Ao invés de pessoas, próxima pandemia deverá atingir agricultura

Daniela Marinho
Imagem: Grist / Getty Images

De acordo com dados atualizados do Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde, os óbitos acumulados em decorrência da Covid-19 ultrapassam a marca de 705 mil. Com a campanha massiva de vacinação, realizada em todo o país, o número de mortes diárias diminuiu consideravelmente. Embora ainda existam mortes causadas pelo vírus, a doença deixou de ser emergência de saúde. Agora, uma outra pandemia é iminente, mas dessa vez, ao invés de pessoas, a agricultura será o alvo.

A próxima pandemia poderá atingir a agricultura

Se você tiver a chance de ver um morango selvagem constatará que ele é bem diferente dos morangos que costumamos encontrar no supermercado. Essa variação do fruto não é natural. É, portanto, feita por meio de manipulação genética que modifica tamanho, cor e sabor. A grosso modo, essa premissa é o que chama-se de uniformidade genética.

Nesse contexto, a manipulação das plantas tem o aspecto econômico envolvido, geralmente para conceder resistência às pragas e criando variações peculiares e mais vantajosas tendo em vista o lucro. Arnold John Ullstrup, fitopatologista, escreveu uma revisão publicada ainda em 1972 sobre o assunto na qual afirma que: “Nunca mais uma grande espécie cultivada deveria ser moldada com tal uniformidade que se tornasse tão universalmente vulnerável ao ataque de um patógeno”, fazendo alusão às práticas de variação genética nos Estados Unidos.

Na mesma linha de raciocínio, o agricultor Miguel Altieri, professor emérito da Universidade da Califórnia, em Berkeley, disse que “Acho que temos todas as condições para que ocorra uma pandemia nos sistemas agrícolas”, o que resultaria em dificuldades econômicas e fome.

Contribuição das mudanças climáticas

Se o cenário já é perturbador, as mudanças climáticas acentuam ainda mais o perigo. Isso porque a evolução dos padrões climáticos está prestes a modificar a dispersão dos agentes patogênicos, expondo-os a novas espécies de plantas. Isso tem o potencial de agravar as enfermidades que afetam as culturas, como pontua o especialista em ciência do solo da Western Sydney University, Brajesh Singh, sediada na Austrália.

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Imagem: Canva

Em contrapartida, a incorporação da biodiversidade na agricultura seria uma saída viável para o problema. No entanto, a ideia de que isso protege a saúde das plantas não é algo novo. Na verdade, os cientistas já reconhecem essa ligação há séculos.

Vale ainda lembrar que a dinâmica entre plantas e patógenos na natureza configura ecossistemas saudáveis. Um patógeno típico tem a capacidade de infestar apenas determinadas espécies de plantas. Quando esse patógeno entra em contato com uma espécie que não pode ser infectada, essa planta assume um papel de escoadouro. O patógeno não consegue se multiplicar, resultando em sua neutralização, o que, por sua vez, preserva as plantas vizinhas.

Desse modo, a propagação dos patógenos ocorre de maneira fluida entre agrupamentos da mesma espécie, levando à destruição das plantas localizadas em proximidade com seus parentes, e, simultaneamente, garantindo que as paisagens mantenham um nível saudável de diversidade biológica. À medida que a “distância social” é restabelecida entre hospedeiros vulneráveis, a doença gradualmente some.

Nem todo micróbio é ruim

À medida que a exploração se intensifica, os desafios associados às doenças tornam-se mais evidentes, especialmente no contexto do agente patogênico denominado Potato vírus Y, que resulta em decréscimos significativos nos rendimentos de batata. Ao examinar de perto as áreas de terreno agrícola simplificado que circundam uma planta de batata, os pesquisadores notaram um padrão consistente: a prevalência do agente patogênico apresentava um aumento gradual à medida que a porcentagem da região circundante ocupada por terras agrícolas crescia.

Em contraste, nos ecossistemas naturais, a ampliação da biodiversidade se traduz em uma diminuição do número de espécies de vírus presentes. Pode-se concluir que micróbios benéficos presentes em plantas selvagens possivelmente desempenham um papel de contenção na propagação de muitos desses vírus, evitando o desencadeamento de doenças.

Entretanto, caso esses mesmos vírus atinjam culturas que não possuam essa proteção natural, as implicações resultantes permanecem incertas. Como salientou Hanna Susi, “não temos conhecimento do que poderá ocorrer”. Isso poderia levar agricultores a enfrentar novas formas de doenças em suas culturas.

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