Caverna cheia de artefatos intocados é encontrada em Chichén Itzá

SoCientífica
Chichén Itzá, uma cidade de pedra na península de Yucatán no México, construída pela civilização Maia por volta de 750 depois de Cristo.

Os artefatos redescobertos intactos permitirão que os pesquisadores entendam as mudanças no local.

Especialistas há muito estudam e exploram Chichén Itzá, um conjunto importante de ruínas maias na Península de Yucatán, no México, que inclui a impressionante pirâmide El Castillo (também conhecida Templo de Kukulkán ou Pirâmide de Kukulkán). Mas, como relata a Associated Press, foi preciso uma dica — ou, mais precisamente, duas dicas — dos moradores locais para apontá-los em direção a uma caverna inexplorada no local, que contém dezenas de artefatos, ossos e holocaustos para os deuses.

chichen itza cueva balamkanche
Esta é uma imagem do Interior da “Cueva Balamkú”. Foto: Karla Ortega, Proyecto Gran Acuífero Maya (GAM).

A caverna, que fica a aproximadamente 2,7 quilômetros a leste de El Castillo, foi descoberta a cerca de cinquenta anos atrás. Na época, arqueólogo Víctor Segovia Pinto ficou sabendo da descoberta por meio dos moradores da região. Ele emitiu um breve relatório sobre a caverna e a selou. O relatório de Pinto ficou esquecido até recentemente.

Mas no ano passado, os moradores locais mais uma vez apontaram o local para os arqueólogos, que começaram a investigar o sítio novamente. E aí que foi redescoberto esse santuário subterrâneo.

De acordo com a agência de notícias Agence France-Presse, por respeito aos costumes locais, a equipe de pesquisadores, liderada pelo arqueólogo Guillermo de Anda, arqueólogo do Instituto Nacional de Antropologia e Historia (INAH) e diretor do programa Grande Aquífero Maia, (Gran Acuifero Maya, ou GAM), realizou um ritual de purificação que durou seis horas antes de entrar na caverna conhecida como Balamkú, a cova do deus do jaguar, um pequeno sítio arqueológico localizado no estado mexicano Campeche (faz divisa com  o estado de Yucatán), a 200 quilômetros em linha reta a sudoeste de Chichén Itzá.

Para alcançar as sete câmaras, em certas passagens Anda teve que rastejar pelas apertadas passagens entre uma câmara e outra. Até que as luzes que ele levava presa em sua cabeça revelou algo surpreendente: uma boa quantidade de oferendas deixadas pelos antigos moradores de Chichén Itzá, tão perfeitamente preservadas e intocadas que as estalagmites se formaram ao redor dos queimadores de incenso, vasos, pratos decorados e outros objetos na caverna. O local era onde os maias iam para deixar ofertas, que eram principalmente para o deus Tláloc, divindade da civilização tolteca responsável por raios, chuvas e terremotos.

“Você quase sente a presença dos maias que depositaram essas coisas lá”, relata Anda à National Geographic.

Até o momento, segundo a Smithsonian Magazine*, os pesquisadores descobriram 155 queimadores de incenso de cerâmica, bem como caixas de argila e outros vasos no local. Eles planejam deixar os artefatos no mesmo local no sítio arqueológico redescoberto.

A National Geographic noticiou ainda que essa redescoberta da caverna Balamkú foi feita por pesquisadores do projeto GAM, a quem os locais relatam a existência da entrada da gruta. Os pesquisadores do projeto chegaram para trabalharem para o Projeto, que visa mapear a vasta rede de cavernas subterrâneas, rios e outras corpos de água sob a Península de Yucatán. No ano passado, o Projeto mapeou parte de um sistema de cavernas inexplorado que acabou se unindo ao sistema existente, criando o maior sistema de cavernas subaquáticas do mundo.

Arqueólogo Guilhermo Anda na Caverna Balamkú
“O Projeto GAM redescobre Balamkú, santuário subterrâneo de ChichénItzá. O projeto do Instituto Nacional de Antropologia e Historia (INAH), Gran Acuífero Maya (GAM), iniciará um registro meticuloso do site através da criação de modelos tridimensionais, sem modificar contexto”, escreveu a instituição no Twitter. Na foto, o arqueólogo Guillermo de Anda, do INAH e diretor do GAM. Créditos:  Foto: Karla Ortega, Proyecto Gran Acuífero Maya.

Foi um grande golpe de sorte que Pinto decidiu não remover os artefatos da caverna, o que foi crucial para a conservação de todos os itens durante todo esse tempo. O estado intocado do sistema de cavernas dá aos pesquisadores a chance de investigar quanta troca cultural ocorreu entre a civilização maia e outras culturas da América Central. Talvez o sítio servirá também para que os estudiosos aprofundem mais no conhecimento sobre os maias, antes de Chichén Itzá entrar em declínio.

Um mapeamento 3-D com tecnologia de ponta, pesquisa paleobotânica e outras técnicas recentes ajudarão nesse esforço de pesquisa. “Balamkú vai ajudar a reescrever a história de Chichen Itzá, um dos centros cerimoniais mais importantes para a antiga civilização maia”, Anda previu durante uma coletiva de imprensa realizada na sede do INAH, na Cidade do México nesta semana.

Nova chance

No relatório original sobre a caverna (recentemente localizado pelo arqueólogo James Brady, da Universidade Estadual da Califórnia, em Los Angeles), Pinto já havia identificado 155 artefatos, alguns com faces do deus Tláloc, e outros com marcas da sagrada ceiba, uma representação potente do universo maia. Para fins de comparação, a caverna vizinha de Balankanché, um local de ritual escavado em 1959, contém apenas 70 desses objetos.

“Balamkú parece ser a ‘mãe’ de Balankanché”, diz Anda. “Eu não quero dizer que a quantidade é mais importante do que a informação, mas quando você vê que há muitas, muitas ofertas em uma caverna que também é muito mais difícil de acessar, isso nos diz algo”. Veja a galeria de fotos no site do INAH.

Por que Pinto decidiu selar uma descoberta tão fenomenal ainda é uma questão de debate. Mas ao fazê-lo, ele inadvertidamente forneceu aos pesquisadores uma “segunda chance” sem precedentes para responder a algumas das questões mais intrigantes que continuam a provocar controvérsias entre os estudiosos dos maias hoje, tais como o nível de contato e influência trocados entre diferentes culturas mesoamericanas e o que estava acontecendo no mundo maia antes da queda de Chichén Itzá.

Pesquisadores acessaram a caverna
Pesquisadores acessaram a caverna descoberta fortuitamente há mais de 50 anos e documentaram um grande número de objetos arqueológicos. Os cientistas dizem que essa descoberta os ajudará a entender melhor as origens e crenças dos moradores de Chichen Itza. Chichen Itza é uma cidade de pedra na península de Yucatán, no México, fundada por volta de 750 depois de Cristo. Crédito: Grande Aquífero Maia (Facebook)

“Este é um complexo arqueológico que não foi tocado ou alterado, o que tem um enorme valor para nós”, disse Anda à agência Aristegui Notícias.

Nova descoberta

Esta não é a única descoberta recente em Chichén Itzá.

Segundo a Smithsonian, os arqueólogos supõem que muitos dos edifícios do sítio arqueológico foram construídos em cima de cenotes. Os cenotes são poços de água formados por rios subterrâneos e revelados há milhares de anos pelo colapso de camadas de rochas calcárias. Algumas dessas piscinas naturais de água cristalina são parcialmente escondidas por cavernas, enquanto outras são abertas e parecidas com lagoas. A palavra “cenote” vem justamente do maia “Dzonot”, que significa poço ou buraco.

Um grupo de pesquisadores, esses do Projeto Subterrâneo Chichén Itzá, agora buscam encontrar e mapear esse mundo subterrâneo como parte do Projeto Subterrâneo Chichén Itzá, parte do projeto Grande Aquífero Maia. Na verdade, há alguns anos, os pesquisadores descobriram que a própria pirâmide de El Castillo está construída sobre um antigo cenote. Desde então os arqueólogos têm procurado por túneis que possam levar poço aquático e oculto abaixo do templo. [National GeographicSmithsonian  Mag]

*A Smithsonian Magazine é um veículo de comunicação do Instituto Smithsoniano (em inglês, Smithsonian Institution), instituição educacional e de pesquisa associada a um complexo de museus e administrada pelo governo dos Estados Unidos.

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