Fungos podem ser a solução para absorver radiação cósmica em viagens espaciais

Jônatas Ribeiro
Imagem: Wikimedia Commons/ Yakuzakorat

As viagens espaciais são uma constante ao falar da fronteira da ciência e tecnologia desde o século XX. O mesmo vale para os estudos da radiação, sobretudo depois da descoberta da radioatividade. Mas há ainda mais tempo, o homem já ia ao espaço em obras de ficção científica. Essa, aliás, foi muitas vezes bem-sucedida em prever certos avanços e acontecimentos posteriores. Um bom exemplo é Júlio Verne, com seu romance “Da Terra à Lua”, de 1865. É, sem dúvida, impressionante como um homem do século XIX pôde, de certa forma, visualizar os foguetes e viagens que só ocorreriam 100 anos depois. Ainda assim, na época, não se conhecia boa parte da ciência que conhecemos hoje. E, portanto, não havia como conhecer alguns tipos específicos de problema que poderíamos ter em trajetos assim.

De fato, fomos ao espaço e fomos até mesmo à Lua. E com a experiência que adquirimos, resolvemos parte dos problemas. Agora, com os anúncios de planos para viagem a Marte (e até mesmo colonização) e novas empreitadas para levar o homem aos céus, vemos uma retomada do setor aeroespacial em tempos modernos. E novas ambições e tecnologias, claro, levam a novas soluções, mas também a novos problemas. Ou mesmo a adaptações ou novos contextos para problemas antigos. Como, por exemplo, no caso da relação entre radiação cósmica e viagens espaciais.

Radiação no espaço

magnetosfera da terra interagindo com radiação
Imagem: koya979 / Shutterstock.com

A radiação cósmica pode se dar de muitas formas. Isto é, pode ser originada dos comuns ventos solares, mas também de mais intensas explosões em nossa estrela. Além disso, partículas de alta energia podem vir de várias partes do universo. O importante, contudo, é que, aqui na Terra, estamos protegidos da maior parte dos raios que poderiam ser prejudiciais à nossa saúde. Explosões solares podem afetar nossas telecomunicações, é verdade. E também são a causa das auroras austrais e boreais. Porém, em termos de nossa sobrevivência, nosso planeta tem um escudo natural para nos proteger. Isto é, a magnetosfera terrestre, um envoltório permeado de campo magnético, em que este interage e manipula o fluxo de partículas carregadas em nossa direção.

Para astronautas na Estação Espacial Internacional, a pouco mais de 400 km acima da superfície terrestre, a radiação é mais sentido. O magnetismo de nosso planeta, porém, ainda pode protegê-los por certo tempo. Mas a situação é diferente para viagens à Lua, por exemplo. Já estivemos lá, é verdade. Contudo, haveria grande diferença entre a exposição a raios cósmicos em viagens espaciais curtas, como foi a Apollo 11, e uma presença mais prolongada de astronautas por lá. E a preocupação será ainda mais relevante quando formos para Marte. Esses viajantes, certamente, terão que levar ferramentas para se proteger da radiação. Ou então, como indica uma pesquisa recente, talvez cultivá-las.

Criando fungos no espaço

fungo absorvedor de radiação Cladosporium sphaerospermum
Imagem: Wikimedia Commons, Medmyco

O trabalho em questão, cujo manuscrito foi publicado no BioRxiv, estuda um tipo especial de fungo que pode crescer em ambientes com alta radiação. Os Cladosporium sphaerospermum não apenas bloqueiam radiação, mas também reaproveitam sua energia em seu próprio ciclo de desenvolvimento. Esse processo, por sinal tem nome: radiossíntese. Afinal, é similar à fotossíntese que as plantas realizam com a luz do sol. Já se conhece o comportamento desses fungos na Terra, tendo eles sobrevivido até mesmo nos arredores de Chernobyl. Por isso, o próximo passo foi enviar alguns fungos para a Estação Espacial Internacional e comparar a absorção de radiação por lá em amostras com e sem os organismos.

Os resultados foram importantes. Por trás de uma camada de amostra de menos de dois milímetros de profundidade contendo fungos, os níveis de radiação se mostraram menores. Além disso, os próprios fungos cresceram a um ritmo 21% mais rápido. Ou seja, se usados para absorção de radiação, durante o processo, os organismos podem crescer e se tornar ainda mais efetivos em sua tarefa. Para viagens espaciais, contudo, é prudente não se empolgar demais. Em Marte, para criarmos um ambiente similar à Terra, precisaríamos de uma camada de fungos de mais de dois metros de profundidade. Assim, medidas mais comuns para bloquear a radiação, como trajes protetores, podem ser priorizadas num futuro próximo. Não deixa de ser interessante, porém, pensar que podemos ter uma solução de caráter biológico para um problema histórico da física e engenharia.

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