Primatas são um dos mamíferos mais estudados na biologia pela sua proximidade com os seres humanos. Não apenas no mapa genético, mas também nos comportamentos. Biólogos já observaram, por exemplo, que os chimpanzés conseguem se lembrar de amigos após décadas separados e que podem cooperar com estranhos em determinadas circunstâncias. Porém, agora não são apenas os primatas que revelaram capacidades cognitivas impressionantes. Aves como o calau-oriental se mostram tão habilidosas quanto os símios.
Permanência do objeto é um conceito desenvolvido pelo psicólogo Jean Piaget que define a capacidade de representar mentalmente objetos que não são perceptíveis com base em estímulos sensoriais. Em termos mais simples, é a habilidade de saber que determinado objeto existe mesmo que esteja escondido.
Essa habilidade foi demonstrada em apenas alguns animais, como os primatas. Em outras categorias, especialistas conseguiram observar a permanência do objeto em certas espécies de corvos e psitacídeos, conhecidos por serem inteligentes. No entanto, nenhuma das aves avaliadas obteve resultados comparáveis aos dos macacos. Pelo menos, não até um estudo recente, publicado no periódico Biology Letters, com o calau-oriental sugerir que essa espécie pode possuir habilidades cognitivas comparáveis às dos primatas.
Calau-oriental pode ser mais inteligente do que pesquisadores imaginavam
Segundo o estudo, o Anthracoceros albirostris, ou calau-oriental, possui uma compreensão avançada de objetos que não podem ser vistos. Tal habilidade teria se desenvolvido graças à necessidade das fêmeas dessa espécie de que seus parceiros lhe tragam comida quando estão cuidando do seu ninho. Para proteger seus ovos, as fêmeas fazem ninhos nas cavidades de árvores e fecham o buraco com uma mistura de lama, saliva, cascas, frutas e fezes, deixando apenas uma fenda estreita de onde recebem a comida dos seus parceiros. Isso revela que os machos têm a capacidade de entender que suas parceiras estão vivas por trás da parede mesmo não podendo vê-las quando vão buscar por alimentos.
Os psicólogos Ruitong Yao e Elias Garcia-Pelegrin, ambos da Universidade Nacional de Singapura, foram os responsáveis pelo estudo. Eles explicam que, partindo da perspectiva evolutiva, essa capacidade de representar outros animais e objetos fora da vista foi o que proporcionou a essas espécies formas de sobreviver a predadores e se reproduzir.
Na sua pesquisa, Yao e Garcia, fizeram testes com seis espécimes de calau-oriental. Primeiro eles ensinaram as aves a indicarem com uma bicada onde estaria a recompensa, uma comida que elas gostam, ainda visível. Depois a dupla criou testes um pouco mais avançados para determinar qual era o nível de permanência de objeto que o calau-oriental possuía. A partir do nível cinco, as recompensas eram colocadas sob uma xícara de plástico opaca e depois movidas para uma segunda xícara. Nesse estágio o deslocamento ainda é feito de forma visível.
Todos os seis pássaros testadores foram capazes de chegar ao nível cinco. Porém, no estágio seguinte, o número caiu para três. No sexto estágio, antes de ser movida para segunda xícara, a recompensa é escondida numa pequena caixa vermelha. A caixa então é movida para debaixo da outra xícara. A recompensa é retirada da caixa, permanecendo na xícara, sem que o calau-oriental visse. Quando a caixa foi então mostrada estar vazia para aves, algumas delas foram capazes de raciocinar que ela deveria ter ficado sob a xícara, revelando a capacidade de saber da existência de um objeto mesmo que eles não o vejam.
Para Yao e Garcia, entender esse deslocamento de forma não-visível é uma capacidade bem complexa para um animal, afinal ela envolve o uso de várias habilidades cognitivas: memória, raciocínio espacial e inferência lógica. Eles destacam que dos pássaros reprovados no sexto estágio não tiveram nenhuma experiência com parceiros para reprodução.
Entretanto, eles admitem que pode ser apenas uma coincidência, afinal apenas seis pássaros foram testados. Para confirmar essa habilidade, novos estudos com amostras maiores de aves devem ser feitos. De qualquer forma, os resultados já indicam que o calau-oriental tem um nível de inteligência maior do que se esperava.