Em dezembro de 1831, Charles Darwin partiu na jornada histórica que o levaria a escrever A Origem das Espécies. Este foi um livro que não só iniciaria uma revolução científica, mas também seria responsável por mudar nossa percepção de humanidade e de nossa posição no mundo.
A publicação do livro em que Darwin sustentava a sua tese em 1859 alterou radicalmente a forma como o Mundo passaria a ser encarado pelo homem, em termos científicos, filosóficos e religiosos.
As ideias de Charles Darwin acabariam por encontrar muitas resistências na sociedade da sua época, uma vez que o texto expurgava o divino e a ideia bíblica do centro da criação do Homem. Incompreendida pela sociedade de meados do séc. XIX, a Teoria de Darwin seria confirmada por gerações vindouras de cientistas, se tornando uma das mais sólidas e respeitadas teorias científicas.
As ideias do naturalista britânico são hoje consensuais em quase todo o mundo, mas voltam a encontrar nova onda de inimigos que, em pleno século XXI, ganham fôlego para empunhar as bandeiras do criacionismo, particularmente nos Estados Unidos.
Para os sectores mais conservadores, século e meio depois, Charles Darwin continua a ser um alvo a abater, particularmente por defender que o ser humano tem no macaco um parente afastado e do qual evoluiu para a sua forma moderna.
Uma viagem para mudar o mundo
Nascido a 12 de fevereiro de 1809 no seio de uma família abastada que pertencia à elite cultural da época, Charles Darwin procura seguir os passos do pai na medicina.
Desistindo desse primeiro projeto por considerar a cirurgia uma prática muito violenta, ensaia ainda o caminho da Teologia e da via religiosa, chegando a concluir os estudos para prosseguir a vida clerical.
No entanto, a sua vocação, que se antevia desde muito jovem com a observação da vida animal, seria cimentada a bordo do HMS Beagle, o navio com o qual durante cinco anos Darwin explorou o planeta numa expedição que estaria na origem da alteração da maneira como se passaria a olhar o ser humano e o mundo.
Darwin teve a chance de se juntar a Robert Fitzroy, o capitão do recém-construído navio de dois mastros HMS Beagle em uma viagem a Tierra del Fuego na ponta da América do Sul. Fitzroy temia a solidão do comando e convidou Darwin a acompanhá-lo como naturalista do navio. Darwin levou a bordo armas e livros para a viagem e o Beagle partiu de Plymouth, no sul da Inglaterra, com uma equipe de 73 em 27 de dezembro de 1831.
A viagem não foi fácil, pois Darwin sofria de terrível enjoo; no entanto, as dificuldades físicas que ele teve que suportar foram compensadas pela incrível oportunidade para explorar o mundo a que ele foi apresentado. Como naturalista do navio, Darwin conseguiu deixar os limites do Beagle para perseguir seus próprios interesses e, como resultado, ao longo da viagem de cinco anos, ele apenas passou 18 meses a bordo do HMS Beagle.
Integrando a expedição como naturalista, a conselho de um professor de Cambridge, Darwin deixou o Reino Unido e durante cinco anos juntou fósseis, amostras geológicas e observou espécies vegetais e animais.
Ao verificar de perto os efeitos de terremotos e vulcões, Darwin entendeu como a Terra muda. O naturalista também encontrou fósseis de mamíferos extintos que o fariam questionar a fixidez das espécies, e ele percebeu que tanto os animais quanto os humanos devem competir pela sobrevivência.
A obra de Thomas Malthus, particularmente “An Essay on the Principle of Population” despertou interesse de Darwin. Malthus afirmava, grosso modo, que as populações tendem a crescer geometricamente a menos que sejam impedidas. Aí estava a resposta. Eram as alterações dos organismos vivos que permitiam que um indivíduo prosperasse, enquanto os outros que não sofriam essas alterações, pereceriam.
Darwin fez uma alteração fundamental nas ideias de Lamarck utilizando os exemplos das girafas. Segundo Lamarck, as girafas iam ficando com o pescoço comprido pela necessidade de se alcançar os galhos mais altos das árvores. Porém a mudança fundamental introduzida por Darwin é que as girafas não iam esticando o pescoço e sim que as de pescoço comprido sobreviveriam em maior número pela maior disponibilidade de alimento e por isso a característica “pescoço comprido” prosperaria em detrimento da característica “pescoço curto”!
A principal obra de Charles Darwin, “Sobre a Origem das Espécies por meio da Seleção Natural”, só foi publicada vinte depois de sua viagem com o Beagle, quando recebeu uma carta de outro naturalista inglês, Alfred Russel Wallace, que fez observações e chegou às mesmas conclusões. “Sobre a Origem das Espécies” foi originalmente publicado com 1250 exemplares (contendo 502 páginas cada) e essa primeira edição foi toda vendida em um único dia, em 24 de novembro de 1859.
No final da viagem, quando regressa a Inglaterra, a visão do naturalista sobre o mundo e a evolução das espécies era diferente. É por isso que Darwin prossegue as suas observações e estudos quase envolvido em secretismo. As novas ideias evolucionistas entravam em choque com a tradicional visão bíblica da criação então dominando na época, e esse choque se devia muito pela ideia defendida por Darwin de que o macaco era um parente afastado do ser humano.
Muitos anos depois da publicação do livro “A Origem das Espécies”, que dividiu opiniões e fez de Darwin um alvo preferencial da crítica à época, mesmo entre os seus pares, a moderna Teoria da Evolução das Espécies é amplamente aceita no meio científico. Isso se deve em parte por suas inúmeras comprovações à luz da engenharia genética e da ampla aplicação prática que a Teoria adquiriu em ciências como biologia, medicina, agronomia, zoologia, ecologia, veterinária, entre outras.
Dou graças a Deus e espero nunca mais visitar um país de escravos…
Charles Darwin, segundo o livro The Voyage of the Beagle, chapter XXI: “Mauritius To England” (second edition, 1845), pages 499-500.
Foi graças ao seu forte espírito científico que Charles Darwin prosseguiu com as investigações sobre a origem e evolução das espécies até o fim de sua vida, mesmo sendo o alvo preferido daqueles que o viam como um inimigo ao tirar o ser humano do centro do palco da criação divina.
A Teoria da Evolução das Espécies
Em 1859, Charles Darwin publicou o seu livro com a clássica teoria da evolução das espécies “Sobre a origem das espécies através da seleção natural ou a preservação de raças favorecidas na luta pela vida” (tradução do original “On the Origin of Species by Means of Natural Selection or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life”).
O processo de evolução proposto por Darwin assenta na ideia da seleção natural e é ainda hoje aceito como válido pela comunidade científica. Em termos de sistema teórico é aquele que, passados 159 anos da sua publicação, melhor explica a adaptação e especialização dos seres vivos aos seus habitats.
A seleção natural tem como conceito básico o fato de que características favoráveis hereditárias se tornarem comuns aos seres das gerações futuras de dada população de organismos, sendo que as características desfavoráveis tendem a desaparecer nesses seres ao longo das gerações.
A seleção natural evidenciada por Darwin age dessa forma no fenótipo (características que se podem ser vista e que traduzem o genótipo, a composição genética de um organismo vivo relativa a essas características) dos organismos. Sendo assim, indivíduos com fenótipos favoráveis têm maior probabilidade de sobreviver — e reproduzir — do que aqueles com fenótipos menos favoráveis. Ao se reproduzirem, deixarão descendes que carregarão o fenótipo favorável e que, novamente, terão maior probabilidade de sobrevir às pressões do meio, e, por fim, passará suas características para as gerações futuras.
Dessa forma, os genótipos associados aos fenótipos favoráveis aparecerão mais frequentemente na geração seguinte, pelo que, ao longo do tempo, o processo resulta em adaptações que especializarão os diversos organismos em sistemas ecológicos particulares.
As características acabam por ser preservadas devido à vantagem seletiva que conferem aos indivíduos que as possuem, permitindo que esses indivíduos tenham mais descendentes que os indivíduos sem essas características e, portanto, menos aptos a resistirem e deixarem descendentes.
Impossível falar em Charles Darwin e não citar outro naturalista inglês: Alfred Russel Wallace. Contemporâneo de Darwin, Wallace tem um trajetória de vida que guarda alguns aspectos de semelhança com do próprio Darwin. Wallace também esteve viajando pelo mundo, primeiro ao Brasil e depois à Indonésia, coletando informações sobre os seres vivos. Contudo, diferentemente de Darwin, Wallace vinha de uma família pobre, tinha o mesmo sonho de descobrir a resposta para origem das espécies, mas não tinha condições de bancar a sua expedição. Ele teve, então, uma ideia: “aproveitar a expedição para coletar e vender na Europa alguns animais e plantas, o que lhe serviria de sustento durante a pesquisa”, escreve Catarina Chagas, editora da CHC online.
Por volta 1856, ele estava gradualmente trazendo seus amigos para aceitar a evolução como um processo, mas estava longe de convencê-los sobre o mecanismo, quando a entrada de Wallace na discussão trouxe uma nova urgência à publicação.
Em 1858 Wallace escreve a Darwin sobre suas ideias. Darwin vinha, após coletar materiais e informações dos lugares por onde havia passado, mantendo suas ideias em segredo. Até essa época Darwin só havia publicado dois ensaios. Podemos creditar os dois como pais do Evolucionismo.
Darwin no Brasil
Darwin passou cerca de cinco meses no Brasil o naturalista conheceu Fernando de Noronha, em 20 de fevereiro de 1832, Rio de Janeiro, de 04 abril de 1832 a 05 de julho de 1832, e Salvador em 01º de agosto de 1836, e ficou encantado com a exuberância da floresta tropical, mas horrorizado com a escravidão e a violência contra os escravos.
No Brasil, Darwin testemunhou a escravidão e ponderou o quão sustentável seria o sistema, observando em seu diário: “Se os negros livres aumentam em números (como irão) e ficam descontentes ao não serem iguais aos homens brancos, a época da libertação geral não estaria muito distante”.
Em 1836, em Salvador, chegou a conhecer o Carnaval, mas preferiu ficar na tranquilidade do Beagle. No Rio, andou pela Floresta da Tijuca, foi ao Jardim Botânico e ao Pão de Açúcar e coletou centenas de plantas e insetos. Em seus diários, fez anotações sobre “a falta de educação dos brasileiros e da facilidade em se obter vantagens através do suborno”, escreveu Carlos Ferreira para o portal IG.
Outras referências
Understanding Evolution – The History of Evolutionary Thought (em inglês). Universidade de Berkeley;
Darwin no Brasil, UFMG;
Dois pais de uma Teoria. Ciência Hoje das Crianças;
Evolucionismo de Darwin, por Priscilla Moniz, professora de Biologia do Colégio Qi;
O que Charles Darwin viu no Brasil, por Deutsche Welle (DW) Brasil;