Identificados genes que são expressos de forma diferente em homens e mulheres

Pedro Noah

Homens e mulheres diferem em vários aspectos – por exemplo, na prevalência de certas doenças ou em relação a reação às drogas. Mas como isso está relacionado ao seu sexo biológico? Pesquisadores do Weizmann Institute of Science recentemente descobriram milhares de genes humanos que são expressos de forma diferente nos dois sexos.

Seus resultados mostraram que as mutações prejudiciais nesses genes particulares tendem a se acumular na população em frequências relativamente alta. O mapeamento detalhado desses genes foi relatado na BMC Biology, e fornece evidências de que machos e fêmeas passam por uma espécie de evolução separada, porém interligada.

Vários anos atrás, o Professor Shmuel Pietrokovski e o Dr. Moran Gershoni do Departamento de Genética Molecular do Weizmann Institute se questionaram o porquê da prevalência de certas doenças humanas serem comuns. Especificamente, cerca de 15% dos casais que tentam ter filhos são definidos como inférteis, o que sugere que as mutações que prejudicam a fertilidade são relativamente difundidas.

Isso parece algo paradoxal: o senso comum diz que essas mutações que afetam diretamente a sobrevivência da espécie ao reduzir o número de descendentes deveriam ter sido rapidamente eliminadas pela seleção natural. Pietrokovski e Gershoni mostraram que mutações em genes específicos à formação de esperma persistem precisamente porque os genes são expressos apenas nos homens. Uma mutação que é problemática para apenas metade da população, não importa o quão prejudicial seja, é transmitida livremente para a próxima geração pela outra metade.

No presente estudo, os pesquisadores ampliaram suas análises para incluir genes que, embora não sejam necessários para a fertilidade, ainda são expressos de forma diferente em ambos os sexos. Para identificar esses genes, os cientistas voltaram-se para o Projeto GTEx – um estudo sobre a expressão gênica humana registrada em vários órgãos e tecidos do corpo de cerca de 550 doadores adultos. Esse projeto permitiu, pela primeira vez, o mapeamento abrangente da arquitetura genética do sexo humano diferenciado.

Pietrokovski e Gershoni analisaram atentamente cerca de 20.000 genes codificadores de proteínas, classificando-os por sexo e procurando diferenças de expressão em cada tecido. Eles identificaram cerca de 6.500 genes com atividades que estavam ligadas a apenas um sexo ou apenas ao outro em pelo menos um tecido.

Por exemplo, eles encontraram genes que eram altamente expressos na pele dos homens em relação àqueles da pele das mulheres, e perceberam que estes estavam relacionados com o crescimento dos pêlos do corpo. A expressão gênica na estrutura muscular foi maior nos homens; já quanto ao armazenamento de gordura foi maior nas mulheres.

Outras diferenças

Os dois então, notaram as tendências do acúmulo de mutações, para ver se a seleção natural colocou mais ou menos pressão sobre os genes que são específicos para homens ou mulheres. Ou seja, até que ponto mutações prejudiciais são eliminadas ou toleradas na população?

Os pesquisadores descobriram que a eficiência da seleção é mais fraca em muitos desses genes. “Quanto mais um gene era específico de um sexo, menos seleção víamos no gene, e mais uma diferença: esta seleção era ainda mais fraca nos homens”, diz Gershoni.

Embora não tenham uma explicação completa para esta diferença adicional, os pesquisadores apontam para uma teoria da evolução sexual proposta pela primeira vez na década de 1930: “Em muitas espécies, as fêmeas podem produzir apenas um número limitado de descendentes, enquanto que os machos podem, teoricamente, produzir muito mais; de modo que a sobrevivência das espécies dependerá de fêmeas mais viáveis na população do que dos machos”, explica Pietrokovski. “Assim, a seleção natural pode ser mais ‘relaxada’ com os genes que são prejudiciais aos machos.”

Além dos órgãos sexuais, os pesquisadores descobriram alguns genes ligados ao sexo nas glândulas mamárias – não é tão surpreendente, exceto pelo fato de que cerca da metade desses genes são expressos em homens. Como os homens possuem as mamas totalmente aptas, mas basicamente não funcionais, os cientistas fizeram uma suposição de que alguns desses genes poderiam suprimir a lactação.

Verificaram em locais menos prováveis, genes que eram expressos apenas no ventrículo esquerdo do coração das mulheres. Um destes genes, que também está relacionado com a captação de cálcio, mostrou níveis de expressão muito elevados em mulheres mais jovens, mas que diminui drasticamente com a idade. Os cientistas pensam que eles são ativos em mulheres até a menopausa, protegendo seus corações, mas levando à doenças cardíacas e osteoporose em anos posteriores, quando tornam-se inativos.

Ainda outro gene que foi principalmente expresso em mulheres encontrava-se ativo no cérebro, e embora sua função exata seja desconhecida, os pesquisadores acreditam que pode proteger os neurônios de Mal de Parkinson – uma doença que tem uma maior prevalência e início mais cedo em homens. Eles também identificaram a expressão gênica no fígado das mulheres que regula o metabolismo de fármacos, fornecendo evidências moleculares para as diferenças das reações de drogas entre ambos os sexos.

“A composição básica do genoma é quase a mesma em todos nós, mas é utilizada de forma diferente em todo o corpo e entre os indivíduos”, diz Gershoni. “Assim, quando se trata das diferenças entre os sexos, vemos que a evolução muitas vezes funciona ao nível de expressão gênica.”

Pietrokovski acrescenta: “Os genes ligados ao sexo são aqueles em que as mutações nocivas são mais suscetíveis de serem transmitidas, incluindo as que prejudicam a fertilidade. Deste ponto de vista, homens e mulheres passam por diferentes pressões de seleção e, pelo menos até certo ponto, a evolução humana deve ser vista como co-evolução, mas o estudo também enfatiza a necessidade de uma melhor compreensão das diferenças entre ambos, principalmente em relação aos genes que causam doenças ou a forma como respondem aos tratamentos.”

Fonte: Science Daily

Referências

Moran Gershoni, Shmuel Pietrokovski. The landscape of sex-differential transcriptome and its consequent selection in human adults. BMC Biology, 2017; 15 (1) DOI: 10.1186/s12915-017-0352-z 

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