Wesley Sousa é graduando em Filosofia pela UFSJ.
Introdução
Aristóteles nasceu em Estagira, uma cidade-colônia grega da Macedônia, em 384 a.c e, por durante cerca de vinte anos, foi discípulo de Platão (427 – 347 a.c) na Academia. Aristóteles foi um dos grandes e mais influentes pensadores da humanidade, seus estudos, sobretudo, pairavam sobre diversas áreas do conhecimento, como botânica, astronomia e política. Certamente, foi o mais proeminente discípulo de Platão. Além disso, foi tutor do rei Alexandre, o “Grande”, da Macedônia.
Segundo Warburton (2014, p, 12), “Uma das questões que ocupou a reflexão de Aristóteles foi: “Como devemos viver?”. Sócrates e de Platão já haviam feito essa pergunta.”. Estava Aristóteles, portanto, tentado buscar respostas para o alcance de uma boa vida, uma vida feliz. Assim, para o filósofo grego, a eudaimonia (felicidade) é o fim último de um homem (ser humano) com base à sua ética por meio de seus hábitos cotidianos.
Em sua obra Ética a Nicômaco, o filósofo se põe ao exame da moral enquanto doutrina do caráter, de modo indireto ou subordinado à felicidade, pois “É por esse motivo que se a felicidade deve ser adquirida pela aprendizagem, pelo hábito ou por alguma outra espécie de exercício” (ARISTÓTELES, 2015, p. 22). Segundo ele, “A felicidade, portanto, uma vez tendo considerada alguma coisa final [completa] e autossuficiente, é a finalidade visada por todas as ações.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 49).
Nas seções que se seguem abaixo iremos discutir a questão da felicidade na abordagem ética aristotélica. Na vasta obra de Aristóteles, percebemos da mesma maneira que é inconcebível pensar ética e política de maneira dissociada, também é impossível pensar a ética desligada da felicidade. Eis que lembramos a famosa sentença dele em sua Política: “É evidente, pois, que a cidade faz parte das coisas da natureza, que o homem é naturalmente um animal político, destinado a viver em sociedade […]” (ARISTÓTELES, 2009, p. 16).
A felicidade como um fim humano
Aristóteles concebia que as ações humanas conforme as virtudes nos levam à felicidade. Argumentava ele que quanto mais o homem exercitava a virtude, mais virtuoso seria. Um homem virtuoso e bom consegue aliar força e inteligência; utiliza bem sua riqueza para melhorar seu intelecto. A ética é, portanto, um exercício prático de conhecimento nas ações e escolhas. Consequentemente, a ação ética, de acordo com ele, necessariamente passa pelo equilíbrio, evitando tanto o excesso quanto a falta.
No Livro X de sua Ética a Nicômaco, o filósofo afirma:
“[…] a felicidade não é uma certa disposição de caráter, porque se o fosse poderia ser possuída por um indivíduo que passasse a totalidade se sua vida adormecido, vivendo a vida de um vegetal, ou por alguém que estivesse mergulhado no mais profundos infortúnios” (ARISTÓTLES, 2009, p. 304).
Parágrafos posteriores, Aristóteles nos diz bem que “As atividades desejáveis em si mesmas são aquelas que visam a nenhum resultado além do mero exercício da própria” (ibidem). A felicidade tem, em si, na visão aristotélica, alguns componentes, dentre eles o entretenimento (divertido). A partir daí que ele chega “A conclusão é que a felicidade não se encontra nos entretenimentos” (ARISTÓTELES, 2009, p. 305). Portanto, “Fazer do entretenimento o objeto de nossas buscas sérias e do nosso esforço se afigura tolo e sumamente pueril” (Ibidem).
Como dissemos, para a busca da felicidade (uma vida boa e feliz), Aristóteles sustenta que o objetivo dos homens é alcançá-la através da virtuosidade humana e moderação. Assim ele diz:
“Mas se a felicidade consiste na atividade de acordo com a virtude, é razoável que seja atividade de acordo com a virtude maior, e esta será a virtude da maior parte de nós. […] é a atividade de parte de nós em harmonia com a virtude que lhe é própria consistirá a perfeita felicidade […]” (ARISTÓTELES, 2009, p. 306).
Ratificando esta perspectiva, Nadir Pichler (2004, p. 50) escreve que “são as ações dos homens conforme as virtudes que levam à felicidade, não as ações contrárias à prática virtuosa”. A felicidade está, prossegue, conectada nas atividades práticas da razão. “A virtude da prudência consiste em sabe discernir, deliberar e calcular bem as ações do homem, isto é, ‘escolher os meios necessários para alcançar um fim bom’”. (PICHLER, 2004, p. 97).
Na obra Ética a Nicômaco, o pensador grego argumenta uma questão interessante: para ele as crianças não estão aptas a serem felizes, pois não têm idade o suficiente para a capacidade de atos nobres. Neste sentido, afirma:
“Quando nos referimos às crianças como sendo felizes, trata-se de um cumprimento pelas expectativas que alimentamos em relação a elas para o futuro. A felicidade, como afirmamos, requer tanto virtude completa quanto a vida completa” (ARISTÓTELES, 2009, p. 56).
Outro ponto importante expor aqui é que o autor não dissocia, a rigor, a felicidade como alcance do Sumo Bem até mesmo na ação política. Para isso, diz que “ninguém deseja estar na guerra por estar na guerra, nem toma medidas deliberadamente para causar uma guerra” (ARISTÓTELES, 2009, p. 308).
Isso significa que, em Aristóteles, ética e política são duas partes distintas de um mesmo corpo investigativo; em ambas há – diferentes de outras ciências do ponto de vista aristotélico – um fim prático, na promoção e manutenção da felicidade humana. A ação em conformidade do fim particular de cada um às finalidades delimitadas pela comunidade política da qual pertence. E ele complementa:
“Mas a atividade do político também é privada de ócio e visa assegurar algo que transcende a mera participação na política, ou seja, poder e honras, ou, aconteça o que acontecer, felicidade para ele e seus concidadãos […]” (ibidem).
O caráter da ética no alcance felicidade
A ética aristotélica, podemos dizer com segurança, também é uma ética da virtude. Contudo, o caráter do homem não é inato ou determinações da natureza puramente, bem como não é um destino próprio dele mesmo ou de sua condição social.
Mas, nesta concepção, um processo contínuo da ação, da racionalização de suas paixões e desejos, para sua vida plena na pólis (cidade). Podemos assegurar que pelo exaustivo trabalho intelectual da investigação do autor, o alcance da verdadeira felicidade e dos prazeres púnicos e perenes é um objeto primordial da Ética a Nicomâco para suas investigações.
Segundo Pichler, “a virtude moral não é natural e nem tão natural, mas a natureza dá ao homem uma potencialidade para adquiri-la” (2004, p.62). Isso porque, prossegue o comentador, “a natureza da virtude moral como disposição ou hábito […] faz-se necessário examinar qual a justa proporção dela” (2004, p. 63).
A seguir, Aristóteles, fala de duas formações de virtude:
“Algumas formas de virtudes são chamadas de virtudes intelectuais e outras de virtudes morais. A sabedoria e o entendimento e a prudência são virtudes morais. Ao descrevermos o caráter moral de alguém, não dizemos que se trata de alguém sábio ou capaz de entendimento, mas que é uma pessoa moderada ou sóbria. Mas um homem sábio também é louvado por sua disposição e chamamos de virtudes as disposições dignas de louvor. (ARISTÓTELES, 2009, p. 65).
No Livro X, nos primeiros parágrafos da Ética a Nicômaco, o filósofo salienta que para as ações virtuosas, ou seja, ações nobres, éticas; mas antes disso ele sustenta que “em síntese, nossas disposições morais são formadas como produto das atividades correspondentes” (ARISTÓTELES, 2009, p. 68).
A virtude, como meio do alcance da felicidade, nas boas ações, condutas e vicissitudes, segundo o pensador grego “é, então, uma disposição estabelecida que leva à escolha de ações e paixões e que consiste essencialmente na observância da mediania relativa a nós” (ARISTÓTELES, 2009, p. 77).
Assim, consequentemente, no Livro X, ele reforça que “discutir o prazer, pois se pensa ser ele aquilo que está mais estritamente vinculado à nossa natureza humana” (ARISTÓTELES, 2009, p. 291). Portanto, como sintetiza o próprio Pichler, “A felicidade é uma atividade desejável em si mesma, autossuficiente, nobilitante, finalidade última da natureza humana” (PICHLER, 2004, p. 104).
E, nesse sentido, Aristóteles argumenta que a especulação, isto é, “a felicidade perfeita é alguma forma de atividade especulativa” (ARISTÓTELES, 2009, p. 310). Chegando, no findar das contas, “A conclusão é que a felicidade é alguma forma de especulação” (ARISTÓTELES, 2009, p. 311).
A ética, para o filósofo de Estagira, é uma força dinâmica, cuja ela é capaz de despertar a virtuosidade no que o homem tem mais de essencial em sua vida: a busca pela verdadeira felicidade. Portanto, a ética está no agir, em outras palavras, na ação prática para este fim.
Considerações finais
Vimos que a abordagem ética em Aristóteles como alcance da felicidade está correlacionada à atividade do homem enquanto tal. Na sua prática cotidiana, nós temos uma teleologia, por assim dizer, do Sumo Bem, em outras palavras, a finalidade do alcance da felicidade por vias éticas em sua conduta virtuosa – ou seja, a virtuosidade de ser para suas atividades práticas.
Sucintamente, assim o autor comenta:
“Dessa forma, se entre as ações virtuosas as ações militares ou política se distinguem pela nobreza e pela grandeza, e estas não se relacionem com o lazer, visam uma finalidade, e não são desejáveis por si mesmas, enquanto atividade racional, que é contemplativa, parece ser superior e mais valiosa por sua seriedade, além de não visar a nenhum outro fim que não ela mesma, e ter em si o seu prazer próprio […], e a autossuficiência, o lazer, a ausência de fadiga […], e todos os demais atributos das pessoas sumamente felizes são evidentemente, os que relacionam com essa atividade – seguem, então, que essa (atividade racional) será a felicidade completa do homem, desde que tal atividade lhe seja agregada por toda existência, pois nenhum dos atributos da felicidade por ser incompleto.” (ARISTÓTELES, 2015, p. 221).
Em conclusão, o autor fornece estudos que, para as ações concretas, o homem deve não apenas agir por agir, mas agir bem: o agir conforme as disposições finalísticas de suas capacidades na busca – aqui a felicidade – conforme uma ética atrelada às virtudes humanas. A felicidade, portanto, se almeja através do princípio da racionalidade na vida cotidiana.
Assim, como apenas uma andorinha apenas não faz verão[1] (parafraseando o próprio), um homem não consegue atingir, por si, suas potencialidades de forma meramente isolada, porque, segundo Aristóteles dizia, o isolamento é típico de um animal selvagem ou dos deuses, como afirma em sua Política². Portanto, o homem para viver bem e feliz, precisa estar em comunhão com sua comunidade – em termos mais modernos, a sociedade.
Referencias bibliográficas:
ARISTÓTELES. A Política. Tradução Nestor Silveira Chaves. Editora Edipro. Bauru – SP, 2009. (Clássicos Edipro)
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução, textos adicionais e notas, Edson Bini. Editora Edipro. Bauru – SP; 3° edição, 2009.
ARISTÓTELES. Ética a Nicomaco. Tradução Torrieri Guimaraes. Editora Martin Claret. São Paulo – SP. 6° edição, 2015.
NIGEL, Warburton. Uma breve história da filosofia. Tradução de Rogério Bettoni. Porto Alegre. Ed. L&PM, 2014.
PICHLER, Nadir Antônio. A felicidade na ética de Aristóteles. UPF, Passo Fundo – RS, 2004.
¹ Metáfora que Aristóteles escreve em sua Ética a Nicômaco, pois, para ele, assim como uma andorinha não representa o verão, pequenos prazeres não significa a felicidade por inteira.
² Livro I da Política