Novas pistas sobre a evolução da escrita são encontradas em um script raro

Letícia Silva Jordão
Imagem: Biblioteca Britânica

A evolução da escrita e das línguas ao longo do tempo está baseada em longas séries temporais de escritos, mas existe um modelo de escrita raro chamado “Vai” criado por homens analfabetos e que forneceu novas ideias de como a escrita evoluiu.

Segundo o antropólogo linguístico Piers Kelly da Universidade da Nova Inglaterra na Austrália, “a escrita Vai da Libéria foi criada do zero por volta de 1834 por oito homens completamente analfabetos que escreviam com tinta feita de bagas esmagadas”.

Mas, a forma que essa língua continuou a se desenvolver até os dias atuais pode dizer algo importante sobre a evolução da escrita em curtos espaços de tempo.

O início da escrita “Vai”

A língua “Vai” foi desenvolvida por oito homens totalmente analfabetos que começaram a desenhar símbolos para cada uma das sílabas de seu idioma, sendo que todos se inspiraram em seus sonhos.

Após terem desenhado os símbolos, eles receberam uma aula informal de um professor alfabetizado, que depois passou todo o conhecimento da língua para um aluno. Essa forma que a língua nasceu não é muito diferente de outros modelos. 

Acredita-se que os primeiros sistemas de escrita tenham sido criados por pequenos grupos de pessoas que pertenciam à mesma geração, como ocorreu com a escrita “Vai”. Porém, a equipe observou que conforme o modelo de escrita avançava por diversas gerações, ela ficava mais simples ao longo do tempo.

Kelly disse que “há uma famosa hipótese de que as letras evoluem de imagens para sinais abstratos”. A equipe dá como exemplo “a cabeça de boi icônica dos hieróglifos egípcios, que se transformou no fenício [aleph] e, eventualmente, na letra romana A”. Os arqueólogos também disseram que provavelmente os sinais da escrita iniciaram com termos mais complexos, para depois se tornar mais simples nas novas gerações.

A evolução da escrita e a simplificação das linguagens

O alfabeto de 200 sílabas foi analisado por Kelly e seus colegas do Instituto Max Planck. Eles viram que ao longo dos primeiros 171 anos de sua história, a escrita “Vai” de fato se tornou mais simples. Isso ocorreu ao longo de gerações, onde os símbolos mais complexos foram simplificados.

Segundo a equipe, essas mudanças não foram totalmente aleatórias já que as línguas passam por um processo de seleção natural a partir da memória e do aprendizado, onde as características mais difíceis de lembrar não sobrevivem.

“A complexidade visual é útil se você estiver criando um novo sistema de escrita. Você gera mais pistas e maiores contrastes entre os signos, o que ajuda os alunos analfabetos. Essa complexidade mais tarde atrapalha a leitura e a reprodução eficientes, então desaparece”, diz Kelly sobre essa mudança nas línguas.

Outro fator que influencia na simplificação das letras é na forma que a escrita é feita. Com o passar do tempo, a invenção do papel e os computadores desempenharam um papel importante na simplificação das línguas do mundo.

Porém, no caso da língua “Vai”, ela continuou a simplificar durante todo o século XIX, que foi um período que não teve muitas mudanças na forma escrita, indicando assim que mudanças na tecnologia de escrita não são a única razão para a simplificação da língua.

Por mais que a evolução da escrita da língua “Vai” tenha uma rapidez notável, os pesquisadores sugerem que isso ocorreu porque seus inventores e usuários já conheciam o impacto das línguas, o que pode ter incentivado as pessoas a otimizar o sistema.

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