Ouvimos sempre sobre a crença de que as cobras são surdas. É algo intrínseco à crença popular. Acreditava-se sempre que as cobras só pudessem sentir vibrações táteis — ou seja, sentir pelo corpo as vibrações do solo, detectando assim, por exemplo, passos ou movimentações próximos a ela.
Entretanto, um novo estudo sugere que elas possuem, sim, alguma capacidade de ouvir vibrações sonoras. O estudo foi publicado em fevereiro no periódico PLOS One. “Evidências sugerem que as cobras podem ouvir, mas como as cobras respondem naturalmente ao som ainda não está claro”, diz o abstrato do artigo.
“Realizamos 304 ensaios experimentais controlados em 19 serpentes em cinco gêneros em uma sala à prova de som (4,9 x 4,9 m) a 27ºC, observando os efeitos de três sons no comportamento individual da cobra, em comparação com os controles”, explicam os cientistas.
“Nossos resultados destacam potenciais respostas comportamentais hereditárias de serpentes ao som, agrupadas dentro de gêneros. Nosso estudo ilustra a variabilidade comportamental entre diferentes gêneros de serpentes e entre frequências sonoras, o que contribui para nossa compreensão limitada da audição e do comportamento em cobras”.
Desmentindo que as cobras são surdas — como eles chegaram a essa conclusão?
Para verificar a ideia de que as cobras são surdas — ou a ideia contrária, no caso, os pesquisadores catalogaram oito comportamentos possíveis para as cobras, ao interagir com os sons emitidos. São eles: movimento corporal, congelamento corporal, movimentos de cabeça, movimentos de língua, assobios, “periscoping” (posição de ataque da cobra), fixação da cabeça e queda de mandíbula inferior.
Além disso, eles utilizaram três tipos diferentes de sons: um que produziu vibrações no solo e dois que não produziram vibrações e que, portanto, só poderiam ser percebidos por meio de algum tipo de audição.
“Apenas um gênero aumentou significativamente sua probabilidade de movimento em resposta ao som, mas três outros gêneros eram mais propensos a se afastar do som, sinalizando potencial comportamento de evitação”, explicam os pesquisadores.
Nem tão importante, mas importante
Alguns sentidos não são tão importantes para algumas espécies. Por exemplo, o ser humano possui uma visão melhor do que os cachorros, mas os cachorros possuem audição e faro muito mais apurados do que os humanos.
Alguns animais, como algumas espécies de peixes, por exemplo, são praticamente cegas — seus olhos conseguem somente distinguir onde está claro e onde está escuro, sem resolução suficiente para enxergar objetos.
Para as cobras, a audição não foi um sentido selecionado para se especializar.
“Em comparação com sentidos como visão e paladar, a audição parece menos importante para as cobras em relação a outros animais”.
Mas a audição continua a ser útil, mesmo que em menor definição do que em alguns outros animais. Os pesquisadores explicam que “a audição ainda pode desempenhar um papel importante na entrada sensorial e no comportamento da cobra em relação à aquisição de presas e à prevenção de predadores”.
Elas podem ouvir a fala?
Ok, que as cobras são surdas já sabemos que é um mito. Mas elas podem nos ouvir falando?
Em relação à fala do ser humano, depende de como o ser humano age. Conforme explica a pesquisadora Christina Zdenek, uma das autoras do estudo, em uma matéria publicada no The Conversation, elas ouvem sons altos emitidos pelos seres humanos, como gritos.
“A frequência da voz humana é de cerca de 100-250Hz, dependendo do sexo. Os sons que tocamos em nossos ensaios incluíram essas frequências e foram tocados a uma distância de 1,2m das cobras a 85 decibéis. Trata-se da amplitude de uma voz alta”, explica a pesquisadora.
“As cobras em nosso estudo responderam a esse som, e muitas significativamente. Portanto, provavelmente é seguro dizer que as cobras podem ouvir as pessoas falando alto ou gritando. Isso não significa que eles não possam ouvir alguém falando (uma conversa normal é de cerca de 60 decibéis) — nós simplesmente não testamos o som nesse nível de ruído”, conclui Zdenek.
