UFMG cria pastilha larvicida para eliminar Aedes aegypti em bueiros

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A nova pastilha criada na UFMG reduz proliferação de larvas do mosquito da dengue em ambientes inóspitos, como bueiros e ralos.

Pesquisadores do Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) em parceria com o Campus de Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) criaram uma solução barata capaz de eliminar larvas e ovos do mosquito Aedes aegypti, o transmissor de doenças como febre amarela, chikungunya e dengue.

Como já é sabido dos pesquisadores há bastante tempo, o Aedes aegypti é capaz de colocar suas larvas mesmo em águas extremamente sujas, como as de ralos e bueiros. E para esse tipo ambiente inóspito que se volta a nova tecnologia. Trata-se de um larvicida feito de uma pastilha de cerâmica tratada quimicamente e que foi desenvolvida pela equipe de pesquisadores coordenada pelo professor Dr. Jadson Belchior, do Departamento de Química. Em testes no campus de Saúde da UFMG, o larvicida reduziu em mais de 80% a população do mosquito transmissor daquelas graves enfermidades e também do zika vírus, o causador do surto de microcefalia em recém-nascidos em 2015.

Os estudos do grupo de cientistas tiveram início em 2018 e no final de 2019 chegou à versão final para os testes. Mas os resultados da eficácia do novo método foram aferidos em outro projeto de pesquisa da universidade. Desenvolvido pelo Departamento de Gestão Ambiental (DGA) em parceria com o Laboratório de Inovação e Empreendedorismo em Controle de Vetores (Lintec), o projeto Controle de Aedes na UFMG permitiu a verificação da eficácia da nova técnica e foi orientado pelo professor Álvaro Eduardo Eiras, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

Ativação em água

As pastilhas, que têm como suporte uma cerâmica, é previamente impregnada com moléculas nocivas às larvas do Aedes aegypti, mas em uma concentração que não faz mal ao ser humano. O produto larvicida é liberado de forma lenta e controlada, depois de entrar em contato com a água, por cerca de seis a sete semanas.

O produto químico na peça de cerâmica é capaz de inibir o desenvolvimento dos ovos para a fase larvária, impedindo-os de eclodir ou matando as possíveis larvas do vetor que conseguirem eclodir. Assim, o processo reduz drasticamente a proliferação dos mosquitos em locais inóspitos como bueiros, bocas de lobo, sifões de pias e ralos. A tecnologia também consegue eliminar larvas e ovos de outros mosquitos, como o vetor da malária e febre amarela, e inibe a proliferação de escorpiões e baratas, afastando-os dos locais onde o larvicida é depositado.

Segundo informa a Assessoria de Imprensa da UFMG, a nova arma no combate ao A. aegypti foi criado para atender demanda do campus da própria instituição, que tem nos bueiros o principal foco de proliferação desses vetores. Esse comportamento foge do habitual, uma vez que o Aedes aegypti costuma depositar ovos em recipientes com água limpa. “Nas unidades do campus, os vasinhos de plantas foram reduzidos. O mosquito provavelmente está fora dos prédios e migrando para dentro. Os bueiros acumulam água parada e nutrientes gerados por folhas secas. E é justamente disso que os ovos precisam para virar larvas”, detalha Belchior.

Belchior explica ainda que a pastilha foi criada com base em outra tecnologia também desenvolvida sob sua coordenação, em parceria com a empresa Vértica Tecnologia e Inovação Ltda., e já patenteada pela UFMG em 2013. “Reestruturamos o projeto que tínhamos de tijolos para água potável e com substância atóxica e fotocatalítica, isto é, ativada pela radiação solar. Com base nessa experiência, propusemos outro dispositivo de liberação controlada e que não precisa de luz, apenas da presença de água para ser ativado”, conta.

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Os kits com os tijolinos (ou pastilhas) larvicidas foram colocadas em bueiros e ralos no Campus da Saúde da UFMG. A nova tecnologia possui baixíssimo custo. Foto: Divulgação UFMG.

Custo e eficácia

O controle a partir de armadilhas espalhadas pelo campus para captura em Aedes aegypti permitiu medir uma redução de 64 para 13 desses insetos nos períodos em que o dispositivo estava em uso. “Constatamos que, de fato, ao combater as larvas, que sabemos onde estão, reduzimos a população dos mosquitos, que são de controle mais difícil”, analisou Belchior junto ao jornal O Tempo. Colocados de forma a ter contato com o nível de água quando o bueiro ou ralo enchia, o larvicida presente na pastilha era liberado progressivamente na água. Quando o produto, que foi instalado em 85 bueiros do campus Saúde, teve sua eficácia reduzida houve um maior número de vetores capturados, demonstram os dados de monitoramento por captura dos mosquitos.

O pequeno pacote com cinco pastilhas (ou tijolos) de cerâmica tratadas quimicamente com material larvicida custa cerca de R$ 1,00. Segundo Belchior, que também é professor do Departamento de Química da universidade, um pacote com as cinco pastilhas deve ser usado em cada bueiro, boca de lobo ou ralo. O grupo de pesquisadores agora busca viabilizar a colocação desses sachês em cerca de 1.500 bueiros do campus Pampulha, localizado no centro da capital mineira “Estamos na expectativa de que o poder público e a iniciativa privada nos procurem para que possamos disponibilizar essa tecnologia”, diz. “Se isso acontecer, teremos condição de colocar isso no mercado muito rápido”, explicou o professor ao O Tempo.

“Os dois projetos se complementam. Monitorar milhares de bueiros é complicado, e os tijolos ajudam a combater criadores em locais que acumulam água de chuva. E conseguimos acompanhar a efetividade dos tijolos com a captura dos mosquitos”, enfatiza o diretor do DGA, Tulio Vono Siqueira.

Epidemia

Segundo informações do Ministério da Saúde, em 2019 (até 24 de agosto), foram registrados 1.439.471 de casos de dengue em todo o país, com crescimento de 599,5% em relação ao mesmo período de 2018 (205.791). A taxa de incidência, que considera a proporção de casos por habitantes, é de 690,4 casos/100 mil habitantes. Entre os estados com casos, destacam-se Minas Gerais, Goiás, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal. Com relação ao número de óbitos, foram confirmadas 591 mortes.

Os casos da febre chikungunya chegaram a 110.627 em relação ao mesmo período do ano passado, 76.742, ou seja 44,2% de aumento no ano passado, quando foram confirmados laboratorialmente 57 óbitos em decorrência da doença. A taxa de incidência foi de 53,1 casos/100 mil habitantes. Entre os estados com casos, destacam-se Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte.Já os casos de zika apresentaram aumento de 47,1% em 2019, quando foram registrados 9.813 casos, enquanto em 2018 foram 6.669 o que representa uma taxa de incidência de 4,7 casos/100 mil habitantes. Entre os estados com casos, destacam-se Tocantins, Rio Grande do Norte, Alagoas e Espírito Santo. Foram confirmados dois óbitos por zika. O dados levaram o governo federal a lançar a campanha de combate ao Aedes aegypti com o slogan “E você? Já combateu o mosquito hoje? A mudança começa por você”. Agora, é esperar para que a nova medida de combate ao mosquito renda frutos em todo o país.

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