A fusão nuclear nunca esteve tão próxima de se tornar realidade

Felipe Miranda
Imagem: Reprodução

A fusão nuclear é, constantemente, alvo de textos aqui na Socientífica. O tema é tão comentado assim por uma razão: trata-se de uma tecnologia que, se dominada, é extremamente limpa (muito mais limpa e segura do que a fissão nuclear), pois não utiliza materiais radioativos, e extremamente eficiente. As estrelas, por exemplo, fazem a fusão nuclear. Portanto, dominar um reator de fusão nuclear é como ter um sol em miniatura.

Agora, um grupo de cientistas do National Ignition Facility no Laboratório Nacional Lawrence Livermore conseguiu uma importante marca histórica com um reator de fusão nuclear. Isso nos coloca mais perto do que nunca de ter uma ampla utilização dos reatores de fusão nuclear na distribuição de energia elétrica pelo mundo.

Em resumo, o que eles conseguiram foi um ganho líquido de energia. Eles conseguiram produzir mais energia do que gastaram. E porquê isso é tão importante assim, é o que explicaremos.

Fusão e fissão nuclear

A fissão nuclear é uma reação em cadeia. Diversos materiais radioativos são utilizados na reação, mas vamos utilizar como exemplo o urânio-235. Ao bombardear o urânio-235 com um nêutron, o átomo absorve o nêutron e se tona o urânio-236, um isótopo extremamente instável do urânio. Como é um átomo muito instável, ele acaba se dividindo em duas partes, formando bário, criptônio e liberando uma grande quantidade de energia.

A liberação de nêutrons faz com que a reação se multiplique por outros átomos. Por alguns outros motivos, mas também por ser uma reação em cadeia, a fissão nuclear não gasta tanta energia para ser mantida quanto a fusão.

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Ilustração do National Ignition Facility no Laboratório Nacional Lawrence Livermore. Imagem: Laboratório Nacional Lawrence Livermore

Já a fusão consiste não em dividir átomos, mas em juntá-los. Pela repulsão que os núcleos possuem entre si, porém, é uma reação que demanda condições muito especiais. É por isso que, além de não ser uma reação de cadeia, demanda muito mais energia do que a fissão. Uma bomba de hidrogênio, que trabalha com fusão nuclear, utiliza uma bomba nuclear convencional, de fissão, como estopim, para se ter ideia do nível de energia necessária para a reação.

Já na fusão, não são utilizados materiais radioativos. Por exemplo, vamos utilizar dois isótopos do hidrogênio – deutério e trítio. Ao colocar um átomo de deutério e um átomo de trítio sob calor e pressão suficiente, você os funde. A fusão forma um átomo de hélio, um nêutron e muita energia. O hélio, por sua vez, pode novamente ser fundido, gerando outros elementos.

Por demandar tanta energia, a fusão nuclear nos gera um problema: nenhum reator de fusão nuclear já construído pelo ser humano produziu mais energia do que demandou – até agora.

Uma grande marca

Embora esteja um pouco longe de oferecer energia por uma escala de tempo como precisamos, os pesquisadores conseguiram uma sustentação da reação por um bom tempo. Ou seja, a conquista não significa que teremos um reator de fusão nuclear em casa no próximo mês. Mas é uma conquista e tanto para a física experimental e para a energia limpa.

“A produção de energia levou menos tempo do que a luz leva para viajar uma polegada”, disse o Dr. Marvin Adams, da NNSA ao The Guardian.

Os cientistas utilizaram, por meio de um laser, 2,05 megajoules de energia e conseguiram obter 3,15 megajoules. Isso representa um ganho de 50%.

“Isso é muito importante porque, do ponto de vista da energia, não pode ser uma fonte de energia se você não está tirando mais energia do que está colocando”, disse Julio Friedmann, cientista-chefe da Carbon Direct à CNN. “Avanços anteriores foram importantes, mas não é a mesma coisa que gerar energia que poderia um dia ser usada em uma escala maior”.

“Em alguns sentidos, tudo muda; em outro, nada muda. Este resultado prova o que a maioria dos físicos sempre acreditou – a fusão em laboratório é possível. No entanto, os obstáculos a serem superados para fazer qualquer coisa como um reator comercial são enormes e não devem ser subestimados”, disse ao Guardian Justin Wark, professor de física da Universidade de Oxford e diretor do Centro de Oxford para Ciência de Alta Densidade de Energia.

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