Nova Zelândia pretende ter o céu mais escuro do mundo

O país planeja realinhar a conexão humana com o céu em um projeto sem precedentes.

Felipe Miranda
Imagem: Dave Young / Flickr

A Nova Zelândia se destaca entre os países com os céus noturnos mais deslumbrantes do mundo, com suas lindíssimas paisagens noturnas. No entanto, possui, também, muita poluição luminosa, atrapalhando as observações dos céus durante a noite. 80% do planeta Terra é afetado pela poluição luminosa. Agora, o país segue em um enorme esforço liderado pelo povo Maori. A meta é, em alguns anos, receber a designação da International Dark-Sky Association (IDSA), ou Associação Internacional do Céu Escuro, no português, de um país de céu escuro. O projeto segue sendo realizado em uma escala sem precedentes na história.

A poluição luminosa segue em grande debate pelo mundo. Somos extremamente privados da observação do céu noturno. Você já deve ter se deparado com a triste sensação de olhar para o céu e ver apenas uma grande cor laranja se perpetuando, com poucos pontos luminosos visíveis no céu. Isso ocasionado pela poluição luminosa e pela poluição atmosférica somadas.

“Nossa língua [te reo Māori] e diferentes práticas e crenças culturais saem de nossas observações do céu noturno”, diz à National Geographic o astrônomo e professor de Mātauranga Māori (conhecimento Maori) na Universidade Massey Rangi Mātāmua. Mātāmua é Maori e possui uma ascendência tribal Ngāi Tūhoe.

O povo Maori liga-se muito ao céu em seu dia a dia, utilizando, por exemplo, o calendário lunar, chamado por eles de maramataka, como um meio de identificar as estações do ano – separando as épocas para plantio e colheita, além da pesca e da caça.

O ano novo Maori é marcado com o aparecimento das Plêiades, conhecidas pelos Maoris como aglomerado estelar Matariki.

“A maneira como é tradicionalmente celebrado é que coletamos alimentos de diferentes partes do ambiente – água doce, água salgada, jardins, floresta – e cozinhamos esses alimentos no solo. Oferecemos esse alimento ao aglomerado estelar quando ele sobe no céu da manhã para agradecer por tudo o que recebemos ao longo do ano e esperar pela promessa de uma estação nova e próspera.”, explica Mātāmua ao NatGeo.

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Via Láctea vista acima de Queenstown, na Nova Zelândia. Imagem: Mantas Volungevicius / Flickr

Os Maoris também utilizavam os céus para navegar; eles conheciam esse “gps” celeste muito antes mesmo da fundação de Roma.

“Nossas tradições nos dizem que nossos ancestrais viajaram por diferentes razões. Estávamos no oceano para pescar, viajar para conhecer nossas relações e partir para novos países.”, explica diz Te Taka Keegan, reitor associado Maori da Universidade de Waikato.

Conforme o NatGeo, Keegan defendeu, como tese de mestrado, a navegação tradicional Maori. No entanto, ele não ficou apenas na teoria, ajudando na navegação de waka hourua (uma canoa Maori de casco duplo) entre o Havaí e Rarotonga, nas Ilhas Cook – uma distância de 2700 milhas náuticas, ou quase 5 mil quilômetros.

“Você forma um senso de familiaridade, um parentesco com as estrelas. Você não está sozinho no oceano – você tem todos esses outros amigos no céu olhando para você”, diz Keegan.

Além da conexão com a natureza, os animais também utilizam o céu noturno. Portanto, a conservação da observação do céu pode ser vista como uma ferramenta de conservação da biodiversidade local.

Aves migratórias, como os Fuselos, utilizam as posições das estrelas para navegar através do céu noturno. A poluição luminosa também afeta alguns insetos noturno, como o Wētā. A população desses insetos já segue em declínio, já que esses insetos enfrentam uma redução em suas atividades devido à poluição luminosa.

“O céu noturno é essencial para o equilíbrio dos ecossistemas [da Nova Zelândia]. Está conectado a todos os aspectos do meio ambiente.”, explica Olive Karena-Lockyer, educadora de astronomia do Observatório Stardome, em Auckland. “À medida que o céu noturno muda ao longo do ano, torna-se um indicador de diferentes processos naturais”.

“Olhar para o céu e se conectar a ele está no coração da humanidade. É uma das primeiras atividades que todas as culturas do planeta fizeram, e o céu noturno está intrinsecamente conectado a quem somos como seres humanos”, diz Mātāmua.

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