Tardígrados são provavelmente os animais mais resistentes que conhecemos. Estes bichos sobrevivem a temperaturas absurdas, salinidade e toxicidade altíssimas e até foram parar na Lua por acidente. Agora, talvez pesquisadores tenham feito um tardígrado passar por um entrelaçamento quântico.
Aqui vale um disclaimer: o artigo, publicado no periódico arXiv, ainda não passou pelo estágio de peer-view, que antecede a publicação da pesquisa. Ou seja, especialistas da área ainda não avaliaram a validação dos experimentos e das informações alegadas na pesquisa.
Muitos especialistas, inclusive, duvidam que o entrelaçamento quântico tenha de fato ocorrido com o tardígrado. Contudo, vamos por partes.
Entrelaçamento quântico, em termos extremamente superficiais, é um fenômeno quântico no qual duas partículas ficam ligadas de forma que uma não pode ser descrita sem a outra. Especificamente, qualquer mudança de spin, momento ou polarização em uma das partículas será medida igualmente na outra, mesmo a anos-luz de distância.
Assim, os autores do polêmico novo estudo colocaram um tardígrado sobre um qubit: uma unidade de informação quântica, similar ao bit da computação tradicional. Este qubit então foi entrelaçado quanticamente a um segundo qubit em um sistema quântico, a baixíssimas temperaturas.
De acordo com a pesquisa, os autores mediram mudanças na frequência nos qubits ressonantes com a do tardígrado.
Este animal invertebrado foi a escolha da pesquisa pois eles sobrevivem em ambientes, no mínimo, extremos. Os tardígrados toleram doses altas de radiação, temperatura e toxicidade entrando no chamado estado de criptobiose. Basicamente, toda a matriz das células do bicho é substituída por um coloide que preserva a forma e função de proteínas.
Caso validada, a temperatura do tardígrado no estudo será a menor já registrada em que o animal sobreviveu: 10 mK (apenas 0,01°C acima do zero absoluto).
Discordâncias sobre o entrelaçamento quântico
O professor de física da Rice University, Douglas Natelson, foi um dos especialistas a discordar veementemente das alegações da pesquisa, em seu blog.
“O que os autores fizeram foi colocar um tardígrado em cima de uma das partes capacitivas de dois qubits transmons. O tardígrado é principalmente água (congelada), e aqui ele funciona como um dielétrico, mudando a frequência de ressonância do qubit que estava em cima.”
“Isso não é entrelaçamento de nenhuma forma significativa. Se fosse, você poderia dizer pelo mesmo raciocínio que os qubits estão entrelaçados com o substrato macroscópico do chip de silício.”
Basicamente, apesar de o tardígrado alterar as condições do qubit, e vice-versa, isso não necessariamente representa um entrelaçamento. Para tirar essa conclusão, seria necessário que os autores medissem as características quânticas do animal, o que não ocorreu na pesquisa.
O pré-artigo está disponível no periódico arXiv.