um fóssil que pudesse conter ossos de crânios de aves antigas, visto que são tão delicados e raros. Contudo, uma imagem de tomografia computadorizada revelou que se tratava de “apenas um monte de vértebras e costelas”.

Benito, no entanto, não desistiu do estudo. Dois anos depois, o pesquisador reanalisou o osso do ombro e achou algo estranho. Ao contatar Field, criaram escaneamentos 3D do osso protuberante, uma vez que ele parecia ter sido rotulado erroneamente.

Descoberta

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Rocha que contém os fósseis de Janavis. IMagem: Divulgação Dr Juan Benito e Dr Daniel Field, Universidade de Cambridge

Para a surpresa dos pesquisadores, os dois pedaços de osso combinaram perfeitamente ao longo das linhas fragmentadas. Fixados, eles criaram um único osso que se parecia muito com o osso articulado do bico superior da maioria das aves modernas, chamado pterigoide.

Desse modo, as comparações de suas características com as de 34 outras aves fossilizadas e dezenas de aves modernas confirmaram a identidade do osso. Além disso, sugeriram que, como perus e patos modernos – e ao contrário de avestruzes, emas e emas – esta ave antiga poderia levantar seu bico superior.

De acordo com Benito, a ave teria pesado cerca de 1,5 quilo – sendo parecida com uma garça-real ou abutre-real. A equipe batizou-o de Janavis finalidens, por Janus, o deus romano dos começos e fins, e pelas palavras latinas avis, finalis e dens, que significam aves, final e dentes.

Bico fundido foi desenvolvido depois

Com a descoberta, os pesquisadores assinalam que os avestruzes e seus parentes devem ter desenvolvido um bico fundido posteriormente. Lawrence Witmer, também pesquisador, mas não participante do estudo, disse que: “Sempre pensamos que a estrutura palatina das ratitas era primitiva e parecida com a dos dinossauros […] Este novo estudo é um exemplo notável de como apenas alguns restos fósseis importantes – analisados ​​com um olhar atento – podem derrubar algumas noções antigas e acalentadas.”

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