As primeiras mulheres montanhistas subiam até o topo de montanhas na Europa usando saia já em 1809. Nesse contexto, o século XVIII foi marcado por revoluções importantes que mudaram os rumos da sociedade na época e repercutem até os dias atuais, sobretudo a Revolução Industrial de caráter econômico e a Revolução Francesa de caráter político, como também o Iluminismo, marcado pela disseminação do conhecimento em detrimento do pensamento religioso que predominava. O movimento social que se consolidou na luta por igualdade de condições entre homens e mulheres — o Feminismo — também surgiu durante as revoluções liberais do mesmo período.
Numa época marcada pela enorme e séria desigualdade em todas as esferas, além da repressão social, as mulheres alpinistas fizeram de suas aventuras uma forma de resistência feminina, representatividade e união.
Mulheres montanhistas faziam escaladas de saias para se manterem decentes
Antes mesmo de conseguirem o direito ao voto, as mulheres escalavam grandes geleiras, enfrentando condições inóspitas e ambientes hostis pelo mundo com saias da Era Vitoriana para manter a decência, pois o uso de calças pelo sexo feminino ainda era visto como algo escandaloso e, portanto, proibido. Contudo, esses fatores não impediram que grandes personalidades se destacassem no meio.
A primeira mulher na Grã-Bretanha a se tornar famosa como tal, Mary Isabella Charlet-Straton, fez várias subidas nos Alpes com Emmeline Lewis Lloyd, bem como a primeira subida de inverno do Mont Blanc com seu futuro marido Jean Charlet ainda em janeiro de 1876.
Na ocasião, o feito foi publicado em vários jornais locais e estrangeiros, o que fez com que Charlet se tornasse uma celebridade da escalada e ganhasse diversas homenagens, como o pico Pointe Isabella que recebeu seu nome após ela participar de sua primeira ascensão. Além disso, o Pointe Isabelle, um hotel em Chamonix, tem como tema suas muitas aventuras e realizações nas alturas.
Primeira mulher a escalar o Mont Blanc
Embora Charlet tenha se destacado como sendo uma importante figura entre as primeiras mulheres montanhistas, ela não foi a pioneira na escalada do Mont Blanc. O crédito por essa bravura é de Marie Paradis, uma pobre criada de Chamonix que escalou, com muita relutância, a montanha mais alta da Europa já em julho de 1808.
Ela não era uma entusiasta dos alpinos, mas estava ansiosa para ganhar fama e fortuna rapidamente. Quase no final da última subida, Marie encontrou dificuldades que mal conseguia respirar, falar e até mesmo enxergar. A exaustão era tamanha que ela pediu aos seus companheiros que a jogassem na fenda mais próxima para acabar com sua fadiga.
No ano seguinte (1809), ela registrou a experiência relatando que o fato foi “admiravelmente gráfico e pitoresco” e fez uma fortuna com sua conquista – mesmo não tendo sido bem sucedida, uma vez que ela foi arrastada para o cume – não à toa ficou conhecida como “Maria de Mont Blanc”. De acordo com alguns relatos, após sua própria escalada bem-sucedida, ela deixou refrescos para outras pessoas que chegaram ao topo.
Após 30 anos, a segunda mulher a escalar o Mont Blanccom sucesso foi Henriette d’Angeville. Ela vestia uma roupa de 7 quilos e fez todo o trajeto de forma ágil. Entretanto, por conta das roupas, sobretudo saias com várias camadas e espartilhos, alcançar o topo das montanhas era muito mais dificultoso para as mulheres do que para os homens.
Subversão feminina
Além de desafiar a desigualdade de gênero e viver paralelamente a uma sociedade que afirmava que “escalar montanhas não é coisa de mulher”, as mulheres montanhistas contavam com a dificuldade imposta devido à estrita etiqueta de vestimenta da época. É inegável, no entanto, o poder da subversão feminina: a geógrafa, cartógrafa, exploradora, escritora de viagens e montanhista americana Fanny Bullock Workman é um grande exemplo que estabeleceu vários recordes de altitude para mulheres, ao mesmo tempo em que defendia os direitos e o sufrágio feminino. Há um famoso registro de Workman no Himalaia no qual ela estava segurando um jornal que tinha escrito “Votos para Mulheres”.
As destemidas aventuras das mulheres montanhistas reverberaram na criação de um clube de montanhismo exclusivamente feminino na Escócia, o Ladies’ Scottish Climbing Club, que reuniu mulheres com ideias semelhantes.