Produtos químicos voláteis emergem como fonte petroquímica dominante na poluição atmosférica urbana

Diógenes Henrique
Pobre qualidade do ar em uma cidade.

Artigos de consumo e produtos industriais agora são uma fonte dominante de poluição atmosférica urbana. Novo estudo descobre uma contribuição surpreendentemente alta de tintas, pesticidas, perfumes à medida que as emissões de poluentes de veículos diminuem.

Produtos químicos que contêm compostos refinados de petróleo, como produtos de limpeza domésticos, pesticidas, tintas e perfumes, agora rivalizam com as emissões de veículos motorizados como a principal fonte de poluição atmosférica urbana, de acordo com um surpreendente estudo liderado pela NOAA, a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, órgão governamental  que faz parte do Departamento de Comércio dos Estados Unidos. A NOAA é um órgão para assuntos sobre meteorologia, oceanos, atmosfera e clima, advertindo sobre perigos climáticos e  dos mares, guiando o uso e a proteção do oceano e de recursos litorâneos, e conduzem pesquisas para melhorar a compreensão científica sobre o meio ambiente.

As pessoas usam muito mais combustível do que os compostos à base de petróleo em produtos químicos — cerca de 15 vezes mais por massa, de acordo com a nova avaliação. Mesmo assim, loções, tintas e outros produtos contribuem tanto quanto para a poluição do ar como o setor de transporte, disse o principal autor Brian McDonald, cientista do CIRES que trabalha na Divisão de Ciências Químicas da NOAA. A CIRES é uma parceria da NOAA e da Universidade do Colorado Boulder.

No caso de um tipo de poluição, a de pequenas partículas que podem danificar os pulmões das pessoas, as emissões de particulados provenientes de produtos químicos são cerca de duas vezes maiores que as do setor de transporte, descobriu a equipe liderada por McDonald.  McDonald e colegas da NOAA e de várias outras instituições relataram seus resultados este mês na Science.

“À medida que o transporte fica mais limpo, essas outras fontes tornam-se cada vez mais importantes”, disse McDonald. “O material que usamos em nossas vidas cotidianas pode afetar a poluição do ar”.

Para essa nova avaliação, os cientistas se concentraram em compostos orgânicos voláteis ou COVs. Os COVs podem se espalhar na atmosfera e reagirem para produzir matéria particulada em suspensão e ozônio (produtos da oxidação dos COVs), ambas reguladas nos Estados Unidos e em muitos outros países devido a impactos na saúde, inclusive danos aos pulmões. Vários problemas de saúde estão associados a COVs, como alergias e outros efeitos sobre a imunidade. Esses elementos estão associados também a problemas no cardíacos e pulmonares.

Quem vive em cidades e subúrbios admite que grande parte da poluição que respiramos vem de emissões de carros e caminhões ou vazamentos em tubulações de gás. E as pessoas admitem isso por uma uma boa razão: claramente era verdade nas últimas décadas. Mas os reguladores e os fabricantes de automóveis fizeram mudanças que limitaram a poluição dos motores, por combustíveis e implantarem sistemas de controle de poluição. Assim, McDonald e seus colegas reavaliaram as fontes de poluição atmosférica, classificando as recentes estatísticas de produção química compiladas por indústrias e agências reguladoras, realizando detalhadas medidas da química atmosférica no ar de Los Angeles e avaliando as medidas de qualidade do ar nos espaços fechados executadas por outras instituições.

Os cientistas concluíram que, nos Estados Unidos, a quantidade de COVs emitidos por produtos industriais e de consumo é, na verdade, duas ou três vezes maior que a estimada pelos atuais registros de poluição do ar, que também superestimam as fontes veiculares poluidoras. Por exemplo, a Agência de Proteção Ambiental estima que cerca de 75% das emissões de COV (por porção de massa e não de volume) são provenientes de fontes de veículos e cerca de 25% de produtos químicos. O novo estudo, com sua detalhada avaliação estatísticas do uso de químicos atualizados e dados atmosféricos anteriormente não disponíveis, coloca a divisão em meio a meio: 50% para emissões provenientes de veículos automotores e a outra metade oriunda da utilização de produtos químicos.

O impacto desproporcional da qualidade do ar das emissões de produtos químicos deve-se, em parte, a uma diferença fundamental entre esses produtos e os combustíveis, afirmou a cientista atmosférica da NOAA, Jessica Gilman, co-autora do novo artigo. “A gasolina é armazenada em recipientes fechados, esperançosamente estanques, e os COV na gasolina são queimados para se obter energia”, disse ela. “Mas os produtos químicos voláteis utilizados em solventes comuns e produtos de cuidados pessoais são literalmente projetados para evaporar. Você usa perfume ou usa produtos perfumados para que você ou seu vizinho possam desfrutar o aroma. Você não faz isso com gasolina”, disse Gilman.

A equipe estava particularmente interessada em como esses COVs acabam contribuindo para a poluição particulada. Uma avaliação abrangente publicada no periódico científico médico britânico Lancet, no ano passado, colocou a poluição do ar na lista das cinco principais ameaças de mortalidade global, com a “poluição atmosférica por partículas” como o maior risco de poluição do ar. O novo estudo descobriu que, à medida que os carros ficaram mais limpos, os COV formando essas partículas de poluição estão cada vez mais vindo de produtos de consumo.

“Já chegamos a esse ponto de transição em Los Angeles”, disse McDonald.

McDonald e os depois pesquisadores do estudo descobriram que simplesmente não conseguiam reproduzir os níveis de partículas ou ozônio medidos na atmosfera, a menos que incluíssem emissões de produtos químicos voláteis. No decorrer da pesquisa, eles também determinaram que as pessoas estão expostas a concentrações muito elevadas de compostos voláteis em ambientes fechados, que estão mais concentrados no interior do que fora, disse o co-autor Allen Goldstein, da Universidade da Califórnia em Berkeley.

“As concentrações em ambientes fechados são muitas vezes, dez vezes maiores no interior do que no exterior, e isso é consistente com um cenário em que os produtos à base de petróleo utilizados em ambientes internos fornecem uma fonte significativa para o ar exterior em ambientes urbanos”.

A nova avaliação concluiu que o foco da regulamentação nos EUA em emissões de automóveis tem sido muito eficaz, disse o co-autor Joost de Gouw, um químico da CIRES.”Funcionou tão bem que, para avançar ainda mais na qualidade do ar, os esforços regulatórios deveriam se tornar mais diversos”, afirmou Gouw. “Não são mais apenas os veículos”.

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