Recentemente, a Neuralink tem gerado bastante expectativa. Um dos fatores que contribui para esse entusiasmo é a busca pela integração do pensamento humano com um computador por meio de um implante cerebral.
A Neuralink é uma das empresas em que Elon Musk está envolvido, e sua tecnologia se inspira no trabalho do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. Grande parte da visibilidade que a empresa recebe se deve ao marketing do empresário. Com tantos comentários positivos sobre a Neuralink circulando, o tema da fusão entre a mente humana e a tecnologia ganhou destaque. Além da Neuralink, outras grandes corporações, como Google e Microsoft, também estão investindo em pesquisas nessa área.
Mas será que a ideia de integrar o pensamento humano a um computador é realmente viável a ponto de transformar completamente a relação entre humanos e máquinas?
O filósofo da Universidade de Oxford, o doutor Nick Bostrom, tem dedicado mais de dez anos a refletir sobre essas questões, e embora o futuro permaneça incerto, Bostrom afirma que é provável que algum tipo de consciência híbrida entre humanos e máquinas se torne inevitável.
Os avanços da Inteligência artificial promete muito para o futuro. Muitos têm medo de quando as IAs possam ganhar consciência – se é que elas teriam uma consciência como nós conhecemos.
“Não temos critérios muito claros para o que torna um sistema computacional consciente ou não”, disse Bostrom. “Se você simplesmente tirar da prateleira as melhores teorias que temos sobre a consciência… não é uma ideia ridícula de forma alguma que possa haver algumas formas de consciência agora ou no curto prazo emergindo desses sistemas [de IA].”
Entretanto, o filósofo espera que algum avanço impressionante ocorra em um futuro, nem que não seja tão próximo quanto muitos esperam.
“Seria triste para mim se, em um milhão de anos, ainda tivéssemos a versão atual da humanidade (…) Em algum momento você pode querer atualizar, então você pode imaginar carregar ou melhorar biologicamente a si mesmo ou todos os tipos de coisas”.
Inteligências artificiais são códigos que tentam imitar, em partes, como o cérebro funciona. Elas tentam imitar, por meio de códigos, as conexões neuronais e como elas se alocam. Isso nos dá, e dá às IAs, um incrível poder de processamento.
“IA é apenas código, código é apenas algoritmos, e algoritmos são apenas matemática, então estamos criando algo matemático na natureza. As pessoas ficam muito místicas sobre o que o cérebro faz… Mas [o cérebro] também passa por algum tipo de processo algorítmico”, disse o matemático Marcus du Sautoy, também de Oxford.
Entretanto, as IAs estão um tanto longe de chegar ao que chamamos de consciência — mesmo que não saibamos exatamente discorrer sobre o que é ser consciente, mesmo que sintamos o que é ser.
As IAs nos ajudam, hoje, nas tarefas onde é mais simples dar comandos. Você manda, elas obedecem. E isso é muito bem no âmbito de produtividade, já que onde há regras e padrões claros, elas são muito melhores do que nós.
“Precisamos repensar o que significa ser humano em um mundo onde a IA cuidou de todas as tarefas práticas e temos uma espécie de mundo resolvido”, diz Bostrom. “Você pode ter uma forma muito mais radical de automação (…) onde talvez trabalhar por dinheiro se torne completamente desnecessário porque a IA e os robôs podem fazer tudo melhor do que nós podemos fazer.”
“Nas camadas mais profundas, você percebe que não apenas nossos esforços econômicos se tornam obsoletos, mas também nossos esforços instrumentais”, diz Bostrom. “Você ainda poderia fazer essas atividades, mas elas seriam inúteis nessa condição (…) Então, o que acreditamos ter valor por si mesmo e não como um meio de alcançar várias outras coisas?”
E, na opinião de Bostrom e Sautoy, estamos a caminho de um futuro híbrido, ou seja, onde o futuro é fundir o pensamento humano com um computador.
“Acho que estamos caminhando para um futuro híbrido”, diz Sautoy. “Ainda acreditamos que somos os únicos seres com um alto nível de consciência. … Isso faz parte de toda a jornada copernicana que não somos únicos. Não estamos no centro.”
E essa fusão pode nos surpreender ao criar uma humanidade que não é exatamente 100% humana. A realidade e o mundo digital podem se fundir em algo que ainda não podemos imaginar.
“Sim, queremos que a humanidade sobreviva e prospere, mas o que exatamente queremos dizer com humanidade?” questiona Bostrom. “Tem que ter duas pernas, dois braços e dois olhos, e morrer depois de 70 anos, ou talvez essa não seja a verdadeira essência da humanidade. Você pode imaginar todas essas coisas mudando bastante … talvez a humanidade cresça em algo muito maior.”