O concreto não é dos materiais mais incomuns em nosso dia-a-dia. Pelo contrário, a mistura de água, cimento e agregados com certeza estará presente na visão de uma pessoa caminhado por qualquer cidade do Brasil. Se selvas de verdade são feitas de árvores, grama e plantas de vários os tipos, a selva de pedra de São Paulo, por exemplo, é feita de concreto. Isso porque ele é, de fato, o material mais utilizado na construção civil. E vem de milhares de anos, datando desde o Antigo Egito (ou até anteriormente) e sendo dominante nas construções da Roma antiga, o que proporcionou, na época, uma verdadeira revolução na história da arquitetura. Ou seja, se boa parte dessas estruturas está bem preservada até os dias de hoje, muito disso se deve a esse material.
Muitos avanços também vieram após as mais antigas utilizações do material, como o concreto armado, de grande importância para a arquitetura do século XX. Isto é, mesmo tendo a história do uso do concreto pela humanidade altos e baixos, sem dúvida, até hoje, é um elemento extremamente importante de nossa organização social. Ao ponto, inclusive, de não nos preocuparmos tanto em entendê-lo como ocorre com outros tipos modernos de material.
Contudo, ainda que a pesquisa de fronteira em ciência dos materiais talvez não foque tanto em concreto, isso não significa que não há nada de novo para descobrirmos sobre a tão importante substância. Muitas propriedades, aliás, ainda podem ser desconhecidas, devido a não haver muito ambientes diferenciados em que ele pode ser testado. Levando o material a um ambiente bem inusitado para sua utilização, então, podemos nos perguntar: como o concreto se comportaria em ambientes fora do planeta Terra?
A cura do concreto
A pergunta parece estranha, mas tem a ver com um processo fundamental da formação do concreto. Isto é, o processo de cura. Esse é o nome que se dá à hidratação do concreto com fins de diminuir o efeito de evaporação da água em uma estrutura concretada, que desencadeia no surgimento de rachaduras e trincas. Ou seja, é crucial para o endurecimento e a confiabilidade do material. Também formam-se no processo silicatos que garantem ao concreto algumas propriedades físicas e mecânicas positivas para edificações.
Enfim, na cura do concreto, independente do ambiente em que o material estiver na Terra, a atração gravitacional do planeta terá influência no processo. Principalmente considerando que, dependendo da estrutura, a cura pode levar semanas ou até meses. Ou seja,torna-se mais complicado, considerando a sua possível longa duração, procurar maneiras de eliminar esses efeitos. É de bastante interesse, portanto, explorar as propriedades químicas e físicas do endurecimento e fortalecimento do concreto em ambientes de microgravidade. Como, por exemplo, na Estação Espacial Internacional.
Na Terra e além
Um novo experimento, parte da missão Cosmic Kiss da Agência Espacial Europeia (ESA), tem como objetivo misturar concreto manualmente em microgravidade por meio do astronauta alemão Matthias Maurer, utilizando um instrumento de mistura com tamanho parecido com o de suas próprias mãos. Claro, o procedimento não deve gerar muito concreto, mas a amostra será suficiente para entender novos aspectos de seu comportamento em um local tão diferente do usual.
Os benefícios dos dados coletados são múltiplos. Isto é, podem resultar em mais informação para a ciência dos materiais, como no desenvolvimento de estratégias mais efetivas de mistura dos elementos que formam o concreto, bem como novas combinações de substâncias. Mas também, a longo prazo, em um maior entendimento do que é necessário para elevar edificações fora da Terra. É verdade que os componentes primários de formação do concreto não necessariamente terão muita disponibilidade na Lua ou em Marte, mas o desenvolvimento e estudo de materiais com propriedades similares será de muito interesse para futuras construções espaciais.Por isso, o experimento também lidará com material lunar sendo utilizado como matéria-prima do concreto testado.
Não é a primeira vez que esse tipo de experimento é realizado, sendo esse mesmo impulsionado por resultados de 2019 da NASA. Como tudo na ciência, porém, é importante testarmos muitas vezes, de formas iguais e diferentes. Ainda, talvez os resultados não sejam tão impressionantes como esperado. Mas, de qualquer jeito, é um passo a mais que damos na direção da ocupação e, quem sabe, da colonização de outros mundos.