Esqueleto de 3.500 anos revela o mais antigo caso de artrite reumatoide

Leandro da Silva Monteiro
Alguns dos ossos analisados pela equipe de Madeleine Mant. Imagem: International Journal of Paleopathology

Arqueólogos estão sempre encontrando registros fascinantes de tempos imemoriais da humanidade. Pouco tempo atrás, um grupo encontrou evidências no crânio de um esqueleto que indicaria um suposto assassinato ocorrido há 33 mil anos. O caso de agora é menos mórbido, mas não deixa de causar fascínio nas informações que a tecnologia moderna pode oferecer sobre o passado. Segundo os cientistas, os ossos de uma antiga mulher núbia, nascida há mais de três milênios e meio atrás, podem ser o mais antigo caso de artrite reumatoide que se tem algum registro no mundo.

Para os leitores que desconhecem essa condição, a artrite reumatoide é uma doença autoimune crônica que afeta principalmente as articulações. Ela ocorre quando o sistema imunológico ataca erroneamente essas articulações, o que resulta numa inflamação que costuma ser acompanhada de dor e inchaço das regiões afetadas. Eventualmente a artrite reumatoide também causa danos articulares. Ela pode afetar qualquer articulação do corpo, mas é mais comum nas articulações das mãos, pulsos e joelhos. Por se tratar de uma doença autoimune, a artrite reumatoide não possui cura. Porém há tratamento e formas de prever sua ocorrência.

Voltando ao caso do esqueleto da mulher núbia, o estudo foi publicado recentemente na International Journal of Paleopathology. Madelaine Mant, professora adjunta no Departamento de Antropologia da Universidade de Toronto no Canadá, é a autora principal do artigo e deu vários esclarecimentos a respeito do esqueleto e de como ela e seus colegas foram capazes de identificar a artrite reumatoide.

Os ossos da mulher núbia foram descobertos por arqueólogos em 2018 durante uma escavação em um cemitério às margens do Nilo, numa região próxima a cidade de Assuã, que fica no sul do Egito. Análises feitas nos restos mortais indicam que aquela mulher teria algo em torno de 1,5 metros de altura e não poderia ter mais que 30 anos quando morreu. O período exato em que ela teria vivido é difícil de se determinar, mas estima-se que tenha sido entre 1750 e 1550 a.C.

Como conta Madeleine, nem sempre os esqueletos completos são encontrados nessas escavações. Felizmente, o caso da mulher núbia foi uma exceção pois seus restos apresentavam ótimo estado de conservação e com a maior parte dos ossos. Isso permitiu que a equipe pudesse fazer uma análise osteológica completa com toda segurança.

Esqueleto de mulher núbia que registra o mais antigo caso de artrite reumatoide já encontrado
Alguns dos ossos analisados pela equipe de Madeleine Mant. Fonte: International Journal of Paleopathology

Uma das coautoras do artigo, Mindy Pitre, professora e presidente do Departamento de Antropologia da Universidade de St. Lawrence em Nova York, revelou que as superfícies articulares da mulher não estavam danificadas. Com isso elas puderam eliminar outros tipos de artrite pois estes causam danos nas regiões que os ossos se encontram. No caso da artrite reumatoide, forma-se lesões erosivas com orifícios suaves e a equipe identificou essas lesões nos restos da mulher.

Pitre também adiciona que uma das condições mais comuns observadas em esqueletos antigos é a osteoartrite, doença que se caracteriza pelo desgaste da cartilagem articular e por alterações ósseas. Porém essa possibilidade também foi descartada pois ela produz uma aparência lisa nos ossos que os deixa semelhantes ao marfim.

A artrite reumatoide é uma condição bem rara, menos 1% da população mundial a possui. Osteoartrite, por outro lado, ataca oito vezes mais pessoas. Logo, assume-se que a condição poderia ser rara também no Egito antigo, ainda mais pela expectativa de vida menor que dificulta a manifestação das lesões. Geralmente, a artrite reumatoide é diagnosticada em pessoas de 35 até 50 anos.

Os pesquisadores também especulam sobre quais os possíveis impactos no dia-a-dia da mulher núbia com essa condição. Ela provavelmente experimentou uma qualidade de vida menor e que foi piorando com o progresso da artrite. Junto dos restos, foram encontrados uma peça de vestuário de couro bordado, uma pulseira de madrepérola e também o que aparentam ser fragmentos de uma cerâmica antiga. O que pode se inferir é que apesar da qualidade de vida reduzida, a mulher ainda contava com o zelo de familiares e/ou amigos.

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