Pesquisadores recuperam DNA de múmias conservado em ‘cola de piolhos’

Mateus Marchetto
Imagem: Gilles San Martin / Wikipedia Commons

Pesquisadores se aproveitaram de uma estratégia de parasitismo de piolhos para recuperar o DNA de múmias de mais de 2.000 anos na Argentina. Os cientistas usaram a ‘cola de piolhos’, que se forma ao redor de seus ovos, para sequenciar e identificar o material genético.

Os piolhos são pequenos insetos que podem parasitar tanto aves quanto mamíferos. Em geral, os piolhos sobrevivem se alimentando do sangue retirado da pele de seus hospedeiros. Quando as condições são favoráveis, os piolhos põem suas lêndeas, que são pequenos ovos.

Contudo, as fêmeas precisam prender as lêndeas ao cabelo do hospedeiro para evitar que os filhotes se percam por aí. Para tanto, estes insetos usam um cimento biológico, uma espécie de cola de piolhos para prender os ovos ao cabelo.

Segundo a nova pesquisa, publicada no periódico Molecular Biology and Evolution, a cola de piolhos não só se conservou ao longo de milhares de anos, mas também conservou núcleos de células humanas.

Estes piolhos, vale comentar, pertenceram a um grupo de pessoas mumificadas pelo frio na Cordilheira dos Andes, na Argentina. Após o sequenciamento do material genético, os cientistas puderam concluir que estas pessoas viveram entre 1.500 e 2.000 anos e provavelmente migraram da Colômbia ou Venezuela para a Argentina.

Lice Head
Lêndea presa ao cabelo (esquerda) e piolho adulto. Imagem: BruceBlaus / Wikipedia Commons

A cola de piolhos pode ser um recurso revolucionário da arqueologia

Os ectoparasitas de seres humanos eram amplamente abundantes e difíceis de se livrar mesmo há poucas décadas atrás. Há milhares de anos, nesse sentido, estes parasitas superficiais eram onipresentes nas populações humanas.

Muitas descobertas arqueológicas, inclusive, estão repletas de piolhos, carrapatos e traças. Pesquisadores usaram estes animais mumificados anteriormente para traçar a linha do tempo do surgimento das roupas em comunidades humanas (já que roupas também podem acabar infestadas pelos parasitas).

Agora os autores da nova pesquisa não só puderam sequenciar o genoma dos piolhos mumificados, mas também de seus hospedeiros, já que muitas células ficaram conservadas na cola de piolhos presente nos ovos.

Ambos genomas, de piolhos e humanos, indicam de fato uma migração de áreas tropicais para os Andes. Ademais, a posição dos ovos no cabelo, mais próximos à raiz, indica que as temperaturas eram possivelmente muito frias na época da morte destas múmias. A temperatura pode ter sido, aliás, a causa da morte.

De acordo com o artigo, a cola das lêndeas pode conservar DNA de qualidade tão alta quanto aquele encontrado na arcada dentária fossilizada. Ainda, esse material genético tem qualidade muito mais alta do que aquele coletado diretamente no interior do crânio – de forma mais invasiva aos resquícios dos indivíduos.

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