Humanos são propícios a dormir mais no inverno, segundo estudo

Padrão de sono muda no decorrer das estações do ano.

Felipe Miranda
Imagem: Pixabay
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Alguns animais, como as marmotas e os hamsters, hibernam durante o inverno. O urso não hiberna, ao contrário do que geralmente se pensa, mas passa boa parte do período do inverno dormindo. O ser humano não hiberna, nem pode se dar ao luxo de passar tanto tempo assim dormindo como os ursos, já que o mundo não para no inverno. No entanto, também temos alguns padrões de sono que variam conforme a estação, como um sono profundo levemente mais longo no inverno, segundo um novo estudo publicado no periódico Frontiers in Neuroscience.

Em grande parte dos animais não humanos, a sazonalidade do comportamento do sono é bastante clara. Nós que desafiamos a natureza e mudamos isso por diversas razões — seja para se divertir durante a madrugada, seja para trabalhar em turnos que comumente dormiríamos. Mas nós também estamos à mercê da natureza: variações na exposição à luz do Sol, uso em excesso de telas (como celular, TV ou computador) próximo à hora de dormir — tudo isso afeta a qualidade de nosso sono. E bom, a sazonalidade também afeta.

“Possivelmente, uma das conquistas mais preciosas na evolução humana é uma quase invisibilidade da sazonalidade no nível comportamental”, disse em um comunicado o Dr. Dieter Kunz, autor correspondente do estudo. “Em nosso estudo, mostramos que a arquitetura do sono humano varia substancialmente ao longo das estações em uma população adulta que vive em um ambiente urbano”, disse Kunz, que é pesquisador na Clínica de Sono e Cronomedicina do Hospital St Hedwig, em Berlim.

Estudando o sono

Para o estudo, inicialmente os pesquisadores recrutaram 292 pacientes, que foram submetidos a uma séries e exames e monitoramento do sono ao longo de diversos momentos por muitos meses. Excluindo pacientes que tomavam remédios que afetavam o sono, falhas técnicas durante a polissonografia (um exame com uma série de parâmetros que vão desde ondas cerebrais, oxigenação do sangue, frequência cardíaca e movimentos oculares) e latência do sono REM por mais de 2 horas, continuaram 188 pacientes no estudo (98 mulheres e 90 homens).

Basicamente, há duas fases do sono: REM (Movimentos Oculares Rápidos) e NREM (Sem Movimentos Oculares Rápidos). O REM é o sono onde nossos olhos se movimentam muito, os batimentos cardíacos e a respiração mudam e diversos músculos se paralisam. O NREM, por sua vez, é dividido em três estágios diferentes, que vão da vigília ao sono profundo.

Os cientistas perceberam, então, alguns padrões sazonais do sono.

Durante o inverno, os indivíduos possuem uma tendência de dormir até 1 hora a mais, muito embora seja um padrão não tão significante, quase caindo para a insignificância estatística.

Mas os outros padrões são mais marcantes. No outono, os voluntários levaram, em média, 25 minutos a menos para entrar na fase REM do sono, em comparação com a primavera. Além disso, eles experimentaram uma média de 30 minutos a mais de sono REM durante o inverno do que na primavera.

Além disso, durante o sono de ondas lentas, a fase mais profunda do sono NREM, fase na qual nós sonhamos e a consolidação das memórias ocorrem, houve uma queda rápida e repentina durante o período do outono.

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O gráfico mostra as variações das fases do sono ao longo dos meses. O TST é o tempo total de sono, REM a fase de Movimentos Oculares Rápidos, já citada anteriormente, e SWS o sono profundo. Vale lembrar que o estudo ocorreu no hemisfério norte, então as estações são inversas às nossas.

Embora luzes artificiais afetem a qualidade do sono, mesmo aqueles indivíduos expostos a essas luzes apresentaram uma certa sazonalidade do sono.

“A sazonalidade é onipresente em qualquer ser vivo neste planeta”, disse Kunz. “Mesmo que ainda tenhamos um desempenho inalterado, durante o inverno a fisiologia humana é regulada para baixo, com uma sensação de ‘correr vazio’ em fevereiro ou março. Em geral, as sociedades precisam ajustar os hábitos de sono, incluindo a duração e o tempo para a estação, ou ajustar os horários escolares e de trabalho às necessidades sazonais de sono”.

Novas escalas

No entanto, um ponto que é reforçado pelos pesquisadores, é a necessidade de replicação do estudo em outras escalas e em outro grupo de voluntários. Os indivíduos voluntários do estudo apresentam condições ou distúrbios associados à insônia. Além disso, alguns efeitos, embora notados, não tiveram tanta relevância estatística. Os pesquisadores acreditam que em um grupo amostral saudável essas mudanças sazonais podem ser ainda mais marcantes. Além disso, 188 pessoas é pouca gente, então também é necessário que o estudo seja replicado em um grupo maior, para maior relevância estatística dos padrões encontrados.

“Este estudo precisa ser replicado em uma grande coorte de indivíduos saudáveis”, relata Kunz.

Isso, no entanto, não tira a validade do estudo. Ele mostra os pontos iniciais que podem seguir para novos estudos – que podem refutar os resultados do estudo presente, ou reforçá-los. A ciência se faz assim, com uma construção de diversas equipes diferentes, em diversos locais do mundo, com diversos resultados que se agregam em uma única missão, o conhecimento.

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