Cientistas podem ter encontrado uma solução para um paradoxo previsto por Stephen Hawking

Jônatas Ribeiro

Stephen Hawking foi, sem dúvidas, um dos cientistas mais importantes da segunda metade do século XX em diante. Seguindo a tradição de Carl Sagan, o físico teórico não se conteve entre os muros da academia e partiu para a mídia e para o mercado editorial na missão de levar as fronteiras do conhecimento científico de maneira didática e intuitiva para o grande público. Seu clássico Uma Breve História do Tempo, publicado pela primeira vez em 1988, foi de suma importância para a formação de várias gerações de curiosos e aficionados pelo conhecimento, incluindo até mesmo futuros cientistas.

E Hawking não parou por aí, escrevendo outros clássicos como O Universo Numa Casca de Noz e Uma Nova História do Tempo, atualização de sua primeira e mais conhecida obra. Além disso, é lembrado pela luta de toda uma vida contra a esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença degenerativa com a qual foi diagnosticado com 21 anos de idade. Isso nunca o impediu, contudo, de fazer história. O que nem todos sabem, contudo, é que, assim como Carl Sagan, Hawking também tinha uma prolífica carreira dentro da academia, tendo publicado trabalhos de grande importância na cosmologia e, sobretudo, sobre buracos negros. Possivelmente, sua contribuição mais importante foi o conceito chamado de radiação Hawking.

A radiação Hawking

stephen hawking
Imagem: BBC/RICHARD ANSETT

Os buracos negros surgem primeiramente de uma predição matemática da relatividade geral, como corpos massivos o suficiente para curvar o espaço-tempo de forma que nem a luz pode escapar deles. O centro desses objetos pode ser descrito, na matemática, como uma singularidade, isto é, um ponto infinitesimal de curvatura infinita. Fisicamente, eles se formam pelo explosivo processo de colapso de estrelas muito massivas no fim de suas vidas, de maneira que a matéria restante é comprimida em um volume pequeno o suficiente para que a velocidade de escape até uma certa região, chamada de horizonte de eventos, seja maior do que a da luz.

A partir disso, a radiação Hawking vem dos conhecimentos provenientes da mecânica quântica. Mais especificamente, da fronteira da física quântica, como a teoria quântica de campos. Hawking mostrou teoricamente que a força da gravidade no horizonte de eventos era suficientemente intensa para desencadear a emissão de radiação térmica. É como, portanto, se o buraco negro estivesse vazando energia para o universo. E então, lentamente evaporando (mesmo que a energia não seja emitida diretamente do buraco negro). Essa radiação térmica não é a mesma do que a chamada radiação de corpo negro, que é puramente estatística e depende da temperatura do corpo. A radiação Hawking não contém informações sobre o buraco negro além da sua massa, momento angular e carga elétrica.

Poderíamos dizer, portanto, que a radiação Hawking causaria perda permanente de informação. Os futuros estados do buraco negro, assim, não dependem do estado inicial. Isso rompe com princípios fundamentais da evolução temporal de estados quânticos, além da reversibilidade, isto é, a possibilidade de reconstruir o estado inicial através das informações adquiridas. E aí está o paradoxo que envolve a questão.

Novas soluções, não tão novas teorias

horizonte de eventos
Imagem: NASA/JPL-CALTECH

Ainda nos anos 60, próximo à publicação revolucionária de Hawking, o físico John Archibald Wheeler descreveu divertidamente os buracos negros como corpos “sem cabelo”. Ou seja, como as informações observáveis são todas perdidas, é como se os objetos fossem praticamente carecas para os observadores. Essa concepção perdurou por mais de 50 anos, com gerações de físicos teóricos se debruçando sobre o problema.

Agora, contudo, surge um trabalho que tem potencial para resolver o problema definitivamente. Seguindo a tradição dos estudos sobre buracos negros, a chave está em um conceito chamado de “cabelo quântico”. O primeiro artigo, publicado na renomada Physical Review Letters, demonstra que os buracos negros, na verdade, são mais complexos do que se pensava: os campos gravitacionais guardam informação relevante sobre sua formação. A matéria que colapsa em um buraco negro, portanto, deixa uma marca no campo, chamada, então, de “cabelo quântico”.

Em um artigo seguinte, publicado na Physics Letters B, os professores Xavier Calmet e Stephen Hsu, da University of Sussex e Michigan State University, respectivamente, ligam os cabelos quânticos ao paradoxo de Hawking. Enquanto na física clássica, o horizonte de eventos serviria como uma membrana impermeável, isto é, o ambiente exterior seria o mesmo para todos os buracos negros, os desenvolvimentos quânticos presentes no trabalho implicam que a matéria colapsada no objeto continua a afetar o exterior de alguma forma. Os buracos negros, em vez da careca do horizonte de eventos, agora teriam, na verdade, um pouco de “cabelo” visível para os observadores da Terra.

Assim, não há separação absoluta entre o interior e exterior do buraco negro. Esses objetos, tidos como excelentes laboratórios da interação entre mecânica quântica e relatividade geral, confundiram os cientistas por muito tempo, gerando sugestões até mesmo de reformulação da teoria quântica ou da relativística. Agora, contudo, a questão histórica pode finalmente ter sido resolvida.

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