Há quase 3 milhões de anos, nossos ancestrais utilizavam o que hoje são as ferramentas de pedra mais antigas já encontradas. Os objetos foram encontrados por uma equipe internacional de pesquisadores às margens do Lago Vitória, no Quênia, país da África oriental. As ferramentas eram utilizadas pelos ancestrais humanos para abater hipopótamos e trabalhar materiais vegetais.
A pesquisa, publicada em 9 de fevereiro no periódico Science, foi liderada por cientistas do Museu Nacional de História Natural da Instituição Smithsonian e do Queens College, além dos Museus Nacionais do Quênia, Liverpool John Moores University e o Museu de História Natural de Cleveland.
Os artefatos datam de algum momento entre 2,6 e 3 milhões de anos atrás, conforme as análises mais conservadoras. No entanto, os cientistas estão especificando a idade das ferramentas em 2,9 milhões de anos. Nessa época, ainda não havia humanos.
Quem utilizou as ferramentas?
Nas proximidades das ferramentas, os pesquisadores encontraram um par de dentes molares pertencentes a alguma espécie de um gênero de primatas chamado de Paranthropus — os mais antigos restos fossilizados já encontrados de Paranthropus.
Isso levantou um questionamento entre os cientistas.
“A suposição entre os pesquisadores tem sido que apenas o gênero Homo, ao qual os seres humanos pertencem, era capaz de fazer ferramentas de pedra”, disse em um comunicado o pesquisador Rick Potts, autor sênior do estudo. “Mas encontrar Paranthropus ao lado dessas ferramentas de pedra abre um whodunnit [expressão popular para “quem fez isso”] fascinante”.
Indústria Olduvaiense
O termo Olduvaiense (ou Oldowan, no termo em inglês), se refere às ferramentas mais antigas utilizadas pelos primeiros hominídeos. As ferramentas da tradição Olduvaiense estão espalhadas por toda a África.
“Com essas ferramentas, você pode esmagar melhor do que o molar de um elefante e cortar melhor do que o canino de um leão”, disse Potts. “A tecnologia Olduvaiense era como de repente evoluir um novo conjunto de dentes fora do seu corpo, e abriu uma nova variedade de alimentos na savana africana para nossos ancestrais”.
Com essas ferramentas, os hominídeos podiam processar alimentos, sejam animais ou vegetais, possibilitando a alimentação de animais de grandes portes e outros tipos de alimentos que somente a utilização dos dentes não permitiria.
“Este é um dos mais antigos, se não o mais antigo exemplo de tecnologia Olduvaiense”, disse Thomas Plummer, autor principal do estudo. “Isso mostra que o kit de ferramentas foi mais amplamente distribuído em uma data anterior do que as pessoas imaginavam, e que ele foi usado para processar uma grande variedade de tecidos vegetais e animais. Não sabemos ao certo qual foi o significado adaptativo, mas a variedade de usos sugere que era importante para esses hominídeos”.
Essas ferramentas demonstram uma destreza por quem quer que seja que as utilizou – seja humano ou outra espécie de hominídeo, como a possibilidade dos Paranthropus. As ferramentas possuíam uma produção sistemática, e havia diversos tipos para usos específicos – uma grande sofisticação, levando em consideração que estamos nos referindo a 3 milhões de anos atrás.
Nas proximidades, os pesquisadores encontraram restos de hipopótamos com marcas de cortes profundos, demonstrando um claro uso das ferramentas. Na época, os humanos (ou outros hominídeos que utilizaram a ferramenta) ainda não dominavam o uso do fogo, então a carne era consumida crua.
A pesquisa pode trazer luz sobre como era o ambiente em torno dos primeiros humanos na Terra. Se essas ferramentas eram utilizadas por hominídeos de fora do gênero homo (hominídeos não humanos), isso é uma grande ruptura.
“A África Oriental não era um berço estável para os ancestrais de nossa espécie”, disse Potts. “Era mais um caldeirão fervente de mudanças ambientais, com chuvas e secas e um cardápio diversificado e em constante mudança de alimentos. As ferramentas de pedra de Olduvaiense poderiam ter cortado e batido em tudo isso e ajudado os primeiros fabricantes de ferramentas a se adaptarem a novos lugares e novas oportunidades, seja um hipopótamo morto ou uma raiz amiláceo”.
