Cientistas recriaram uma forma de vida misteriosa que poderia revelar as origens da vida complexa

Damares Alves

Em 2010 pesquisadores analisaram o DNA de um núcleo de sedimentos encontrado no fundo do Oceano Ártico e fizeram uma descoberta surpreendente. Descobriram uma forma de vida nunca vista antes, que pertence a um domínio chamado Archaea.

Archaea é a designação de um domínio de seres vivos que são morfologicamente semelhantes as bactérias, mas com características genética e biologicamente semelhantes a um domínio completamente diferente, os Eucariotos. Os cientistas batizaram a criatura de Lokiarchaeota.

Logo surgiu a pergunta, a amostra poderia ter sido contaminada por alguma outra coisa no núcleo?

Agora cientistas japoneses puderam finalmente responder a essa pergunta, eles conseguiram isolar a Lokiarchaeota e a cultivaram em laboratório.

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Isso significa que, pela primeira vez, os pesquisadores podem estudar e interagir de perto com a Lokiarchaeota viva, o que poderia nos ajudar a encontrar nossos primeiros ancestrais neste incrível planeta azul.

Os três domínios

A árvore da vida, em sua base, é dividida em três domínios:

Bacteria – micróbios unicelulares que não têm um núcleo ou organelas ligadas à membrana.

Eukarya – organismos cujas células têm núcleos e membranas. Esse domínio inclui seres humanos, animais, plantas e algas.

Archaea – são organismos muito parecidos com bactérias, na medida em que faltam núcleos e organelas ligadas a membranas, e circulam usando flagelos. Mas existem algumas diferenças importantes. Suas paredes celulares são feitas de material ligeiramente diferente. E o RNA deles é diferente o suficiente para separá-los na árvore filogenética.

Tres dominios

Outros espécimes

Depois da Lokiarchaeota, foram descobertas outros espécimes archaea que tinham características eucarióticas. Estes foram chamados Thorarchaeota, Odinarchaeota e Heimdallarchaeota – com intuito de seguir a mesma convenção de nomenclatura.

Coletivamente, eles são chamados Asgard archaea, alguns cientistas acreditam que eles podem ser a origem da vida eucariótica.

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Mas é difícil dizer sem estudar os organismos em detalhes isolados. 

Voltando aos cientistas japoneses

Os pesquisadores do japão recuperaram um núcleo de sedimentos do fundo do mar em Nankai Trough, a 2.533 metros  abaixo do nível do mar, em 2006.

Isso aconteceu muito antes que alguém soubesse sobre o Asgard archaea. Só mais tarde, uma análise de RNA de sua amostra rica revelou a presença de um organismo semelhante ao Lokiarchaeota.

Após coletar as amostras a equipe a cultivou cuidadosamente por cinco anos em um sistema de biorreator de fluxo contínuo alimentado com metano, projetado para imitar as condições de um duto de metano em águas profundas. Apesar de muito lentamente, os micróbios começaram a se multiplicar.

O próximo passo foi colocar amostras do biorreator em tubos de vidro com nutrientes para mantê-los alimentados e crescendo. E então eles aguardaram por mais um ano, finalmente começando a desenvolver uma população muito fraca de Lokiarchaeota.

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Depois, a equipe investiu ainda mais tempo em isolar e cultivar essa população de divisão tão lenta. Populações de bactérias comuns geralmente levam cerca de meia hora para dobrar. Lokiarchaeota levou 20 dias.

Ao todo, o experimento levou 12 anos. Os pesquisadores deram o nome de seu micróbio cultivadoPrometheoarchaeum syntrophicume depois o chamaram de Prometheus, o antigo mitológico grego Titã, que teve a reputação de criar humanos a partir do barro.

Muitas descobertas curiosas foram feitas. A primeira é que o prometheoarchaeum só cresceria na presença de um ou dois outros micróbios, o archaeon Methanogeniume a bactéria Halodesulfovibrio. Quando o Prometheoarchaeum decompõe aminoácidos em alimentos, produz hidrogênio, que os outros micróbios comem.

Se o hidrogênio tiver sido deixado, os experimentos revelaram que isso poderia prejudicar ainda mais o crescimento do Prometheoarchaeum, o que mostra que o archaea tem uma relação simbiótica com outros micróbios.

Quando o organismo foi examinado sob um microscópio eletrônico, ele revelou uma forma incomum para um archaeon – longos tentáculos brotando de seu corpo, dentro entre eles, micróbios parceiros se aninhavam.

Os pesquisadores supuseram que quando o oxigênio começou a aumentar na Terra, esse organismo poderia ter mudado para uma relação com bactérias que usavam oxigênio, aumentando suas chances de sobrevivência e estabelecendo o caminho para a vida eucariótica.

O sequenciamento de DNA revelou as características eucarióticas observadas em outras Archaea de Asgard.

Ainda há muita pesquisa a ser feita. O prometheoarchaeum pode ser bem diferente do archaea de bilhões de anos atrás. E também está longe de ser uma prova definitiva de que os eucariontes evoluíram de archaea.

A pesquisa está disponível no bioRxiv.

Outros artigos científicos referentes ao texto:

O artigo “Complex archaea that bridge the gap between prokaryotes and eukaryotes” foi publicado na Nature, e pode acessar aqui.

O artigo “Asgard archaea illuminate the origin of eukaryotic cellular complexity” foi publicado na Nature, e você pode acessar aqui.

FONTE / ScienceAlert

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