Como as hidras conseguem regenerar uma cabeça perdida?

Mateus Marchetto
Imagem: Corvana / Wikipedia Commons

Imagine um ser vivo potencialmente imortal. Em teoria, suas células-tronco podem dar origem a novas células indefinidamente, sem aumentar a chance de doenças. Contudo, esse organismo não é mitológico. As hidras, pequenos cnidários, tem essa capacidade, e cientistas agora entendem melhor como isso é possível.

De forma bastante notável no mundo animal, uma hidra é capaz de regenerar uma cabeça perdida. Ao contrário dos seres mitológicos de mesmo nome, todavia, as hidras reais são bastante pequenas e sutis.

Por muito tempo, inclusive, pesquisadores têm se interessado na capacidade de regeneração das hidras e em seus longos tempos de vida. Se não for predada ou destruída, uma hidra pode viver indefinidamente.

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Hidras são animais do filo das anêmonas e águas-vivas (cnidários) e raramente passam de poucos centímetros. Imagem: Frank Fox / Wikipedia Commons

Ainda, uma nova pesquisa publicada no periódico Genome Biology and Evolution mostra que a epigenética tem um papel central na regeneração das hidras. De acordo com a pesquisa, uma parcela dos genes das hidras sofrem alterações epigenéticas significativas durante a regeneração.

Epigenética, vale comentar, é a alteração dos genes sem mudança da sequência de nucleotídeos. Basicamente, proteínas podem se ligar ao DNA para promover ou silenciar genes em momentos diferentes.

Contando genes e cabeças de hidras

Para compor a análise genética das hidras, a equipe de pesquisadores precisou primeiro mapear mais de 27 mil possíveis genes constitutivos dos animais. Desse total, pouco mais de 9 mil eram candidatos a promotores e 3 mil a enhancers.

Tanto promotores quanto enhancers são sequências genéticas que facilitam a expressão de um determinado gene.

Nestes dois grupos, portanto, a equipe de pesquisadores pode notar uma expressão remodelada destes genes durante a regeneração. Isso é possível, ademais, provavelmente pela alteração epigenética do DNA.

Destes genes, em especial aqueles da família Wnt se mostraram bastante ativos durante a regeneração. Alguns destes, todavia, como Wnt3 se comportaram como organizadores da formação da cabeça durante a regeneração.

Além disso, a pesquisa mostra que boa parte dos genes para a diferenciação das células da cabeça provavelmente é expresso de forma contínua. Isso porque as hidras produzem constantemente novas células-tronco que precisam se diferenciar para terem função, o que também contribui para a longevidade do bicho.

A pesquisa também traça uma comparação entre a regeneração entre vertebrados e invertebrados. Salamandras e alguns peixes de água doce, por exemplo, podem regenerar membros inteiros que tenham sido amputados. Estes animais, nesse sentido, compartilham uma gama de genes semelhantes relacionados à regeneração.

Invertebrados, que apresentam mais amplamente a capacidade de regenerarem partes do corpo, tem muitos genes em comum entre si, mas divergem dos vertebrados neste ponto. Ou seja, a pesquisa reforça, geneticamente, a separação evolutiva entre vertebrados e invertebrados há 600 milhões de anos.

A pesquisa está disponível no periódico Genome Biology and Evolution.

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