A Terra tem uma nova lua e é do tamanho de um carro

SoCientífica

A Terra tem um novo satélite natural – mas ele é temporário.

Os astrônomos do Centro de Planetas Menores da União Astronômica Internacional (MPC, na sigla em inglês)  anunciaram ontem (26) que o nosso planeta tem uma nova lua, pequenina e temporária. O objeto foi detectado no dia 15 deste mês por astrônomos do Catalina Sky Survey, com base em Tucson, no Arizona, Estados Unidos.

Em uma circula eletrônica do MPC, de 25 de fevereiro de 2020, os astrônomos escreveram que várias observações confirmaram. “Este objeto está temporariamente ligado à Terra. Nenhuma evidência de perturbação devido à pressão da radiação solar é vista, e nenhuma conexão com um outro objeto artificial conhecido foi encontrada. Outras observações e estudos dinâmicos são fortemente encorajados”, relatou a nota circular do MPC, um comunicado oficial a todos os astrônomos do mundo.

Após a descoberta do 2020 CD3 em 15 de fevereiro mais de 30 observações foram feitas sobre o objeto até 17 de fevereiro, segundo o caçador de asteroides e cometas Kacper Wierzchos, um de seus descobridores do objeto juntamente com o astrônomo Theodore Pruyne. Essas observações foram necessárias para refinar uma órbita do objeto e confirmar que ele parece estar orbitando a Terra.

https://twitter.com/i/status/1232460436634656769
“A Terra tem um novo objeto capturado temporariamente / Possível minilua chamado 2020 CD3, escreveu o astrônomo K. Wierzcos, do Catalina Sky Survey, em uma thread no Twitter. “Na noite de 15 de fevereiro, meu colega de equipe do Catalina Sky Survey, Teddy Pruyne e eu, encontramos um objeto de magnitude 20. Aqui estão as imagens da descoberta”, postou.

O novo satélite natural temporário é muito pequeno e apagado. A luz solar refletida ajuda a fornecer uma estimativa do seu diâmetro, que é calculado em cerca de 1,9 a 3,5 metros com os dados disponíveis até o momento, mas isso pode mudar facilmente conforme novas medições vão sendo feitas. Ainda assim o 2020 CD3 é muito pequeno, uma rocha espacial de composição carbonácea. Contudo, é incrível que os astrônomos possam identificar algo tão pequeno em órbita da Terra.

Muitas das informações que temos neste momento sobre o objeto vêm do astrônomo Wierzchos, que está publicando ativamente sobre ele em uma rede social. Você pode acompanha-lo em @WierzchosKacper pelo Twitter.

Aparentemente, os astrônomos estavam adiando um pouco falar abertamente sobre a detecção desse novo objeto até que houvesse a confirmação e publicação da descoberta pela União Astronômica Internacional, uma sociedade científica que congrega astrônomos profissionais de diversos países. Mas agora, com a publicação da nota circular do Minor Planet Center, a organização que opera Observatório Astrofísico Smithsonian e que é parte do Centro para Astrofísica (CfA na sigla em inglês), junto com observatórios renomados no mundo todo, como o Observatório da Faculdade de Harvard, (Harvard College Observatory, HCO), os astrônomos estão falando tudo que sabem – já que nenhum pesquisador em sã consciência quer por sua carreira acadêmica em risco em anunciar algo que venha a ser descoberto como errado pelos pares posteriormente.

Segundo as simulações computacionais da órbita de 2020 CD3 divulgadas por Wierzchos, o novo companheiro de órbita da Terra em breve nos deixará (veja imagem abaixo). Foi essa mesma simulação orbital de 2020 CD3 quer permitiu aos astrônomos estimar que o objeto está entre nós há pelo menos três anos – segundo a simulação por computador da órbita do objeto, ele está por aqui desde o final de 2017. “O objeto acaba de ser anunciado pelo MPC e sua órbita mostra que ele entrou na órbita da Terra há três anos”, escreveu Wierzchos.

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Um diagrama da órbita de 2020 CD3 criada com um simulador de órbita computacional elaborado pelo astrônomo Tony Dunn e divulgado por Wierzchos.

Segunda vez

Esta não é a primeira vez que os astrônomos descobrem um satélite natural que não a Lua em órbita da Terra. A bem da verdade é a segunda vez. O primeiro objeto que circulou por aqui foi o 2006 RH120. Descoberto em 2006, como o próprio nome já deixa claro, pelo mesmo observatório que descobriu a “lua temporária” de 2020, esse primeiro objeto era um asteroide e tinha cerca de 4,0m de diâmetro e rondou por aqui até julho de 2007 antes de partir para sua jornada errante pelo espaço.

A região do espaço próxima à Terra é um lugar relativamente movimentado, cheios de asteroides passando rapidamente, um grupo conhecido entre os astrônomos como NEO’s (sigla para Near-Earth Object, ou, Objeto Próximo da Terra). Os números precisos, no entanto, não são claros; as estimativas colocam o número de asteroides vizinhos como em milhões, mas em 25 de fevereiro deste ano o número de NEO’s descobertos era de apenas 22.211. Essa dificuldade de estabelecer um número ocorre porque essa classe de corpos celestes são realmente pequenos, não sabemos onde eles estão (por isso não sabemos para onde olhar), e eles geralmente não são bons em refletir a luz do sol.

Temporários

É de se pensar, no entanto, que com tantas rochas voando ao nosso redor elas seriam atraídas pela gravidade da Terra o tempo todo. Bem, isso acontece, mas a maioria delas não fica tempo suficiente para se tornar “miniluas”.

Para essas rochas espaciais capturadas pela gravidade terrestre existem dois destinos. Ou elas se dirigem diretamente para a atmosfera, onde são queimadas na entrada, tornando-se espetaculares bolas de fogo ou eles percorrem uma órbita irregular antes de a velocidade delas as jogar para frente e para cima, saindo para uma rota incerta na escuridão do espaço. Esse é o destino de 2020 CD3, que assim como o 2006 RH120 logo partirá.

De partida

Contudo, essa captura e transformação em “minilua temporária” acontece com um pequeno número de rochas espaciais. De acordo com uma simulação feita com um supercomputador em 2012, que incluía dez milhões de asteroides virtuais, apenas 18.000 foram capturados na órbita da Terra. Isso dá ínfima proporção de 0,18%, portanto. Portanto, esses asteroides não são apenas difíceis de serem detectados, eles são super-raros.

Houve vários candidatos a miniluas, incluindo duas bolas de fogo com velocidades lentas que implicavam uma origem orbital, mas apenas uma confirmada – o objeto 2006 RH120. Um outro corpo em potencial para uma “minilua” ficou identificado por 469219 Kamoʻoalewa (teve a designação provisória de 2016 HO3), que posteriormente foi descoberto estar em órbita do Sol e perto da Terra e com um tipo de órbita em ressonância com a nossa, o que faz dele, portanto, um quasi-satélite da Terra. (Um quasi-satélite é tipo especial de objeto espacial que tem sua órbita em sincronia com a órbita de um planeta).

“Aqui está um da nossa nova minilua 2020 CD3, descoberto por @WierzchosKacper”, diz a legenda da publicação do astrofísico Tony Dunn em sua conta no Twitter.

Conhecer a composição e rota de corpos como esses não é apenas um passa tempo de astrônomo. Além de medida de segurança para a própria Terra, já que pesquisas deste tipo pode resultar em aparelhos e técnicas mais confiáveis, o que poderia possibilitar a descoberta futura de corpos em rota de colisão com a Terra, pode-se dizer que a composição de asteroides que nos visitam regularmente, como o 2006 RH120, pode ter fins mais práticos. Isso por que a mineração de rochas espaciais no futuro é possibilidade interessante, e que pode se tornar realidade à medida que a robótica se desenvolver a níveis que permitam a um exército de robôs explorar uma dessas rochas. E os NEO’s são provavelmente os alvos mais promissores alvos dessa empreitada.Apesar da torcida de muitos, contudo, não é dessa vez que vamos ganhar uma segunda lua. Isso por que o 2020 CD3 já está de partida. Segunda aquela mesma simulação da órbita do objeto que permitiu dizer quando ele chegou aos nossos arredores (basta rodar a simulação ao contrário que se tem esse dado), essa mesma simulação calculou que até meados de abril deste ano ele estará de partida. (A simulação pode ser vista clicando aqui.)

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