Calor interno de Marte pode ter criado condições para a vida há bilhões de anos

Felipe Miranda
Canal de água em Marte. (ESA / DLR / FU Berlin / Lujendra Ojha).

Um dos requisitos para a vida é energia térmica. Ela possui inúmeras funções, desde manter a água líquida, catalisar reações orgânicas e fornecer energia para diversas outras atividades de um ser vivo. Não à toa, então, que consideramos que um dos locais onde  a vida pode ter surgido na Terra são as fontes hidrotermais. As condições para a vida são bem específicas. 

Mas descobertas recentes nos impressionam. Cinco quilômetros abaixo de nós há dezenas de bilhões de toneladas de microorganismos. Trata-se de uma biodiversidade tão grande quando a Amazônia e as Ilhas Galápagos, conforme os pesquisadores descobriram em 2018. Esses seres não dependem do Sol, mas de outras fontes de energia. Trata-se de um mundo completamente à parte e pouquíssimo conhecido. 

Encontrar esses novos seres vivos abre algumas possibilidades. Tanto que agora muitos pesquisadores consideram que a vida na Terra pode ter surgido no subsolo, ao invés das fontes hidrotermais. Se há tanta diversidade, é porque o ambiente é propício, portanto. Isso também abre novas portas para a busca pela vida microscópica extraterrestre. Um novo estudo publicado no periódico Science Advances, então, sugere o surgimento da vida em Marte, bilhões de anos atrás, no subsolo. 

Perspective view of Korolev crater
Ainda hoje há gelo em Marte. (ESA/DLR/FU Berlin).

Condições desfavoráveis

“Mesmo bombeando gases de efeito estufa como dióxido de carbono e vapor d’água para a atmosfera de Marte em simulações de computador, os modelos climáticos ainda lutam para sustentar um Marte quente e úmido de longo prazo”, disse em um comunicado a autora principal, Lujendra Ojha, professora assistente na Rutgers University. “Eu e meus co-autores propomos que o paradoxo fraco do sol jovem pode ser reconciliado, pelo menos em parte, se Marte teve alto calor geotérmico em seu passado”

Hoje Marte já esfriou bastante. Corpos pequenos esfriam rápido, e a atividade geológica de Marte e da Lua, por exemplo, já pararam quase completamente. Eles são bem menores do que a Terra. 

Os modelos contradizem, de certa forma, a realidade. Cerca de 4 bilhões, o Sol estava bem mais fraco do que hoje. Além disso, Marte localiza-se a uma distância bem maior até o Sol do que a Terra. Ao mesmo tempo, as análises geoquímicas revelam uma boa quantidade de água líquida no planeta vermelho naquela época. Mas, ao que os pesquisadores sabem, o Sol não permitira aquilo naquela época.

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Marte pode já ter sido como a Terra. (NASA’s Goddard Space Flight Center).

Portanto, os pesquisadores se inspiraram nos exemplos terrestres. Elementos radioativos, como  urânio, tório e potássio poderiam ajudar nisso, já que o decaimento radioativo também gera calor, e esse calor pode levar o gelo a derreter. Além disso, o calor interno da Terra gera esse mesmo efeito em outros locais. Esses dois fenômenos geram água líquida abaixo do gelo na Antártica, na Groenlândia e no Ártico Canadense. 

Calor interno e condições para a vida

Para investigar a hipótese, então, os pesquisadores olharam para as regiões montanhosas no hemisfério sul de Marte. Acredita-se, com base em dados, que aquela área possuiu grandes camadas de gelo há quatro bilhões de anos. Então, eles estudaram como essa dinâmica do gelo ocorreria por ali utilizando dados da sonda Mars Odyssey, um orbitador da NASA.

Conforme as simulações, portanto, mesmo quando Marte esfriou, perdeu seu campo magnético e sua atmosfera, tornando-se um deserto, na superfície, a água subterrânea conseguiria se manter líquida de forma estável por um bom tempo. Nas maiores profundidades da crosta, Marte deve ter permanecido consideravelmente quente por bastante tempo ainda, mantendo boas condições para a vida. 

O estudo, portanto, trás pistas de onde buscarmos vida em Marte. Uma das missões dos rovers em Marte, como o Curiosity, é sempre buscar por sinais de vida, mesmo que já extinta. Portanto, o subsolo é um ótimo lugar para os cientistas iniciarem as buscas. 

O estudo foi publicado no periódico Science Advances.

Com informações de New Scientist, Space.com e Rutgers University

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