A ‘Grande Morte’, ocorrida há 252 milhões de anos, foi iniciada por “mega El Niños”. Poderia acontecer de novo?

Milena Elísios
Imagem: Julio Lacerda

A extinção em massa do Permiano-Triássico, afetuosamente apelidada de “Grande Morte” pelos cientistas, é um evento de gelar a espinha na história do nosso planeta. Imagine um mundo onde 90% da vida marinha e 75% da vida terrestre foram extintas. Esta não é uma cena de um filme de desastre, mas sim a realidade brutal que se desenrolou há aproximadamente 252 milhões de anos.

Embora os cientistas soubessem que um aumento acentuado na temperatura global, causado por intensas erupções vulcânicas na Sibéria, foi o provável gatilho, a verdadeira extensão da calamidade permaneceu um mistério.

Como coloca o paleontólogo David Bond, da Universidade de Hull, na Inglaterra, “temos esse aquecimento global intenso, mas temos outros episódios de aquecimento global no registro geológico que não causam nada tão ruim aos ecossistemas como este”.

Oscilações climáticas de curto prazo

Uma nova pesquisa publicada na Science lança luz sobre este enigma, sugerindo que os “mega El Niños” – eventos climáticos extremos semelhantes ao El Niño-Oscilação Sul (ENOS) que experimentamos hoje – desempenharam um papel significativo na amplificação do impacto das erupções vulcânicas.

Mas como essas oscilações climáticas de curto prazo conseguiram causar tanto caos?

Para entender isso, precisamos primeiro entender como o ENOS funciona no nosso clima atual. O ENOS é um padrão climático que se origina no Oceano Pacífico tropical, causando um aquecimento periódico das águas superficiais. Este aquecimento tem efeitos de longo alcance, provocando secas em algumas regiões, inundações em outras e até influenciando a temporada de furacões no Atlântico.

Agora, imagine um El Niño em uma escala muito maior, com oscilações climáticas durando não apenas um ano, mas quase uma década.

É isso que os pesquisadores acreditam que aconteceu durante o final do Permiano.

Reconstruindo o passado climático da Terra

Uma equipe internacional de cientistas se propôs a reconstruir os padrões climáticos que prevaleciam há mais de 250 milhões de anos. Usando uma combinação de dados de temperatura da água do mar (obtidos a partir de fósseis de conodontes, antigos animais semelhantes a peixes), simulações de computador e um conhecimento mais preciso da localização dos continentes e bacias oceânicas da época, a equipe conseguiu montar um quadro mais completo do clima durante o Grande Morte.

Suas descobertas são alarmantes, mas não totalmente inesperadas.

À medida que os níveis de dióxido de carbono (CO2) dispararam de 410 para 860 partes por milhão (ppm) – em comparação, os níveis atuais de CO2 estão em torno de 422 ppm – e as temperaturas globais aumentaram, os períodos de aquecimento semelhantes ao El Niño, originados principalmente no vasto oceano Panthalassa do final do Permiano, se tornaram mais intensos e prolongados.

O resultado?

Um ciclo de retroalimentação climática devastador.

Um ciclo vicioso de aquecimento e extinção

As florestas, que desempenham um papel fundamental na absorção de CO2 da atmosfera, foram devastadas pelo calor extremo e morreram. Com menos árvores para absorver os gases de efeito estufa, mais CO2 permaneceu na atmosfera, exacerbando o aquecimento global.

“Você tem mais aquecimento, mais morte da vegetação, El Niños mais fortes, temperaturas mais altas globalmente, extremos climáticos mais altos novamente, levando a mais morte”, explica Alexander Farnsworth, modelador paleoclimático da Universidade de Bristol, na Inglaterra, e um dos líderes do estudo.

Grandes extensões do planeta oscilaram entre calor escaldante, seca e incêndios florestais, seguidos por inundações catastróficas. O calor sufocante acabou invadindo até mesmo as latitudes mais altas, deixando poucas vias de escape para as espécies em um planeta cada vez mais hostil.

“Ficou muito quente em todos os lugares, e é por isso que [as espécies] não podiam simplesmente migrar para o norte e para o sul”, observa Bond.

Diante de tais mudanças ambientais rápidas e extremas, a maioria das espécies simplesmente não conseguiu se adaptar, levando a uma das maiores extinções em massa da história da Terra.

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