Algumas espécies de peixes passam semanas com pouca ou quase nenhuma comida, para poder guardar ovos dentro da boca. Esse ato formidável surpreende ainda mais com a descoberta de que alguns peixes machos fazem isso até mesmo quando não são os parentes biológicos dos ovos que estão protegendo.
A razão por trás disso, assim como os detalhes do processo, ainda são desconhecidas, mas há algumas sugestões sobre o assunto.
Ambientes aquáticos podem ser perigosos para quem não está preparado. Para impedir que os ovos se tornem o jantar de outro peixe, muitas espécies desenvolveram um tipo de “incubação bucal”, onde um dos pais guarda os ovos num local onde os predadores não podem encontrá-los: dentro da boca.
Há desvantagens nisso, uma vez que torna o processo de se alimentar difícil ou até impossível.
Pesquisadores da Universidade Charles Darwin resolveram explorar esse processo em duas espécies australianas, e os resultados foram interessantes.
Como e por que os peixes machos incubam ovos na boca
A autora PhD Janine Abecia contou que, assim como a maioria dos peixes que incubam com a boca, nas espécies Neoarius graeffei e Glossamia aprion são os machos que se encarregam da proteção dos ovos.
“Parece que é uma forma dos machos impressionarem as fêmeas”, explicou ela, pois isso aumentaria suas chances de reprodução.
Ambos os peixes vivem em rios extremamente lamacentos, o que torna difícil estudar seus padrões comportamentais. As poucas observações que temos são de aquários, o que pode não refletir o comportamento deles na natureza.
Mas a lama não esconde o DNA, contudo, e Abecia e os coautores do estudo testaram centenas de membros de ambas as espécies para descobrir se os ovos que eles estavam protegendo eram deles mesmos.
Os resultados do N graeffei cumpriram as expectativas, exibindo pais monogâmicos que cuidavam dos filhotes.
Com o G. aprion, cujo nome comum é “boca toda-poderosa”, o processo teve diferentes resultados, onde frequentemente os peixes machos cuidavam dos filhos de outro pai. Como se leva de 4 a 5 semanas para os ovos dessa espécie para eclodirem, é um sacrifício e tanto pelo bem da espécie.
Em alguns casos, os peixes machos estavam protegendo ovos de diferentes pais, inclusive dele e de outro macho. Outros peixes machos protegiam ovos inteiramente fertilizados por outros machos. Também havia casos onde o macho carregava os ovos que ele mesmo fertilizara, mas que vinham de mais de uma fêmea.
Abecia relatou que a base evolucionária por trás disso é desconhecida. Ela não checou se os ovos pertenciam a um irmão, caso onde poderia haver uma estratégia coletiva de reprodução. As observações em aquários apontam que “o macho começa a pegar [a massa de ovos] em sua cavidade bucal quando eles estão a meio-caminho de saída da fêmea”, segundo observado no estudo.
Isso não permite muito tempo para uma fertilização – especialmente se feita por outro macho – e Abecia contou que “não sabemos quando ocorre a fertilização”.
Há relatos de fêmeas que caçam peixes machos e fazem com que eles cuspam os ovos, talvez como uma forma de fazer com que o parceiro em potencial pare de cuidar dos ovos de outra fêmea, e que abrigue os dela ao invés disso.
Abecia também conta que algumas fêmeas produzem “ovos falsos”, incapazes de se desenvolverem, e que os dão aos machos como uma forma de recompensa.
Os peixes da espécie G. aprion de fato possuem bocas grandes comparadas ao seu tamanho pequeno, e Abecia diz que isso deve tanto a sua natureza como predador de caça como aos comportamentos reprodutivos.
O estudo foi publicado na Biology Letters.