Cientistas revelam imagem do buraco negro da Via Láctea

Dominic Albuquerque
A primeira imagem do buraco negro da Via Láctea. Imagem: Event Horizon Telescope Collaboration

A cerca de 27.000 anos-luz localiza-se um objeto astrofísico imenso, 4 milhões de vezes a massa do nosso Sol, rodeado por gases rodopiantes extremamente quentes. A existência desse buraco negro supermassivo chamado Sagittarius A* foi teorizada por décadas a medida que astrônomos observavam estrelas orbitando um compacto invisível e de tamanho massivo no centro da Via Láctea.

Até então, ninguém tinha visto o que era aquilo, ou como ele era. Agora, os cientistas finalmente conseguiram uma imagem do buraco negro da Via Láctea

Os astrônomos exibiram a imagem numa conferência de imprensa. “Nós finalmente tivemos um vislumbre do nosso próprio buraco negro”, disse Angelo Ricarte, um colaborador do EHT e astrofísico do Center for Astrophysics, Harvard & Smithsonian, numa entrevista. “Um melhor entendimento desse buraco negro no centro da nossa galáxia vai nos ajudar a entender a história da nossa origem cósmica”.

O anúncio representa o trabalho de mais de 300 pesquisadores em 80 instituições por todo o globo, que usaram uma rede de telescópios para criar um observatório a nível mundial conhecido como o Event Horizon Telescope (EHT).

“Nosso telescópio tinha que ser quase tão grande quanto a Terra”, disse Vincent Fish, um astrônomo do Haystack Observatory do MIT. Para fazer isso, a equipe conectou mais de uma dúzia de telescópios ao redor do globo usando uma técnica chamada interferometria.

“Ao correlacionar os sinais e estudar os dados resultantes, conseguimos reconstruir as imagens da fonte. Quanto mais telescópios, melhor”.

A imagem do buraco negro da Via Láctea

A imagem permite uma visão melhor acerca dos mistérios em torno dos buracos negros, e confirma a teoria da relatividade de Einstein. Apesar do nome, o buraco negro supermassivo no centro da nossa galáxia é bem pequeno quando visto da Terra.

“É como olhar para uma bola de tênis na Lua”, disse o cosmólogo James Cooney, da Universidade Central da Flórida.

As observações da rede do telescópio EHT geraram 3.5 petabytes de dados, equivalentes a 100 milhões de vídeos de TikTok. Eles foram combinados com o uso de um sofisticado algoritmo de computador.

Eram tantos dados que demoraria anos para transmiti-los pela internet, então a equipe enviou os discos rígidos para diferentes partes do mundo para que a análise fosse feita.

Como os buracos negros puxam tudo ao seu redor, inclusive a luz, as imagens não são como numa fotografia tradicional. Ao invés disso, são imagens da sombra do buraco negro. Como o material superaquecido rodopia em torno do buraco negro, ele brilha e se ilumina. O buraco negro então forma uma sombra nesse gás.

A equipe teve certos desafios, como observar o buraco negro através da atmosfera terrestre e dos gases turbulentos da galáxia. Pesquisadores do EHT coletaram dezenas de milhares de imagens para análise, com a ajuda dos processos de imagem computacional, que permitiu que o processo fosse feito.

As imagens do Sagittarius A*, juntas com as imagens do buraco negro M87* fornecem mais dados sobre buracos negros aos cientistas. O M87* está muito mais longe da Terra, e é mais de 1.000 vezes maior que o Sagittarius A*, o que dá aos cientistas a oportunidade de comparar os dois.

Eles podem analisar melhor como os gases se comportam em torno dos buracos negros, e obter um entendimento melhor sobre como a gravidade se comporta em ambientes extremos, como os que ficam próximos aos buracos negros.

As observações também permitem um teste da teoria da relatividade de Einstein. Ambas as imagens dos buracos negros são similares, porque são consequências da gravidade. Segundo Einstein, o tempo-espaço, que seria o tecido do universo, se modifica em torno dos buracos negros da mesma forma, independente do seu tamanho. Por isso as imagens dos dois buracos negros são quase idênticas.

Mas a imagem do buraco negro da Via Láctea não será a última observação feita pela equipe do EHT. Os pesquisadores começaram uma nova campanha em março de 2022, que inclui mais telescópios a serem adicionados ao conjunto, com o objetivo de gerar imagens de alta resolução dos buracos negros, e até mesmo vídeos.

E como o EHT ainda limita-se em tamanho pelo nosso próprio planeta, alguns astrônomos esperam projetar algum material no espaço, para obter uma imagem do buraco negro da Via Láctea ainda melhor, assim como vislumbres de outros buracos negros do universo.

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