Pesquisa classifica Dickinsonia como um animal

Pedro Noah
Créditos: Pete Buchholz

O Período Cambriano é famoso pelo surgimento explosivo de grupos de animais em um curto período de tempo. O menos conhecido pelo público é o Período Ediacarano, que abriga alguns dos primeiros organismos macroscópicos. Eles possuem uma variedade de formas e tamanhos, mas muitos são planos e parecem ser feitos de unidades repetidas e apresentam um estranho aspecto que lembra colchões de ar.

A relação desses organismos tem sido o foco de muitos debates desde sua descoberta. Algumas destas possíveis relações inclui grupos de animais vivos, líquens, fungos, um reino multicelular completamente extinto ou gigantescos organismos unicelulares. A paleontóloga Renee Hoekzema e seus colegas realizaram pesquisas que mostram que pelo menos um desses estranhos organismos, Dickinsonia, é um animal.

Dickinsonia é um dos maiores e mais icônicos organismos ediacaranos, sendo, a grosso modo, oval e um dos maiores espécimes, com quase 1,5 metros de comprimento, mas com apenas alguns centímetros de espessura. Seu corpo é composto por inúmeros segmentos ou “unidades” infladas e refletidas a partir de um eixo central, e um grande segmento em forma de cunha, chamado “região deltóide”. Os menores espécimes de Dickinsonia e presumivelmente os mais novos apresentam essas regiões proporcionalmente maiores e com poucas unidades, enquanto os espécimes maiores possuem regiões deltóides menores e com muito mais unidades.

A equipe procurou determinar de onde surgiam novas unidades em Dickinsonia durante seu desenvolvimento. Teriam elas emergido da região deltóide, ou de uma outra região, a qual eles chamam de região anti-deltóide? Para entender melhor isso, eles examinaram 20 espécimes com uma variedade de diferentes tamanhos e mediram as dimensões de cada uma dessas unidades e da região deltóide.

Fóssil de Dickinsonia costata e esquema mostrando o eixo central, região deltóide (topo), região anti-deltóide (inferior) e as unidades individuais. Imagem de Hoekzema et al.
Fóssil de Dickinsonia costata e esquema mostrando o eixo central, região deltóide (topo), região anti-deltóide (inferior) e as unidades individuais. Imagem de Hoekzema et al.

Eles descobriram que é mais provável que as novas unidades tivessem surgido da região deltóide e que as unidades menores da extremidade anti-deltóide sejam as partes mais antigas do organismo. Isto é suportado pelo fato de que as regiões deltóides de alguns espécimes, parecem apresentar novas unidades parcialmente fundidas. Além disso, uma vez que as unidades separaram-se desta região, elas cresceram até alcançar um terço do corpo, tornando todo o organismo mais largo atrás dessa mesma extremidade.

Essa é uma idéia diferente da maioria das anteriores, que consideravam as unidades do extremo anti-deltóide como as mais novas, simplesmente por serem menores.

Os autores observaram que o crescimento pela adição de tecido perto (mas não em) de uma região é semelhante com o que é visto em alguns animais, mas não com o que ocorre em outros organismos. O grupo também aponta para fósseis que mostram o desenvolvimento e a mudança na morfologia de Dickinsonia. Em animais que possuem um desenvolvimento semelhante ao de Dickinsonia, especialmente os animais de simetria bilateral, o tecido é normalmente adicionado na região posterior do corpo. Isso significa que a região deltóide está localizada na extremidade posterior e a região anti-deltóide na anterior.

Dickinsonia é um, dentre vários organismos estranhos da biota de ediacara, com corpos “acolchoados”. Imagem de Franz Anthony.
Dickinsonia é um, dentre vários organismos estranhos da biota de ediacara, com corpos “acolchoados”. Imagem de Franz Anthony.

Isso traz a origem dos animais bilaterais de volta ao Período Ediacarano, há 560 milhões de anos, e sugere que muitos outros organismos da biota de ediacara, com anatomia acolchoada ou semelhante também podem ter sido animais bilaterais. Os pesquisadores não puderam atribuir Dickinsonia a nenhum grupo de animais modernos, mas pode ser parte de uma linhagem extinta prematuramente. Outras pesquisas sobre os demais organismos ediacaranos podem determinar se eles desenvolveram-se do mesmo modo que Dickinsonia e se também eram ou não animais.

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Referências

Renee S. Hoekzema, Martin D. Brasier, Frances S. Dunn, Alexander G. Liu. Quantitative study of developmental biology confirms Dickinsonia as a metazoan. The Royal Society, 2017. DOI: 10.1098/rspb.2017.1348

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