Cientistas desmistificam o primeiro complexo industrial da Antiguidade

Felipe Miranda
(Carole Raddato).

Ainda durante a Antiguidade, povos europeus inovaram com o primeiro complexo industrial do mundo, chamado de Aqueduto e moinhos de Barbegal. Construído no auge do Império Romano, na região sul da atual França, o complexo possui 16 rodas d’água para alimentar máquinas e produzir produtos específicos em escala industrial, ainda no século II da Era Comum

“Pouco se sabe sobre o estado do avanço tecnológico neste período, especialmente na hidráulica e na difusão contemporânea do conhecimento. Desde que a parte superior do complexo do moinho Barbegal foi destruída e nenhum vestígio da maquinaria de madeira sobreviveu, o modo de operação desses moinhos permaneceu indefinido por muito tempo”, descreve uma equipe de pesquisadores em um novo estudo publicado no periódico Scientific Reports, onde desmistificam um pouco do complexo.

Revivendo o primeiro complexo industrial do mundo

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Assim está o complexo hoje. (Robert Fabre, Saint Etienne du Grès, France).

Muito antes de dominarmos a eletricidade, a água consolidou-se como uma ótima maneira de se realizar Trabalho (no jargão da física) sem a mão de obra humana ou animal. Humanos e animais cansam e se alimentam, enquanto a corrente de água se move constantemente pela força da gravidade. Então era natural que alguém descobrisse como a utilizar. Além disso, em algum momento, um sistema parecido aproveitou a força dos ventos.

São muitas as principais aplicações de mecanismos movidos pela corrente da água. Entre elas, a fabricação de farinhas, através dos moinhos, e o corte de madeira e pedras. Para alimentar as rodas d’água, eles não utilizaram um rio, mas aquedutos. É um princípio não muito distante das barragens hidrelétricas que utilizamos nos dias de hoje. 

No entanto, a destruição de partes das estruturas do moinho acabaram com mais detalhes da engenhosidade romana. “Felizmente, durante a operação da fábrica, o carbonato de cálcio se precipitou nas partes da maquinaria da fábrica de madeira que estavam em contato com a água”, explicam os pesquisadores no artigo.

Portanto, esse material serve, nos dias de hoje, como uma espécie de ‘fóssil’ da construção. “Em Barbegal, os depósitos de carbonato sobreviveram como moldes da madeira original, o que pode fornecer informações detalhadas sobre as peças individuais do moinho, esclarecendo a operação do complexo”, relata a equipe

Tecnologia que impressiona

“Combinamos as medições das bacias hidrográficas com cálculos hidráulicos e mostramos que a calha a que pertencia esta peça em forma de cotovelo muito provavelmente fornecia água às rodas do moinho nas bacias inferiores do complexo”, diz o professor Cees Passchier em um comunicado. Eles explicam que nunca ninguém encontrou uma calha semelhante em moinhos, tanto os mais antigos, quanto os mais atuais.

Inicialmente, eles consideraram a calha uma estupidez, pois atrapalharia a água. No entanto, ao modelar e estudar a peça, eles perceberam que ela oferecia uma condução para a água ganhar o melhor ângulo e velocidade possíveis ao mesmo tempo que aumentava o fluxo da água em uma parte da calha. “Isso nos mostra a engenhosidade dos engenheiros romanos que construíram o complexo”, diz Passchier.

A imagem abaixo mostra algumas das formas que os cientistas hipotetizaram para a utilização das calhas:

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(Passchier et al., 2020 / Nature).

Além disso, ao que as análises indicam, os romanos cortaram as peças de madeira que constroem o próprio complexo com serras movidas à água. Isso torna-a, nas palavras de Passchier, “possivelmente a primeira serra mecânica de madeira documentada”, mostrando como a criatividade humana inova.

Os romanos construíram os mecanismos posicionados em 2 filas, cada uma com oito moinhos, e dois aquedutos alimentavam as fileiras. Além de uma construção extremamente planejada para funcionar como o esperado, eles a pensaram de maneira que as calhas possibilitassem a substituição por diversos tamanhos e formatos de roda d’água. Dessa forma, os moinhos exerciam diversas funções úteis para um Império tão poderoso e complexo. 

O estudo foi publicado no periódico Scientific Reports. Com informações de Ancient Origins e Universitaet Mainz.

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