A prática de consumir os alimentos que nós, enquanto sociedade, produzimos, parece ser um conceito extremamente evidente e, inclusive, se apresenta como um elemento essencial para estabelecer um sistema alimentar que seja genuinamente sustentável. No entanto, nos deparamos com o obstáculo de uma economia implacável que não facilita a implementação de soluções simples e diretas. Nesse contexto, mais de um terço da comida global produzida em larga escala é desperdiçada ou perdida – isso mesmo, há uma diferenciação.
A dinâmica do consumo de iogurte é um reflexo nítido dessa realidade. Não é uma informação velada que a frequência com a qual os consumidores de iogurte decidem descartar esses produtos após a constatação do vencimento da data de validade se correlaciona diretamente com a quantidade de iogurte que os varejistas conseguem comercializar. Quanto mais iogurte é descartado, maior se torna o volume de vendas para os varejistas deste produto.
Além disso, se considerarmos a lógica dos supermercados no que diz respeito à venda de maçãs, por exemplo, constatamos que para eles podem ser mais resolvidos, do ponto de vista econômico, optamos por eliminar as maçãs que excedem a demanda em depósitos de resíduos, ao invés de promover uma redução nos preços desses produtos. Isso porque a redução do preço poderia resultar em um impacto negativo nas vendas das maçãs que são vendidas pelo valor regular, uma vez que poderia instaurar uma competição de preços desfavoráveis para os supermercados.
É necessário, ainda, considerar também o papel dos grandes produtores comerciais nesse panorama. Estes, com o objetivo de garantir o cumprimento rigoroso dos requisitos com os supermercados, frequentemente optam por cultivar uma quantidade de alimentos que ultrapassa a demanda em torno de 10%. Este comportamento agrava ainda mais o problema global de desperdício de alimentos.
Desperdício da comida global poderia alimentar três bilhões de pessoas
A Organização das Nações Unidas dedicada à Alimentação e à Agricultura, conhecida como FAO, que tem a responsabilidade de supervisionar o que é cultivado e consumido globalmente, elaborou uma estimativa bastante preocupante. Segundo esta entidade, um terço dos alimentos produzidos para o consumo humano em escala mundial é perdido ou potencialmente desperdiçado. Esse desperdício ocorre ao longo de toda a cadeia de produção e consumo, que se estende desde as fazendas e se ramifica até as fábricas de processamento, mercados, operações de serviços de alimentação, estabelecimentos de varejo e até mesmo em nossas próprias cozinhas.
Esse volume de alimentos perdidos ou desperdiçados chega a 2,8 trilhões de libras, quantidade mais do que suficiente para nutrir aproximadamente três bilhões de pessoas. O caso dos Estados Unidos é ainda mais acentuado. Neste país, o desperdício de alimentos atinge mais de 30% de toda a sua produção, representando um valor estimado em 162 bilhões de dólares por ano que não chega a ser consumido, embora 49 milhões de pessoas estejam oficialmente em situação de insegurança alimentar – totalizando 805 milhões em todo o mundo.
Para ilustrar a magnitude deste desperdício, imagine que toda essa comida não fosse consumida empilhada em um campo de futebol. As camadas formadas por essa quantidade de alimentos resultariam em uma poluição ecológica, uma espécie de caçarola em transição, alcançando milhas de altura.
Perda versus desperdício
Qual seria a distinção entre a perda e o desperdício de alimentos? Para elucidar essa questão, é importante destacar que o desperdício de alimentos se manifesta principalmente no final do ciclo alimentar, abrangendo as etapas de varejo e consumo. Como regra geral, é possível afirmar que, quanto mais ricas são as nações, mais expressivamente tende a ser a sua taxa de desperdício de alimentos per capita.
Por outro lado, a perda de alimentos se dá de forma mais intensa na parte inicial da cadeia alimentar, ocorrendo principalmente durante as etapas de produção, pós-colheita e processamento. Este fenômeno é consideravelmente menos comum em nações industrializadas quando comparado com países em desenvolvimento. Estes últimos, frequentemente, enfrentam deficiências em sua infraestrutura, que acabam por dificultar a entrega de todos os seus alimentos, em condições adequadas para consumo, aos seus cidadãos que estão ansiosos para consumi-los.
O que já está sendo feito para consertar a Cadeia Alimentar
Nos países desenvolvidos, é observável que práticas agrícolas altamente eficientes, aliadas a sistemas avançados de condução e transporte, além de armazenamento e comunicações de alto padrão, garantem que a maior parte dos alimentos que cultivamos coincidiu com a etapa de varejo.
Contudo, a partir deste ponto na cadeia de produção e distribuição, as coisas tendem a se deteriorar rapidamente. De acordo com a FAO, as nações industrializadas destinaram cerca de 1,5 trilhão de libras de alimentos por ano. Para se ter uma ideia do tamanho desse volume, essa quantidade é praticamente equivalente à produção líquida total de alimentos da África subsaariana.
Paralelamente a isso, os agricultores estão aprendendo novas técnicas para cuidar ou embalar suas colheitas visando um armazenamento mais prolongado. Stephanie Hanson, vice-presidente sênior de políticas e parcerias do One Acre Fund, uma organização com origem na África, ilustra este fenômeno.
Ela observa que os agricultores com quem trabalha na África Oriental não tiveram excedentes no passado – eles consumiram tudo o que cultivaram no período de três meses. Entretanto, agora que eles estão conseguindo produzir mais alimentos, surge a necessidade de aprender novas práticas de armazenamento, a fim de evitar o desperdício desses excedentes.
Outro ponto importante e primordial para diminuir o desperdício e perda da comida global é fazer com que as pessoas percebam que existe um problema.