Pela primeira vez, experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome

Felipe Miranda
Imagem: Lawrence Livermore National Laboratory.

A fusão nuclear é um meio muito limpo de se obter energia através da energia nuclear, ao contrário da fissão nuclear. Entretanto, um dos maiores impedimentos da fusão nuclear é o fato de que, nas reações de fusão realizadas pelo ser humano, a reação consome mais energia do que produz. Agora, isso parece ter mudado.

Potencialmente, a fusão nuclear é muito poderosa, já que em teoria, é capaz de produzir uma imensa quantidade de energia. Entretanto, é um desafio tecnológico, já que a fusão é mais difícil, na prática, do que a fissão.

Fusão e fissão

A fissão nuclear é a reação que ocorre nas bombas nucleares. A fusão, a que ocorre nas estrelas.

A fissão ocorre quando há o choque de dois átomos, gerando uma liberação de energia. É uma energia que gera muitos resíduos, pois são utilizados, como combustível, materiais radioativos.

A fusão, por sua vez, ocorre quando dois ou mais átomos leves – principalmente o hidrogênio e o gás hélio – são pressionados um contra o outro até que seus núcleos se fundem, produzindo outros átomos não radioativos. Por exemplo, dois átomos de hidrogênio geram um de hélio + uma enorme quantidade de energia. A vantagem é que além de produzir muita energia, é uma fonte de energia muito limpa, pois não gera resíduos radioativos.

Experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome

Pela primeira vez, experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome.

Embora seja uma excelente fonte de energia, a fusão nuclear necessita de muita energia para iniciar e manter a reação em funcionamento, já que a reação precisa de ambientes especiais, como os núcleos das estrelas. Então, há um grande gasto de energia para criar um ambiente quente e com muita pressão.

Assim, produzir mais energia do que é consumida é uma meta antiga dos cientistas.

Em 2022, um experimento da Instalação Nacional de Ignição dos EUA parecia ter chegado a esse ponto. Mas isso precisava ser verificado antes de ser anunciado ao mundo. Isso é algo grande e muito importante.

No total, foram publicados uma série de 5 artigos (1, 2, 3, 4 e 5) detalhando os experimentos.

“Esta conquista é o culminar de mais de cinco décadas de pesquisa e dá a prova de que a fusão laboratorial, baseada em princípios fundamentais da física, é possível”, disseram os pesquisadores no primeiro artigo.

Na fusão laboratorial, foi algo bastante simples que ocorreu. Em resumo, os pesquisadores bombardearam uma cápsula com 220 microgramas de deutério e trítio (dois isótopos do hidrogênio), como combustível, com 192 lasers de alta potência. Esse bombardeio nos materiais dentro de uma cápsula gerou uma pressão de 600 bilhões de atm e uma temperatura de 151 milhões de ºC. O deutério e o trítio se fundiram, produzindo hélio e liberando energia.

experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome
Fusão entre o trítio e o deutério. Experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome com essa reação.

É aí que está o “Big Deal” – o experimento conseguiu gerar mais energia do que consumiu para iniciar a reação. Para alimentar os 192 lasers, os pesquisadores utilizaram 2,05 megajoules (MJ) de energia, e o resultado foi a liberação de 3,15 MJ, uma diferença muito impressionante.

Em um dos experimentos, com os mesmos 2,05 MJ, houve uma geração de 3,88 MJ de energia.

Se agora, um experimento de fusão nuclear produz mais energia do que consome, é resultado de pequenas décadas de pesquisa, mas muita pesquisa ainda está por vir. Isso é um grande passo. No entanto, os cientistas ainda estão muito longe de uma reação que produza energia em escala comercial. Até o momento, são apenas protótipos. Ainda deve levar algumas décadas até que a produção comercial de energia por fusão nuclear ocorra.

“Já é tarde demais para a fusão lidar com a crise climática. Já estamos enfrentando a devastação das mudanças climáticas em escala global”, diz ao New Scientist Aneeqa Khan, da Universidade de Manchester, no Reino Unido. “No curto prazo, precisamos usar as tecnologias de baixa emissão de carbono existentes, como a fissão e as energias renováveis, enquanto investimos em fusão a longo prazo, para fazer parte de um mix energético diversificado de baixa pegada de carbono. Precisamos apostar tudo o que temos na crise climática”.

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