Ecossistema exuberante descoberto embaixo de plataforma de gelo antártico

Mateus Marchetto
Imagem: David Barnes

Plataformas de gelo no Polo Sul são massas gigantes de gelo que flutuam sobre o oceano e podem ter centenas de metros de espessura. Por esse motivo mesmo, pouco se sabe sobre a vida que se desenvolve no oceano abaixo destas plataformas. Contrariando este paradigma, pesquisadores descobriram um ecossistema exuberante e incrivelmente diverso embaixo de uma destas plataformas.

De acordo com a pesquisa, publicada no periódico Current Biology, a equipe de pesquisadores fez dois buracos de quase 200 metros de profundidade na plataforma Ekström, no mar de Weddell. Essa coleta aconteceu ainda em 2018 com o auxílio de sistemas de propulsão de água quente para furar o gelo.

Incrivelmente, a pesquisa relata a presença de 77 espécies no leito oceânico completamente escuro e de temperaturas abaixo de 0°C. De acordo com os autores, tamanha diversidade é maior do que muitos ecossistemas de mar aberto. Além disso, o ecossistema exuberante tinha ao menos 49 gêneros distintos de Ectoprocta.

O curioso é que a maior parte dos invertebrados encontrados são conhecidos por filtrarem a água em busca de matéria orgânica, sobretudo do fitoplâncton (a parte fotossintetizante do plâncton). Contudo, não há luz ou qualquer evidência de algas e cianobactérias embaixo da plataforma Ekström.

Ou seja, estes organismos devem ter uma fonte de alimento bastante diferenciada e ainda desconhecida, já que o mar aberto fica a quase 10 quilômetros de distância.

Este ecossistema exuberante pode existir há quase 6.000 anos

Após coletar e identificar as espécies e amostras da água, a equipe de pesquisadores realizou a datação por carbono de fragmentos de animais invertebrados mortos no solo oceânico. Qual não foi a surpresa da equipe a descobrir que alguns dos fósseis estavam por lá há pelo menos 5.800 anos.

Bryozoan fragments dated
Imagem: David Barnes

“Outra surpresa foi descobrir por quanto tempo a vida existiu lá. Datação por carbono de fragmentos mortos destes animais do leito oceânico variaram de atuais para 5.800 anos.”, afirma o autor Gerhard Kuhn.

Isso levanta ainda outro problema. Nestes 6.000 anos, alguns momentos especialmente frios provavelmente fizeram com que o gelo alcançasse o solo do oceano, o que teria eliminado o ecossistema exuberante e rico destes animais. Então como eles sobreviveram?

Acredita-se que algumas áreas isoladas tenham mantido condições minimamente plausíveis para a vida nestes períodos, e isso permitiu a sobrevivência da biodiversidade. Contudo, não há evidências fortes para reforçar essa hipótese. Pelo menos não ainda.

Apesar das condições extremas, ainda, os autores ressaltam que o derretimento do gelo pelo aquecimento global podem ter efeitos devastadores sobre estes animais.

“O hábitat menos perturbado na Terra por ser o primeiro hábitat a ser extinto conforme as condições sob-gelo da plataforma desaparecem devido ao aquecimento global.”, alertam os autores.

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