Lentes gravitacionais são excelentes maneiras de se utilizar determinados objetos, como estrelas, buracos negros, aglomerados estelares, galáxias e aglomerados de galáxias como uma verdadeira lente de amplificação. Mas ao invés de utilizar algum objeto distante como lente gravitacional, por que não utilizar o próprio Sol para tal? A maior vantagem disso é ampliar objetos próximos, ao invés de ampliar somente objetos entre milhares e milhões de anos-luz de distância da Terra.
Uma dupla de físicos teóricos, então, fez a mesma pergunta. Eles descreveram sua ideia em um artigo publicado por ora somente como preprint, no arXiv. Além disso, o estudo passa, no momento, por uma revisão para uma possível publicação no periódico Physical Review D. Os físicos são Viktor Toth, do Perimeter Institute for Theoretical Physics, no Canadá, e Slava G. Turyshev, físico no Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da NASA.
Vale ressaltar, antes, que lentes gravitacionais não servem apenas para amplificar imagens. Na verdade, elas ajudam a mensurar quantidades de matéria escura em determinadas regiões do espaço, mensurar os tamanhos de galáxias e aglomerados de galáxias, entre outras leituras científicas importantes.
O que é uma lente gravitacional?
Einstein publicou há mais de cem anos, em 1915, a Teoria da Relatividade Geral. A teoria revolucionou a compreensão do universo e da gravidade pela ciência. Os cientistas sabiam que a gravidade existe, e Newton até mesmo a descreveu em casos gerais (desconsiderando casos extremos, onde as equações de Newton não funcionam).
Em resumo, Einstein mostrou que o que causava a gravidade era a distorção do espaço-tempo pelos objetos. Quando nos movimentamos, acompanhamos o espaço distorcido, e isso causa o efeito que chamamos de gravidade. E essa é, portanto, a peça-chave para o efeito da lente gravitacional.
A imagem abaixo demonstra o efeito:
Como você pode observar, a luz percorre o espaço distorcido pelo objeto utilizado como lente gravitacional. Forma-se, no fundo, ainda um anel de Einstein, “efeito colateral” da distorção da luz. O ponto é: conseguimos amplificar as imagens com o efeito.
Mas há um grande desafio nas lentes gravitacionais. Há uma região focal específica – isto é, você precisa olhar a estrela, aglomerado de estrelas ou galáxia a uma determinada distância para ampliar as imagens à frente. Para objetos distantes, esse não é um problema muito grande. Mas para objetos mais pertos, precisaríamos nos afastar.
Mas Toth e Turyshev pensaram nisso. Eles calcularam que a região focal do Sol inicia-se em cerca de 550 unidades astronômicas (UA) do Sol. Uma unidade astronômica é a distância média entre o Sol e a Terra – cerca de 150 milhões de quilômetros. Portanto, esse ponto localiza-se a 82,5 bilhões de quilômetros do Sol.
Desafios
Bom, essa não é uma distância inalcançável, mas é bem longe. As sondas mais distantes que o ser humano já enviou são as Voyagers, que viajam a mais de 40 anos. Mas elas localizam-se, ainda, a apenas 150 UA da Terra. Portanto, nesse ritmo elas levariam um total de quase 150 anos para chegar a esse local.
E há outros dois detalhes técnicos importantes. O primeiro, é que, conforme destaca a dupla em seu artigo, a lente gravitacional solar (SGL, na sigla em inglês) “possui astigmatismo”. Portanto, precisamos de um bom algoritmo para corrigir as distorções. Outra questão são as limitações impostas pelo brilho do Sol e sua coroa, já que nós nos localizamos a uma distância extremamente pequena do Sol.
Vamos supor que em cenário otimista, nos próximos 50 anos os cientistas descubram como chegar a 550 unidades astronômicas em um tempo realista – digamos uma ou duas décadas de viagem com nanorobôs propulsionados por velas solares ou velas a laser. Nesse caso, quando a espaçonave com o telescópio chegar na região focal, a tecnologia não estará tão defasada quanto em uma viagem de um século e meio.
Nesse cenário, poderíamos enxergar detalhes de exoplanetas próximos – como por exemplo, sinais de vegetação. Outras estrelas estão muito distantes da Terra, então demoraremos para desenvolver a tecnologia necessária para chegar lá (isso se conseguirmos). Portanto, utilizar o Sol para enxergar detalhes em outros planetas, na busca por vida, é uma saída bastante inteligente.
O estudo foi publicado no arXiv e segue em revisão pela Physical Review D. Com informações de Universe Today e NASA.