Uma muda da planta de tabaco (Nicotiana tabacum) agora emite luz graças à inserção de genes de cogumelo bioluminescente.
A planta luminosa
A startup russa Planta está um pouco mais perto de seu objetivo de criar plantas luminosas. Um grupo liderado pelos sócios da empresa, o bioquímico Ilia Yampolsky e o biólogo sintético Karen Sarkisyan, produziu plantas de tabaco que emitem uma perceptível luz verde, de acordo com artigo publicado no dia 27 de abril na revista Nature Biotechnology. Os dois são pesquisadores do Instituto de Química Bio-orgânica Shemyakin-Ovchinnikov, em Moscou, e Sarkisyan está à frente de um laboratório de biologia sintética do Imperial College de Londres, no Reino Unido.
A tecnologia agora anunciada traz mudanças significativas em relação às conquistas anteriores, que exigiam regar a planta com o substrato para a reação, a luciferina, além de exposição fotográfica de várias horas para detectar luz. “Em um quarto bem escuro agora é possível ver o brilho a olho nu e fotografar com um celular”, diz o químico Cassius Stevani, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP).
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Stevani não participou do desenvolvimento da planta bioluminescente, mas é colaborador de longa data dos colegas russos, com quem descreveu o mecanismo da produção luminosa dos cogumelos e ajudou a desenvolver etapas anteriores que levaram às plantas anunciadas agora. O pulo do gato foi perceber que o ácido cafeico, que muitas plantas produzem naturalmente, é precursor da luciferina, a molécula responsável pela produção de luz. Com essa descoberta, Yampolsky e Stevani descreveram o Ciclo do Ácido Cafeico (CAC), responsável pela bioluminescência de fungos.
O sistema baseia-se na inserção de quatro genes retirados do fungo bioluminescente Neonothopanus nambi, originário do Vietnã e estudado pelo grupo de Moscou. Os genes levam à produção de enzimas essenciais na sequência de reações, que levam à bioluminescência.
Nicotiana benthamiana: brilho na planta inteira é visível a olho nu
As plantas obtidas agora estão ainda longe do objetivo final, que envolve um lucrativo comércio de plantas luminosas e – mais ambicioso – busca contribuir para a iluminação urbana com árvores brilhantes. Para isso é preciso conseguir fazer funcionar em outras plantas (o tabaco foi escolhido por ser um modelo vegetal muito usado em pesquisa científica) e aumentar em pelo menos 10 vezes a produção de luz. “Há várias possibilidades que podem levar a um aumento na emissão de luz”, conta Yampolsky. “Elas incluem tanto aumentar o fluxo de ácido cafeico na rota biossintética desejada [o CAC] quanto a taxa de biossíntese dessa substância e otimizar as enzimas do próprio sistema bioluminescente.”
A Planta e a norte-americana Light Bio detêm as patentes dessa tecnologia e suas potenciais aplicações. Yampolsky estima que sua empresa deva ter o primeiro produto em cerca de dois ou três anos.
Além da parte ornamental, Stevani ressalta usos mais utilitários na pesquisa científica. Por exemplo, como marcador para estudar a bioquímica de plantas, inclusive aquelas mais importantes na agricultura. Enquanto isso, a pesquisa básica segue.
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Stevani, cujo foco é o mecanismo bioquímico, agora está estudando mais a fundo as propriedades da luciferase de N. nambi, enzima responsável pela produção de luz, que os colegas russos conseguiram produzir em laboratório com a ajuda de leveduras e lhe enviaram. Ele também segue a pesquisa com cogumelos bioluminescentes brasileiros, o que inclui a constante busca por espécies novas em Iporanga, no Vale do Ribeira, sul do estado de São Paulo, onde estão quase 20% das espécies já descritas no mundo.
Artigo científico
MITIOUCHKINA, T. et al. Plants with genetically encoded autoluminescence. Nature Biotechnology. On-line. 27 abr. 2020.
Este texto foi originalmente publicado por Pesquisa FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.