Uso de fezes e urina humanas para cultivar vegetais é seguro, revelam estudos

Elisson Amboni
Imagem: Jacob Fenston/WAMU

Imagine um mundo em que um dos subprodutos mais abundantes da vida humana, as fezes e urina, não seja apenas reciclado, mas usado para nutrir nossas plantações. Em um estudo inovador realizado no Leibniz Institute of Vegetable and Ornamental Crops, na Alemanha, os pesquisadores descobriram que os fertilizantes derivados de resíduos humanos tratados são tão benéficos para as plantas quanto os tradicionais.

A princípio, a ideia pode causar estranheza, mas considere o seguinte: nossos resíduos são uma fonte rica de nutrientes essenciais para as plantas, como nitrogênio e fósforo. No entanto, há preocupações válidas sobre possíveis patógenos e parasitas causadores de doenças. A resposta? Processos de tratamento adequados. O estudo, publicado na Frontiers in Environmental Science, mostrou que, após o tratamento dos resíduos, eles não representavam nenhum risco em relação à transmissão de patógenos ou produtos farmacêuticos nocivos.

Resultados que falam por si mesmos

Por meio de testes comparativos em plantações de repolho, a equipe constatou que os rendimentos com o uso desses fertilizantes não convencionais eram iguais aos da vinhaça, um subproduto da produção de etanol. De fato, algumas combinações até sugeriram possíveis benefícios para a saúde do solo a longo prazo devido ao aumento do teor de carbono.

Preocupado com o consumo de produtos farmacêuticos com seu repolho? O estudo detectou apenas dois medicamentos nas partes comestíveis da cultura: ibuprofeno e carbamazepina. No entanto, as concentrações eram tão minúsculas que seria necessário devorar meio milhão de repolhos para ingerir uma única dose.

“Os fertilizantes derivados de humanos são viáveis e seguros para o cultivo de repolho”, diz a pesquisadora Franziska Häfner. “Eles oferecem rendimentos semelhantes aos dos fertilizantes convencionais, sem nenhum risco de transmissão de patógenos ou produtos farmacêuticos.”

As descobertas da equipe sugerem que até um quarto dos fertilizantes minerais sintéticos na Alemanha poderia ser substituído por esses produtos reciclados, se devidamente preparados e com controle de qualidade. Essa tendência já está criando raízes na Áustria, na Suíça e em Liechtenstein, onde um desses produtos, o Aurin, foi aprovado para uso agrícola.

Superando o medo

O desafio permanece: como superar nossa aversão ao uso de resíduos humanos na agricultura? Benjamin Wilde, da ETH Zurich, enfrentou esse obstáculo em seus testes de campo na África do Sul. Mas após longas discussões e demonstrações práticas, os agricultores perceberam os benefícios. “Os agricultores são pessoas muito práticas quando percebem que algo funciona”, observa Wilde.

Como a escassez de fertilizantes continua a elevar os preços dos alimentos, essa pesquisa aponta para uma solução inovadora e sustentável. Com bilhões de pessoas em nosso planeta, os fertilizantes derivados de seres humanos podem ser um divisor de águas na agricultura – se conseguirmos superar nossa relutância.

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