Desde os primórdios da humanidade, Marte raramente passou batido para nós. Com sua vibrante cor vermelha, o planeta é uma atração garantida no céu quando podemos vê-lo. Seu nome, na verdade, é a versão romana de Ares, deus grego da guerra. E na Grécia antiga mesmo, já haviam percebido-o como planeta. Claro, não usando a mesma classificação atual, mas sobretudo diferenciando-o de estrelas. Na própria língua grega, planeta significa “errante”, ou seja, movendo-se sem rumo, de um lado para o outro.
Chega a ser curioso também como Marte foi associado pela história com medo e destruição (como indica o nome de suas duas luas, Fobos e Deimos). Isso porque hoje sabemos sobre o quão pacato o planeta realmente pode ser. É verdade que existem eventos de grande porte por lá, como grandes tempestades de areia. Nada comparado, contudo, ao “inferno” que seria viver em Vênus. Com temperaturas frias e uma atmosfera menos densa, Marte, de fato, parece uma opção mais viável. E, há algum tempo, tem atraído a atenção de humanos que pensam em possíveis esforços de colonização. Assim, entre novas explorações por robôs e planos de viagens tripuladas, nos resta pensar: como seria a humanidade marciana?
Isolados em Marte
Visitar o planeta vermelho já traz obstáculos por si só. Há muito que se estudar sobre problemas logísticos de combustível e energia. Além disso, sobre como lidar com a radiação solar. Ou até mesmo preservar a saúde dos astronautas a bordo. Afinal, nunca poderia ser simples viajar para além de 50 milhões de quilômetros de distância de nós. Chegando no planeta, contudo, novos desafios surgem. E, além deles, mudanças. Inclusive, nos próprios residentes de Marte.
“Dado o quão diferente é o ambiente marciano, você poderia esperar uma forte seleção natural”, afirma Scott Solomon, biólogo evolucionista da Universidade Rice, nos EUA. Em seu livro Future Humans, de 2016, o pesquisador pensava sobre a evolução humana nos tempos modernos e no futuro. Parecia um passo natural para o cientista, assim, pensar em como seriam os mesmos processos também em outro planeta.
Uma questão importante, de cara, seria o isolamento dos novos habitantes de Marte. Aliás, o quão isolados realmente estariam. Isso porque com mudanças frequentes de humanos entre os planetas, seriam carregados, vez ou outra, novos genes terráqueos para o nosso vizinho. Assim, os efeitos de novas mutações genéticas poderiam ser desacelerados. Em nosso planeta mesmo, quando nossos ancestrais evolutivos começaram a se espalhar, milhares de anos se passaram para novas espécies se desenvolverem. Por outro lado, nossa espécie tem grande capacidade de adaptação. E isso não necessariamente significa um novo tipo de “homo sapiens”. Afinal, povos na Terra em diferentes altitudes e climas, por exemplo, podem desenvolver diferentes traços físicos e genéticos.
A genética do futuro
A evolução humana em Marte, ainda, poderia ocorrer mais rápido do que de costume. Isso se daria pela maior intensidade de radiação na superfície do planeta. Ou seja, haveria uma maior taxa de mutações ocorrendo. Haveria, assim, mais material para a seleção natural operar. A gravidade em Marte, com atração muito menor do que na Terra, também cumpriria um papel importante. Assim, poderíamos ter, tipicamente, humanos mais baixos, com ossos mais densos. Ou com pigmentações diferentes na pele em função da radiação. Talvez, até mesmo, poderíamos ver genes mais resistentes ao câncer de pele.
Até mesmo a escolha da primeira população de Marte poderia ter grande influência para o futuro. Uma proporção maior de ruivos ou descendentes de ruivos, por exemplo, poderia gerar uma ocorrência de genes diferente do que vemos na Terra. Tudo isso, é claro, envolve muita especulação. Porém, embasada no que já conhecemos sobre Marte e sobre nossa genética. Uma pesquisa da NASA com dois astronautas gêmeos já mostrou, por exemplo, modificações genéticas no irmão que foi para o espaço em relação ao que ficou na Terra. Ainda não se sabe, contudo, o que isso significa a longo prazo.
Talvez, ainda, nem precisemos deixar somente a natureza operar. Já temos ferramentas de edição genética, como a técnica CRISPR. Poderíamos, por exemplo, fazer adaptações genéticas antes de viagens para Marte. E depois, no retorno para a Terra, revertê-las. Contudo, é necessário conhecer bem o que modificar e como fazê-lo. Assim, ainda são necessários muitos testes e experimentos para entender, de fato, como será a presença de humanos no planeta vermelho.